segunda-feira, 4 de abril de 2022

O MASSACRE DE BUCHA


Face a dezenas de vídeos e fotografias divulgadas por sites de jornais e televisões de todo o mundo, passei as últimas 24 horas em estupor.

O levantamento do cerco russo a Kiev deixa ver o rasto de devastação que assola as áreas periféricas da capital ucraniana, em especial as cidades de Irpin e Bucha.

Corpos mutilados, cadáveres de mulheres estupradas, crianças com a cabeça esmagada, cães e gatos esventrados, corpos amontoados em valas comuns, homens enforcados, carros incendiados, prédios destruídos, viadutos colapsados, bunkers inutilizados, tanques russos carbonizados, centenas de minas terrestres espalhadas por vias de comunicação, etc. Não há palavras para descrever o horror. Também não há água, nem electricidade, nem mantimentos.

Quando julgávamos impossível a repetição de Srebrenica e dos snipers de Sarajevo, eis que Bucha nos lembra que tudo pode regredir com a rapidez de um fósforo.

Que perante tudo isto haja gente capaz de falar em “encenação”, só acrescenta uma intolerável quota de nojo à realidade. Afinal, se houve (e continua a haver) quem negasse o Holocausto, por que não haveria agora igual número de energúmenos?

Intencionalmente, a imagem é a mais benigna que encontrei. Clique.

domingo, 3 de abril de 2022

ANTÓNIO OSÓRIO


UM POEMA POR SEMANA — Para este domingo escolhi [Dois filhos Adolescentes] de António Osório (1933-2021), poeta maior do século XX português.

Filho de pai português e mãe italiana, António Osório nasceu em Setúbal. Embora colaborasse em revistas literárias desde 1954, quando fundou a revista Anteu, publicou o primeiro livro, A Raiz Afectuosa (1972), à beira de completar 40 anos. A partir de 1978 — ano de publicação de A Ignorância da Morte —, tornou-se um dos poetas centrais do chamado regresso ao real.

Várias vezes premiado, com obra traduzida e publicada em Espanha, França, Bélgica, Itália, Alemanha, Roménia, Croácia, Estados Unidos e Brasil, Osório foi elogiado e estudado por críticos de todas as gerações, de João Gaspar Simões a António Carlos Cortez.

Além de poesia publicou o livro de ensaios A Mitologia Fadista (1974). Muitos dos seus livros de poesia têm ilustrações de Mário Botas, Júlio Pomar, Graça Morais, Júlio Resende, Manuel Cargaleiro, Pedro Cabrita Reis e outros.

Advogado de profissão, foi Bastonário da respectiva Ordem entre 1984 e 1986. Membro da Academia das Ciências de Lisboa, presidente da Associação Portuguesa para o Direito do Ambiente (1994-96), administrador da Comissão Portuguesa da Fundação Europeia da Cultura, representante de Portugal na Convenção da Haia (1980), presidente da delegação portuguesa no Tribunal Europeu de Arbitragem (Estrasburgo), fundador da revista Direito do Ambiente e do Ordenamento do Território, membro do Instituto de Direito Comparado Luso-Brasileiro, director da Biblioteca da Ordem dos Advogados (1995-2002), director da revista Foro das Letras, etc., exerceu diversos outros cargos de interesse público.

Passou os seus últimos anos na casa de família em Azeitão.

O poema desta semana é um dos quinze que compõem a sequência Gratidão que nem sabe a quem deve ser grata, do livro O Lugar do Amor (1981). A imagem foi obtida a partir da edição que a Gótica fez em 2001. A obra poética completa do autor encontra-se reunida em A Luz Fraterna, volume publicado em 2009 pela Assírio & Alvim.

[Antes deste, foram publicados poemas de Rui Knopfli, Luiza Neto Jorge, Mário Cesariny, Natália Correia, Jorge de Sena, Glória de Sant’Anna, Mário de Sá-Carneiro, Sophia de Mello Breyner Andresen, Herberto Helder, Florbela Espanca, António Gedeão, Fiama Hasse Pais Brandão, Reinaldo Ferreira, Judith Teixeira, Armando Silva Carvalho, Irene Lisboa, António Botto, Ana Hatherly, Alberto de Lacerda, Merícia de Lemos, Vasco Graça Moura, Fernanda de Castro, José Gomes Ferreira, Natércia Freire, Gomes Leal, Salette Tavares, Camilo Pessanha, Edith Arvelos, Cesário Verde, António José Forte, Francisco Bugalho, Leonor de Almeida, Carlos de Oliveira, Fernando Assis Pacheco, José Blanc de Portugal, Luís Miguel Nava, António Maria Lisboa, Eugénio de Andrade, José Carlos Ary dos Santos, António Manuel Couto Viana, Ruy Cinatti, Al Berto, Alexandre O’Neill, Vitorino Nemésio, David Mourão-Ferreira, Miguel Torga, Ângelo de Lima, Pedro Tamen, António Ramos Rosa, José Régio, Antero de Quental, Pedro Homem de Mello, Teixeira de Pascoaes e Afonso Duarte.]

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quinta-feira, 31 de março de 2022

E NÓS POR CÁ?


Desde que a guerra começou, Zelensly foi convidado a falar no Conselho da Europa (Estrasburgo), nas cimeiras da NATO e da UE, ambas em Bruxelas no passado 24 de Março, no Forum Económico de Doha (Qatar), no Congresso dos Estados Unidos (Senado e Câmara dos Representantes), nos Parlamentos do Reino Unido, Canadá, Alemanha, Israel, Itália, Japão, França, Suécia, Países Baixos, Irlanda, Bélgica, Noruega, Dinamarca e Austrália. Dito de outro modo, dezasseis países já ouviram Zelensky em vinte ocasiões diferentes.

A sessão das Cortes de Espanha (Senado e Congresso de Deputados) está marcada para o próximo dia 5. E a do Parlamento da Grécia para o próximo dia 7.

E nós por cá?

Imagem: hoje, em Camberra. Clique.

quarta-feira, 30 de março de 2022

HABEMUS GOVERNO


Empossado pelo Presidente da República, tomou hoje posse o XXIII Governo Constitucional.

Surpreendeu-me que o terço inicial do discurso do PR tenha incidido nas consequências da invasão da Ucrânia pela Rússia, nessa «manhã de 24 de Fevereiro em que o mundo mudou [...] Uma manifestação de força sem legitimidade jurídica, nem política, que teve condenação internacional.» 

Foi bom que o tivesse feito, mas apanhou-me (como provavelmente a muita gente) de surpresa. Arriscaria dizer que andou ali mão de um dos novos ministros, e não é preciso trabalhar na West Wing para saber que é assim que estas coisas se fazem.

Muito bom, e certeiro, o discurso do primeiro-ministro, também ele focando (no momento próprio) a guerra na Europa.

Novidade mesmo foi a afirmação de António Costa de que «a proposta do Orçamento do Estado já está finalizada...» Sabia-se que o programa do Governo é aprovado amanhã em Conselho de Ministros, para ser discutido na AR nos próximos dias 7 e 8 de Abril, mas termos o OE 2022 finalizado é uma revelação inesperada (mais do que a mudança de ministro das Finanças, a guerra terá alterado a versão chumbada em Outubro do ano passado). São boas notícias.

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terça-feira, 29 de março de 2022

HABEMUS PARLAMENTO


Cinco meses depois do chumbo do OE 2022 e dois meses depois das eleições legislativas antecipadas que deram a maioria absoluta ao PS, teve hoje início, com a posse dos 230 deputados da Assembleia da República, a XV Legislatura. 

Augusto Santos Silva substitui Eduardo Ferro Rodrigues como Presidente da Assembleia da República, cargo para que foi eleito por 156 votos a favor, 63 brancos e 11 nulos.

Santos Silva fez um bom discurso. Destaco dois tópicos:

«A liberdade e a igualdade custaram-nos demasiado para regredirmos...» / «O discurso sem lugar aqui será o discurso de ódio, que insulta o outro que é diferente e que discrimina, seja qual for o motivo da discriminação...»

O statement não deixou de invectivar os «nacionalistas antipatriotas», razão que explica o azedume da primeira intervenção da extrema-direita.

Num acto cerimonial como este, foi deprimente ver os deputados do PSD de braços cruzados, incapazes de aplaudir alguém que, não sendo um dos seus, defendia valores e princípios que são universais.

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domingo, 27 de março de 2022

AFONSO DUARTE


UM POEMA POR SEMANA — Para este domingo escolhi Calai de Afonso Duarte (1884-1958), um dos poetas mais esquecidos do século XX português.

Natural de Ereira (Coimbra), Afonso Duarte estreou-se em 1912 com Cancioneiro das Pedras, mas seria só a partir de 1929, com Os 7 Poemas Líricos — volume publicado pela Presença — que o seu nome obteria ressonância nacional.

Tinha formação em ciências físico-naturais mas era etnógrafo por opção. Professor do ensino básico, adversário da Ditadura Nacional (1928-33), foi aposentado compulsivamente do ensino em 1932. Viveu grande parte da vida com paralisia nos membros inferiores. 

Colaborou nas principais revistas literárias do seu tempo, interessou-se por arte popular, escreveu e publicou obras sobre pedagogia e etnografia. 

A primeira edição da sua Obra Poética (1956) completa foi organizada por Carlos de Oliveira e João José Cochofel. 

O poema desta semana pertence a Ossadas (1947). A imagem foi obtida a partir da edição de 2003 (Cotovia) de A Poesia da Presença, antologia organizada por Adolfo Casais Monteiro, que a publicou no Brasil em 1959. 

[Antes deste, foram publicados poemas de Rui Knopfli, Luiza Neto Jorge, Mário Cesariny, Natália Correia, Jorge de Sena, Glória de Sant’Anna, Mário de Sá-Carneiro, Sophia de Mello Breyner Andresen, Herberto Helder, Florbela Espanca, António Gedeão, Fiama Hasse Pais Brandão, Reinaldo Ferreira, Judith Teixeira, Armando Silva Carvalho, Irene Lisboa, António Botto, Ana Hatherly, Alberto de Lacerda, Merícia de Lemos, Vasco Graça Moura, Fernanda de Castro, José Gomes Ferreira, Natércia Freire, Gomes Leal, Salette Tavares, Camilo Pessanha, Edith Arvelos, Cesário Verde, António José Forte, Francisco Bugalho, Leonor de Almeida, Carlos de Oliveira, Fernando Assis Pacheco, José Blanc de Portugal, Luís Miguel Nava, António Maria Lisboa, Eugénio de Andrade, José Carlos Ary dos Santos, António Manuel Couto Viana, Ruy Cinatti, Al Berto, Alexandre O’Neill, Vitorino Nemésio, David Mourão-Ferreira, Miguel Torga, Ângelo de Lima, Pedro Tamen, António Ramos Rosa, José Régio, Antero de Quental, Pedro Homem de Mello e Teixeira de Pascoaes.]

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sexta-feira, 25 de março de 2022

A ÚLTIMA FRONTEIRA


Estamos todos a pagar a factura da nossa indiferença face à anexação da Crimeia pela Federação Russa em Março de 2014. Quando isso aconteceu, fazendo tábua rasa do direito internacional, a Europa e a administração Obama assobiaram para o lado. O que está em jogo na Ucrânia é o nosso futuro como civilização.

Trinta dias de confronto deram origem a seis milhões de deslocados no seu próprio país, quatro milhões de refugiados no Ocidente, meio milhão de deportados para a Rússia, milhares de civis mortos, corredores humanitários atacados à bomba, cidades destruídas, tráfico de seres humanos, crise económica planetária, etc. Kiev ainda não caiu. Só cairá se a Rússia adoptar a solução final. Se isso acontecer, a NATO intervirá. Não pode ficar de braços cruzados como ficou há oito anos.

Um dia saberemos o que levou Putin a supor que a invasão da Ucrânia seria um remake da libertação de Paris, em Agosto de 1944, quando os franceses receberam os militares americanos com flores, beijos e canções. Quem terá convencido Putin dessa ilusão?

A “operação especial militar” que visava “desnazificar” a Ucrânia foi prevista para durar umas horas, porque, julgavam os idiotas de todos os matizes, a chegada do primeiro tanque ao Donbass levaria Zelensky a fugir para o Ocidente e a população ucraniana a receber os “libertadores” em triunfo. Nada disso aconteceu. A Ucrânia resiste, a Ucrânia vai continuar a resistir, para desgosto dos “pacifistas” que apelam à capitulação de um Estado soberano.

A guerra na Europa atrapalha o querido mês de Agosto? Paciência. 

Na imagem, Tetiana Chornovol, uma militar ucraniana, carrega um míssil anti-tanque. Clique.

quinta-feira, 24 de março de 2022

CIMEIRA DA NATO


A Cimeira da NATO decidiu reforçar todas as suas fronteiras a Leste (em especial nos países bálticos, na Polónia e na Roménia), com mais quarenta mil homens, bem como meios aéreos e navais significativos, aumentando a sua prontidão para ameaças químicas, biológicas, radiológicas e nucleares.

Jens Stoltenberg, secretário-geral da NATO, foi claro: «Concordámos em fornecer à Ucrânia equipamentos e treino que os habilitem a lidar com as consequências de um possível ataque russo com armas químicas, biológicas ou mesmo nucleares

Recordar que Sergei Shoigu, ministro russo da Defesa, não é visto desde o passado dia 11.

Imagem: foto oficial da Cimeira, em Bruxelas. Clique.

ZELENSKY NA CIMEIRA DA NATO


Depois do Conselho da Europa (Estrasburgo), Londres, Otava, Berlim, Washington, Jerusalém, Roma, Tóquio, Paris e Estocolmo, Zelensky dirigiu-se aos 30 líderes da NATO — entre eles António Costa —, reunidos neste momento em Bruxelas.

A Suécia e a Finlândia participam da Cimeira como «observadores», como tem acontecido desde a invasão da Ucrânia.

Biden chegou ontem à capital belga, deslocando-se amanhã a Varsóvia.

O edifício da organização tem as bandeiras a meia-haste em homenagem a Madeleine Albright, falecida ontem.

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quarta-feira, 23 de março de 2022

A EQUIPA


Aqui temos os rostos do novo Governo. A Direita estrebucha com aquilo a que chama o défice de sociedade civil face ao aparelho do Partido.

Queriam o quê? Que António Costa fosse recrutar quadros da CIP e membros do Turf Club?

Não sei se repararam, mas deixou de haver ministros de Estado.

Se as minhas contas estão certas, seis dos dezassete ministros nem militantes do PS são, sendo os seis personalidades destacadas da sociedade civil.

Tenho pena que Alexandra Leitão e Tiago Brandão Rodrigues tenham saído, mas, tudo visto, a equipa inspira confiança técnica e política. A ver vamos quem são os/as escolhidos/as para as 38 secretarias de Estado.

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domingo, 20 de março de 2022

GASTÃO CRUZ 1941-2022


Mais um amigo que parte. Morreu hoje Gastão Cruz, poeta, crítico, ensaísta, teórico do grupo de Poesia 61, mas também encenador de teatro e tradutor de Cocteau, Strindberg, Tchekhov e outros.

Autor de uma obra parcimoniosa, balizada entre A Morte Percutiva (1961) e Existência (2017), Gastão Cruz nasceu em Faro e veio para Lisboa aos dezassete anos. Na Faculdade de Letras conheceu Fiama Hasse Pais Brandão, com quem viria a casar. Data desse tempo o seu interesse pelo teatro: integrou o Grupo de Teatro de Letras, tendo mais tarde dirigido o Grupo de Teatro Hoje/Teatro da Graça. Entre outras, adaptou ao teatro o romance Uma Abelha na Chuva de Carlos de Oliveira.

Foi professor do ensino secundário e, durante seis anos (1980-86), leitor de português no King’s College de Londres.

Tendo, durante três décadas, colaborado largamente na imprensa cultural, coligiu parte desses textos nos volumes A Poesia Portuguesa Hoje (1973) e A Vida da Poesia (2009). Coordenou colecções de poesia, organizou antologias, presidiu à Fundação Luís Miguel Nava, dirigiu a revista Relâmpago e recebeu todos os prémios que havia para receber. Em 2019 foi agraciado com o grau de Grande-Oficial da Ordem do Infante Dom Henrique.

Vítima de doença degenerativa, estava internado no hospital Egas Moniz, de Lisboa.

Até sempre, Gastão.

PASCOAES


UM POEMA POR SEMANA — Para este domingo escolhi À Minha Musa de Teixeira de Pascoaes (1877-1952), poeta maior do Saudosismo português que Cesariny considerava superior a Fernando Pessoa.

Natural de Amarante, Joaquim Pereira Teixeira de Vasconcelos passou à posteridade com o pseudónimo de Teixeira de Pascoaes. Filho de um agricultor abastado (e culto) que foi deputado às Cortes, Pascoaes formou-se em Direito e chegou a juiz na sua terra natal.

Estreou-se em livro em 1895, com a colectânea poética Embriões. Mais tarde, dirigiu durante quatro anos A Águia, revista de literatura, arte, ciência, filosofia e crítica social, órgão teórico do movimento da Renascença Portuguesa.

Eremita, místico, espírito filosófico, foi eleito membro da Academia de Ciências de Lisboa em 1923. Além de poesia, publicou ensaios, uma autobiografia [Livro de Memórias, 1928], duas novelas, mas também biografias romanceadas de São Paulo, São Jerónimo, Santo Agostinho, Camilo Castelo Branco e Napoleão.

Pascoaes não gostava de Pessoa e considerava António Nobre a nossa maior poetisa.

O poema desta semana pertence a Senhora da Noite (1909). A imagem foi obtida a partir de Poesia de Teixeira de Pascoaes, antologia organizada por Mário Cesariny, editada por António Cândido Franco e publicada pela Assírio & Alvim em 2002.

[Antes deste, foram publicados poemas de Rui Knopfli, Luiza Neto Jorge, Mário Cesariny, Natália Correia, Jorge de Sena, Glória de Sant’Anna, Mário de Sá-Carneiro, Sophia de Mello Breyner Andresen, Herberto Helder, Florbela Espanca, António Gedeão, Fiama Hasse Pais Brandão, Reinaldo Ferreira, Judith Teixeira, Armando Silva Carvalho, Irene Lisboa, António Botto, Ana Hatherly, Alberto de Lacerda, Merícia de Lemos, Vasco Graça Moura, Fernanda de Castro, José Gomes Ferreira, Natércia Freire, Gomes Leal, Salette Tavares, Camilo Pessanha, Edith Arvelos, Cesário Verde, António José Forte, Francisco Bugalho, Leonor de Almeida, Carlos de Oliveira, Fernando Assis Pacheco, José Blanc de Portugal, Luís Miguel Nava, António Maria Lisboa, Eugénio de Andrade, José Carlos Ary dos Santos, António Manuel Couto Viana, Ruy Cinatti, Al Berto, Alexandre O’Neill, Vitorino Nemésio, David Mourão-Ferreira, Miguel Torga, Ângelo de Lima, Pedro Tamen, António Ramos Rosa, José Régio, Antero de Quental e Pedro Homem de Mello.]

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sexta-feira, 18 de março de 2022

PORQUÊ?

O grande dilema dos historiadores que, no futuro, tentarem perceber a invasão da Ucrânia de 2022 radica no móbil que terá levado Putin a ordenar uma guerra em moldes que, sendo plausíveis há 80 anos ou mais anos, não fazem hoje sentido.

Admitindo que alguém o tenha convencido de que Zelensky fugia para o Ocidente assim que os tanques entrassem no Donbass, mesmo nessa hipótese absurda, havia que contar com a resistência de um povo determinado. Se Zelensky fosse abatido, ou fugisse (como em 2014 fugiu Víktor Yanukóvytch), outro ucraniano anti-Moscovo ocuparia o seu lugar. O mito dos russófilos que receberiam as tropas russas de cravos na mão foi engendrado por quem?

Tentar ocupar a Ucrânia, um país maior do que a França, com 150 mil homens (desconhecedores do terreno) e divisões panzer, ultrapassa toda a lógica. Claro que, como tem estado a ser feito, o país pode ser arrasado de Leste a Oeste e de Norte a Sul. Mas de que servirá uma tão vasta extensão de terra queimada?

Sim, há que contar com os mísseis. E não podemos descartar a hipótese de que, para vergonha de todos nós, Kiev venha a ser a nova Hiroshima. 

«Vou cumprir até ao fim todos os meus objectivos, e sei como fazê-lo», reiterou ontem Putin, no Estádio Luzhniki, de Moscovo, durante o comício em que celebrou a anexação da Crimeia.

segunda-feira, 14 de março de 2022

JORGE SILVA MELO 1948-2022


Vítima de doença prolongada, morreu esta noite Jorge Silva Melo, actor, encenador, dramaturgo, editor dos Livrinhos de Teatro, realizador de cinema, guionista, tradutor, cronista, memorialista, crítico, professor na Escola Superior de Teatro e Cinema e director da companhia de teatro Artistas Unidos.

Natural de Lisboa, Silva Melo passou a infância e o início da adolescência em Angola, onde seus pais estavam radicados. Frequentou a Faculdade Letras da Universidade de Lisboa e, a partir de 1969, a London Film School. Fez teatro em Berlim, Paris e Milão. 

Antes de partir para Inglaterra foi um dos fundadores do Grupo de Teatro de Letras. Mais tarde (1973) fundou com Luís Miguel Cintra o Teatro da Cornucópia, onde permaneceu até 1979. Como bolseiro da Gulbenkian estagiou em Berlim com Peter Stein, em Paris com Jean Jourdheuil e em Milão com Giorgio Strehler. Em 1995 fundou os Artistas Unidos (verdadeira escola de teatro), exigente companhia que dirigiu até morrer.

Como realizador de cinema integrou a cooperativa Grupo Zero (1975-79), tendo realizado mais de uma dúzia de filmes, entre eles o mítico António, Um Rapaz de Lisboa (2000). Como actor de cinema trabalhou com Manoel de Oliveira, Paulo Rocha, João César Monteiro, Alberto Seixas Santos, Joaquim Pinto, Manuel Mozos, José Álvaro Morais, João Botelho e outros. Da sua filmografia constam filmes sobre diversos artistas plásticos: António Palolo, Nikias Skapinakis, Álvaro Lapa, Sofia Areal, Joaquim Bravo, Ângelo de Sousa e Fernando Lemos.

Deixa-nos dois excepcionais livros de memórias: O Século Passado (2007) e A Mesa Está Posta (2019). Da restante bibliografia consta o libreto de Le Château dês Carpathes de Philippe Hersant. Entre outras, traduziu obras de Pasolini, Goldoni, Pirandello, Brecht, Oscar Wilde, Harold Pinter, H.P. Lovecraft, Georg Büchner, Heiner Müller e Ramón Gómez de la Serna.

Em Maio de 2021 foi doutorado honoris causa pela Universidade de Lisboa.

Muito mais haveria a dizer, mas a morte de um amigo deixa-nos sempre interditos. Até sempre, Jorge.

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domingo, 13 de março de 2022

WILLIAM HURT 1950-2022


Vítima de cancro na próstata, morreu este domingo, na sua casa de Portland, no Oregon, o actor William Hurt. Faria 72 anos no próximo dia 20.

Um dos melhores actores da sua geração, notabilizou-se com Noites Escaldantes (1981), recebendo, quatro anos depois, o Óscar de Melhor Actor Principal pela sua interpretação no filme de Hector Babenco O Beijo da Mulher Aranha, de 1985.

Outros êxitos planetários foram Os Amigos de Alex (1983), Filhos de Um Deus Menor (1986), Edição Especial (1987), O Turista Acidental (1988), Uma História de Violência (2005) e O Bom Pastor (2006).

Além de filmes, fez muito teatro em Nova Iorque. No cinema, mesmo quando fazia papéis secundários, e fez vários ao longo dos mais de 40 anos de uma carreira extremamente exigente, a sua presença era decisiva.

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PEDRO HOMEM DE MELLO


UM POEMA POR SEMANA — Para este domingo escolhi Fria Claridade de Pedro Homem de Mello (1904-1984), o poeta que escreveu poemas imortalizados por Amália, entre eles o famoso Povo Que Lavas No Rio.

Natural do Porto, nascido no seio de uma família de aristocratas, Homem de Mello passou grande parte da sua vida em Afife.

Foi professor do ensino secundário, subdelegado do Procurador da República e estudioso do folclore nacional. Além de poesia, escreveu ensaios sobre tradições portuguesas e diversas obras para o ensino. Estreou-se em livro com Caravela ao Mar (1934) e recebeu todos os prémios que havia para receber antes de 1974. Colaborou assiduamente na imprensa e na televisão. O Rapaz da Camisola Verde continua sendo um grandes poemas da poesia portuguesa.

Conotado com o Estado Novo, passou a última década de vida sem que a crítica lhe desse atenção. Contudo, David Mourão-Ferreira, Natália Correia e Vasco Graça Moura, para citar apenas três grandes nomes, nunca lhe regatearam elogios.

O poema desta semana pertence a Eu, Poeta e Tu, Cidade (2007), obra publicada pelas Quasi Edições a partir da qual a imagem foi obtida.

[Antes deste, foram publicados poemas de Rui Knopfli, Luiza Neto Jorge, Mário Cesariny, Natália Correia, Jorge de Sena, Glória de Sant’Anna, Mário de Sá-Carneiro, Sophia de Mello Breyner Andresen, Herberto Helder, Florbela Espanca, António Gedeão, Fiama Hasse Pais Brandão, Reinaldo Ferreira, Judith Teixeira, Armando Silva Carvalho, Irene Lisboa, António Botto, Ana Hatherly, Alberto de Lacerda, Merícia de Lemos, Vasco Graça Moura, Fernanda de Castro, José Gomes Ferreira, Natércia Freire, Gomes Leal, Salette Tavares, Camilo Pessanha, Edith Arvelos, Cesário Verde, António José Forte, Francisco Bugalho, Leonor de Almeida, Carlos de Oliveira, Fernando Assis Pacheco, José Blanc de Portugal, Luís Miguel Nava, António Maria Lisboa, Eugénio de Andrade, José Carlos Ary dos Santos, António Manuel Couto Viana, Ruy Cinatti, Al Berto, Alexandre O’Neill, Vitorino Nemésio, David Mourão-Ferreira, Miguel Torga, Ângelo de Lima, Pedro Tamen, António Ramos Rosa, José Régio e Antero de Quental.]

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NOVO PATAMAR


Esta madrugada, quando eram 03:45 em Portugal, a base militar ucraniana de Yavoriv, formalmente designada como Centro Internacional de Manutenção da Paz e Segurança, foi vítima de uma blitz de mísseis russos. A base situa-se a 25 quilómetros da fronteira com a Polónia.

Dito de outro modo, a guerra está a 25km da fronteira da NATO. Até ao momento estão identificados 35 mortos e cerca de 150 feridos. As vítimas são de nacionalidade ucraniana, polaca, norte-americana, britânica, alemã, francesa e australiana. Especula-se que no local também estivessem quatro consultores portugueses.

Consta nos círculos russófilos que o CIMPS estaria a servir de base logística para treino e equipamento dos voluntários estrangeiros que estão a chegar à Ucrânia para lutar ao lado do exército ucraniano.

O eco do bombardeamento ouviu-se em Lviv, onde estilhaçaram os vidros de alguns edifícios. Recordar que foi para Lviv, cidade situada a 80 quilómetros da fronteira polaca, que se transferiram todas as representações diplomáticas estrangeiras, cujo staff foi reduzido ao mínimo.

O ataque representa uma sinistra mudança de paradigma na condução da guerra.

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sábado, 12 de março de 2022

VIOLINOS PELA PAZ


Em apoio do povo da Ucrânia está disponível no YouTube um vídeo realizado pela violinista britânica Kerenza Peacock que junta 94 violinistas de 29 países. 

Colaboram no vídeo a London Symphony Orchestra, a Tokyo Symphony, a Oslo Philharmonic e a Orquestra de Câmara de Munique.

Participam violinistas do Reino Unido, Japão, Noruega, Alemanha, Portugal [Elisabete Gomes], Espanha, França, Bélgica, Irlanda, Países Baixos, Dinamarca, Suécia, Israel, Polónia, República Checa, Moldávia, Geórgia, Índia, Coreia do Sul, Nova Zelândia, Colômbia, África do Sul, Estados Unidos, Canadá, Ucrânia e outros.

Os ucranianos actuaram a partir dos bunkers onde se encontram refugiados.

O vídeo é patrocinado pelo Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados.

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segunda-feira, 7 de março de 2022

CULTURA VS GUERRA


O que penso acerca da eficácia ou ineficácia da Cultura como sanção. Acabado de pôr em linha pela Página Um.

Transcrevo na íntegra

Cultura highbrow como arma de guerra?

Perguntam-me se Putin pode ser derrotado pelo ostracismo da cultura russa. Admitindo que a cultura russa estivesse a ser ostracizada pelos adversários de Putin (e não me parece que esteja), o tema não afecta o quotidiano da larga maioria do povo russo, elites de Moscovo e São Petersburgo incluídas.

As quebras de contrato que atingiram a soprano Anna Netrebko e o maestro Valery Gergiev, a primeira afastada da Metropolitan Opera de Nova Iorque, o segundo da Filarmónica de Munique, são desaires que afectam a carreira de ambos, artistas de reputação planetária. Mas nenhum deles detém o monopólio da cultura russa.

Dir-me-ão que não são casos isolados. Pois não: atletas russos foram impedidos de participar nas Paralimpíadas de Pequim, universidades de prestígio cancelam cursos de literatura russa, cineastas russos são afastados de festivais de cinema para os quais haviam sido convidados, e até a Federação Felina Internacional proibiu gatos russos de participarem nas competições agendadas para este ano.

Todos os dias surge uma nova forma de boicote. É deprimente, mas não será por aí que Putin verga. O grande mistério radica na razão que terá levado Putin a desencadear uma guerra que terá consequências no quotidiano da população da Rússia, hoje completamente ocidentalizada, dependente do vasto arsenal de bens de consumo que moldam o dia-a-dia da geração pós-Perestroika.

Aparentemente, terá julgado que a ocupação da Ucrânia durava umas horas, graças a hordas de ucranianos russófilos desejosos de afastar Zelensky. Nada disso aconteceu. No trágico ínterim em que todos estamos mergulhados, o povo russo descobre, estupefacto, estar a um passo de regredir cinquenta anos.

A classe trabalhadora russa não quer saber da visibilidade internacional da sua cultura highbrow. Quer saber se vai poder continuar a manter o padrão de vida dos povos das nações industrializadas, a começar pelos seus vizinhos da Finlândia.

domingo, 6 de março de 2022

ANTERO


UM POEMA POR SEMANA — Para este domingo escolhi Justitia Mater de Antero de Quental (1842-1891), o ideólogo da Geração de 70.

Natural de Ponta Delgada, nos Açores, Antero nasceu no seio de uma família da velha aristocracia micaelense. Em 1858 foi estudar Direito para Coimbra, tornando-se, com a primeira edição de Odes Modernas, o arauto da Questão Coimbrã. 

Herdeiro de uma fortuna, viajou por França e pelos Estados Unidos, envolvendo-se na política do seu tempo: fundou associações operárias, publicou panfletos revolucionários, dirigiu jornais republicanos e organizou, em Lisboa, as Conferências do Casino (1871). Ficou célebre a que proferiu sobre as Causas da Decadência dos Povos Peninsulares. O cancelamento compulsivo das conferências afasta-o da vida pública.

Vive uns tempos em Paris, radicando-se de seguida em Vila do Conde.

Como reacção contra o Ultimato Britânico de 1890, aceitou presidir à Liga Patriótica do Norte.

Antes de regressar aos Açores viveu uma temporada em Lisboa. Deprimido (sofria de distúrbio bipolar), suicida-se com dois tiros de pistola num banco de jardim de Ponta Delgada. Tinha 49 anos.

O poema desta semana pertence a Odes Modernas (1875). A imagem foi obtida a partir de Poesia I, edição crítica de Luiz Fagundes Duarte para a colecção de Obras Clássicas da Literatura Portuguesa, publicada em 2016 pela Direcção-Geral do Livro, dos Arquivos e das Bibliotecas.

[Antes deste, foram publicados poemas de Rui Knopfli, Luiza Neto Jorge, Mário Cesariny, Natália Correia, Jorge de Sena, Glória de Sant’Anna, Mário de Sá-Carneiro, Sophia de Mello Breyner Andresen, Herberto Helder, Florbela Espanca, António Gedeão, Fiama Hasse Pais Brandão, Reinaldo Ferreira, Judith Teixeira, Armando Silva Carvalho, Irene Lisboa, António Botto, Ana Hatherly, Alberto de Lacerda, Merícia de Lemos, Vasco Graça Moura, Fernanda de Castro, José Gomes Ferreira, Natércia Freire, Gomes Leal, Salette Tavares, Camilo Pessanha, Edith Arvelos, Cesário Verde, António José Forte, Francisco Bugalho, Leonor de Almeida, Carlos de Oliveira, Fernando Assis Pacheco, José Blanc de Portugal, Luís Miguel Nava, António Maria Lisboa, Eugénio de Andrade, José Carlos Ary dos Santos, António Manuel Couto Viana, Ruy Cinatti, Al Berto, Alexandre O’Neill, Vitorino Nemésio, David Mourão-Ferreira, Miguel Torga, Ângelo de Lima, Pedro Tamen, António Ramos Rosa e José Régio.]

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sexta-feira, 4 de março de 2022

CARA A CARA


Em vez de ouvirmos Emmanuel Macron a reportar conversas telefónicas com Putin, estratagema porventura útil à campanha presidencial francesa, quem já devia ter ido a Moscovo era o secretário-geral da ONU.

Exactamente, António Guterres. Fosse qual fosse o resultado da conversa, o testemunho do secretário-geral da ONU — que tem a obrigação de zelar pela paz — seria ouvido em todo o mundo.

Com o mundo à beira do precipício ou, na melhor das hipóteses, com uma catástrofe de proporções inimagináveis no centro da Europa, o protocolo das sessões do Conselho de Segurança (onde a Rússia detém o poder de veto) obedece a uma coreografia viciada.

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quarta-feira, 2 de março de 2022

ATÉ QUE ENFIM


A SPA sente-se «Revoltada com a grave situação militar e política vivida nestes dias pelo povo ucraniano, invadido pelas forças armadas russas...» 

Honra à Sociedade Portuguesa de Autores, primeira instituição cultural portuguesa a manifestar-se contra a invasão da Ucrânia.

Como seu representado, teria preferido uma tomada de posição entre os dias 25 e 26 de Fevereiro, mas antes tarde que nunca.

Imagem: primeiro parágrafo do comunicado da SPA. Clique.

E VÃO SETE DIAS


Prevista para durar menos de 24 horas, a invasão russa vai no sétimo dia sem que o Governo de Zelensky tenha caído.

O intelligence russo já não é o que era? Quem convenceu Putin de que a operação ficaria resolvida em poucas horas?

Como é que alguém pôde pensar subjugar, de um dia para o outro, um país com mais de quarenta milhões de habitantes (sendo russos 17%), Governo eleito, forte tradição de resistência e apoio de todo o Ocidente?

O que pretende Moscovo fazer de um território maior do que a França depois de destruir todas as suas infraestruturas?

Por exemplo, a cidade de Kharkiv, a segunda maior do país, sob destruição metódica desde o início do conflito, é um importante centro cultural e científico, com treze universidades classificadas entre as melhores da Europa, indústria electrónica de ponta, etc. Comparada com Kharkiv, Lisboa é uma cidade de província.  

O que acontecerá se uma das centrais nucleares ucranianas — nem precisa de ser a de Zaporizhzhia, a maior da Europa — for alvo (intencional ou por dano colateral imprevisto) de um acidente idêntico ao de Chernobyl?

Imagem: fragmento do míssil que atingiu o SBU de Kharkiv, hoje. Clique.

terça-feira, 1 de março de 2022

A VER SE A GENTE SE ENTENDE

Durante a Guerra Colonial (1961-1974), uma larga maioria de portugueses solidarizou-se, sob diversas formas, com os povos das Colónias que lutavam pela independência.

Não quero acreditar que, salvo por parte dos sociopatas do costume, essa solidariedade traduzisse ódio pelos portugueses nascidos e/ou radicados nas Colónias.

A guerra entre a Rússia e a Ucrânia coloca a mesma questão: a nossa solidariedade com o povo ucraniano em nada diminui igual solidariedade com o povo russo.

É dever dos intelectuais não assobiar para o lado.

SEQUELAS NO MILIEU ARTISTE

UPDATE DO SEXTO DIA DA INVASÃO DA UCRÃNIA

— Kirill Savchenkov e Alexandra Sukhareva, os artistas plásticos escolhidos para representar a Rússia na Bienal de Veneza 2022, desistiram de participar, alegando: Não há lugar para arte quando civis são mortos sob o fogo de mísseis, quando cidadãos da Ucrânia vivem escondidos em abrigos, quando manifestantes russos anti-guerra estão ser amordaçados e presos.

Raimundas Malasauskas, curador do pavilhão russo, também se retirou, subscrevendo a posição de Savchenkov e Sukhareva.

— A Filarmónica de Munique demitiu Valery Gergiev do cargo de maestro-chefe. Amigo pessoal de Putin, Gergiev também viu cancelada a sua presença no Scala de Milão, no Carnegie Hall de Nova Iorque e no Festival de Edimburgo.

— A soprano russa Anna Netrebko, que deveria actuar no MET (Nova Iorque) em Abril, já não o poderá fazer. A senhora escreveu no Instagram o seguinte: «Forçar artistas, ou qualquer figura pública, a expressar as suas opiniões políticas em público, denunciando a sua pátria, é errado.» Peter Gelb, responsável máximo do MET, não se comoveu. A Turandot terá outra solista.

— A Royal Opera House de Londres cancelou a temporada de Verão do Bolshoi Ballet.

— O Festival de Música da Primavera, que se realiza todos os anos em Lucerna (Suíça), este ano dedicado a Mendelssohn e com início marcado para o próximo 8 de Abril, cancelou a presença de todos os artistas russos.

— A Grécia vai suspender a colaboração com todas as organizações culturais russas.

— A Rússia foi expulsa da Eurovisão.

— A Warner Bros, a Disney e a Netflix cancelaram a distribuição de filmes (e as emissões por cabo) na Rússia.

Imagem: o pavilhão da Rússia no Giardini della Biennale, em Veneza.

PEN INTERNACIONAL



Claro que os intelectuais têm de tomar posição. Assinada por mais de mil escritores de todo o mundo (entre eles Joyce Carol Oates, Salman Rushdie, Margaret Atwood, Orhan Pamuk, Svetlana Alexievich, Jonathan Franzen, Lyudmila Ulitskaya, Colm Tóibín, Olga Tokarczuk e Paul Auster), a carta do PEN internacional é clara: solidariedade com o povo da Ucrânia (em especial com os artistas, escritores e jornalistas), condenação da invasão russa e apelo para o fim imediato das hostilidades.

Aos meus pares que não saibam como o fazer, o contacto é este: Aurelia.dondo@pen-international.org

Imagem: excerto das assinaturas, por ordem alfabética (apelido). Clique.

domingo, 27 de fevereiro de 2022

RÉGIO


UM POEMA POR SEMANA — Para este domingo escolhi Libertação de José Régio (1901-1969), um dos fundadores, e o principal teórico, da revista Presença, que se publicou durante treze anos, dando corpo ao segundo modernismo.

Natural de Vila do Conde, pseudónimo de José Maria dos Reis Pereira, Régio foi, além de poeta, também dramaturgo, romancista, contista, ensaísta, cronista, crítico, diarista, memorialista e desenhador. Estreou-se em livro com Poemas de Deus e do Diabo (1925), colectânea que inclui Cântico Negro, o mais famoso dos seus poemas.

Professor de liceu no Porto e em Portalegre, foi uma das personalidades mais destacadas da vida literária portuguesa entre os anos 1930 e 1960. Morreu aos 68 anos sem nunca ter constituído família.

Publicado originalmente no livro de estreia, o poema desta semana foi integrado, em 1939, no segundo, Biografia. A imagem foi obtida a partir de Século de Ouro. Antologia Crítica da Poesia Portuguesa do Século XX, organizada por Osvaldo Manuel Silvestre e Pedro Serra, publicada em 2002 pela Cotovia e Angelus Novus.

[Antes deste, foram publicados poemas de Rui Knopfli, Luiza Neto Jorge, Mário Cesariny, Natália Correia, Jorge de Sena, Glória de Sant’Anna, Mário de Sá-Carneiro, Sophia de Mello Breyner Andresen, Herberto Helder, Florbela Espanca, António Gedeão, Fiama Hasse Pais Brandão, Reinaldo Ferreira, Judith Teixeira, Armando Silva Carvalho, Irene Lisboa, António Botto, Ana Hatherly, Alberto de Lacerda, Merícia de Lemos, Vasco Graça Moura, Fernanda de Castro, José Gomes Ferreira, Natércia Freire, Gomes Leal, Salette Tavares, Camilo Pessanha, Edith Arvelos, Cesário Verde, António José Forte, Francisco Bugalho, Leonor de Almeida, Carlos de Oliveira, Fernando Assis Pacheco, José Blanc de Portugal, Luís Miguel Nava, António Maria Lisboa, Eugénio de Andrade, José Carlos Ary dos Santos, António Manuel Couto Viana, Ruy Cinatti, Al Berto, Alexandre O’Neill, Vitorino Nemésio, David Mourão-Ferreira, Miguel Torga, Ângelo de Lima, Pedro Tamen e António Ramos Rosa.]

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sábado, 26 de fevereiro de 2022

COSTA NA NATO


A declaração do primeiro-ministro foi feita após ter participado na cimeira extraordinária da NATO terminada há pouco.

Putin não gostou de ver a Suécia e a Finlândia participarem na cimeira com o estatuto de Estados observadores, e pôs Maria Zakharova, porta-voz do ministério dos Negócios Estrangeiros russo, a dizer que lhes aconteceria o mesmo que à Ucrânia.

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sexta-feira, 25 de fevereiro de 2022

EXPANSIONISMO

Continua a haver muita confusão em muitas cabeças. Há quem continue a supor que a Rússia é um país comunista e, nessa medida, a saudar a invasão da Ucrânia como uma desforra da queda da URSS.

Do mesmo passo, muita gente continua a «achar» que a Bulgária, a antiga Checoslováquia (as actuais República Checa e a Eslováquia), a Hungria, a antiga Jugoslávia (actualmente dividida em sete países), a Polónia e a Roménia, pertenciam à URSS. Errado.

As repúblicas soviéticas eram dezasseis, e apenas três (os países bálticos) fazem hoje parte da NATO.

A URSS era constituída pela Rússia / Arménia / Azerbaijão / Bielorrússia / Bukharan / Cazaquistão / Estónia / Geórgia / Letónia / Lituânia / Moldávia / Quirguistão / Tajiquistão / Turquemenistão / Ucrânia / Uzbequistão.

Convinha não meter os pés pelas mãos. E ter presente que Putin, um czar implacável, marimba-se para o marxismo-leninismo. A ocupação da Ucrânia — uma antiga república soviética — não passa de expansionismo. Não há aqui ideologia nenhuma, a não ser aquela que atropela direitos, liberdades e garantias.

quinta-feira, 24 de fevereiro de 2022

COMEÇOU


Sem surpresa, a Rússia atacou a Ucrânia esta madrugada praticamente até às fronteiras ocidentais.

Por enquanto, apenas Lviv, no extremo ocidental do país, foi poupada. A razão é simples: é lá que se encontram quase todos os diplomatas estrangeiros, retirados de Kiev assim que a situação atingiu o turning point.

Neste momento, Kiev está sem defesas antiaéreas, que foram destruídas por mísseis russos. Forças russas já entraram em Carcóvia, aliás Kharkiv, capital da Ucrânia entre 1919 e 1934, actualmente a segunda cidade mais importante do país, centro da indústria tecnológica de ponta (electrónica, aeroespacial, nuclear), epicentro da vida cultural e científica ucraniana, onde vivem cerca de dois milhões de pessoas.

O aeroporto militar da cidade já foi bombardeado.

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quarta-feira, 23 de fevereiro de 2022

GURNAH EM PORTUGUÊS


O Nobel da Literatura 2021 foi parar às mãos de Abdulrazak Gurnah (n. 1948), nascido no Sultanato de Zanzibar, quando o arquipélago não fazia parte da República da Tanzânia. Gurnah ainda não tinha dezoito anos quando, a pretexto de terminar os estudos, foi para Inglaterra. É lá que vive desde então. Foi breve o regresso a África: ocorreu nos anos 1980, um breve período em que deu aulas numa universidade da Nigéria. Para todos os efeitos, Gurnah é um eminente cidadão, escritor e académico britânico, professor emérito da Universidade de Kent.

Vidas Seguintes, o décimo e mais recente dos romances que publicou, tem como pano de fundo as relações entre colonizadores e colonizados na Deutsch-Ostafrika. Muita gente não se lembra, mas o território da Tanzânia fez parte, até ao fim da Primeira Guerra Mundial, da África Oriental Alemã, vasta área que se estendia até à província do Niassa, no Norte de Moçambique. A problematização do colonialismo alemão tem sido sistematicamente omitida nos últimos cem anos, daí a relevância com que a obra de Gurnah preenche essa lacuna.

Gurnah nasceu sob domínio colonial britânico, mas é sobre as práticas coloniais alemãs que a obra se debruça. Denominador comum a todos os livros: as ilhas de Zanzibar, predominantemente muçulmanas e, como tal, estranhas ao clichê “africano”. Dito de outro modo, arabização no lugar da negritude.

As histórias dos quatro principais personagens de Vidas Seguintes — Khalifa, Ilyas, Hamza e Afiya — são as histórias de todos os colonizados que um dia foram obrigados a lutar pelo império ocupante, muitos deles roubados em crianças pelo Schutztruppe: «Toda a gente conhecia a frieza e impiedade dos oficiais alemães

Não é a primeira vez que o autor escreve sobre o tema. Por exemplo, Yusuf, o protagonista de Paradise (1994), é uma criança vendida pelo pai para trabalhar em regime de escravatura.

Qual o significado de “pertença”? Pondo em pauta a vexata quaestio da extraterritorialidade, do choque identitário e de culturas, Gurnah coloca-se no centro das experiências de alteridade que distinguem o que escreve.

Além de romancista, Gurnah é autor de contos. Uns e outros muito bem recebidos pela crítica, mas com vendas residuais (mesmo no Reino Unido, o prémio apanhou os editores desprevenidos). Antes de laureado com o Nobel, era sobretudo conhecido e respeitado pelos ensaios que escreveu sobre diáspora e literatura pós-colonial.

Vidas Seguintes foi traduzido por Eugénia Antunes e publicado pela Cavalo de Ferro.

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domingo, 20 de fevereiro de 2022

ANTÓNIO RAMOS ROSA


UM POEMA POR SEMANA — Para este domingo escolhi De Coincidência em Incoincidência de António Ramos Rosa (1924-2013), um dos poetas centrais da poesia portuguesa do Século XX.

Natural de Faro, António Ramos Rosa veio para Lisboa em 1945, embora até 1962 tenha mantido itinerância entre as duas cidades. 

Membro da secção algarvia do MUD Juvenil, esteve preso três meses (1947) no Governo Civil de Lisboa. Publicou o primeiro livro, O Grito Claro, em 1958.  A experiência de empregado de escritório deu origem a dois poemas famosos: O Funcionário Cansado e O Boi da Paciência. Contudo, a obra posterior afasta-se desse neorealismo com laivos surrealistas.

Poeta, crítico, ensaísta e tradutor, mas também desenhador, foi um dos fundadores e directores da revista Árvore (1951), bem como de outras publicações, entre elas Cadernos do Meio-Dia (1958). Em 1962 publicou um importante livro de ensaios, Poesia, Liberdade Livre. A quarta série de Líricas Portuguesas (1969), antologia de referência, foi por si organizada. Traduziu Éluard, Foucault, Marguerite Yourcenar e outros.

Entre os muitos prémios que recebeu, em Portugal e na França, foi distinguido (1991) pelo Collège de l’Europe como Poeta Europeu da Década.

O poema desta semana pertence a Ocupação do Espaço (1963). A imagem foi obtida a partir do primeiro volume de Obra Poética (2018), editado por Luis Manuel Gaspar e publicado pela Assírio & Alvim.

[Antes deste, foram publicados poemas de Rui Knopfli, Luiza Neto Jorge, Mário Cesariny, Natália Correia, Jorge de Sena, Glória de Sant’Anna, Mário de Sá-Carneiro, Sophia de Mello Breyner Andresen, Herberto Helder, Florbela Espanca, António Gedeão, Fiama Hasse Pais Brandão, Reinaldo Ferreira, Judith Teixeira, Armando Silva Carvalho, Irene Lisboa, António Botto, Ana Hatherly, Alberto de Lacerda, Merícia de Lemos, Vasco Graça Moura, Fernanda de Castro, José Gomes Ferreira, Natércia Freire, Gomes Leal, Salette Tavares, Camilo Pessanha, Edith Arvelos, Cesário Verde, António José Forte, Francisco Bugalho, Leonor de Almeida, Carlos de Oliveira, Fernando Assis Pacheco, José Blanc de Portugal, Luís Miguel Nava, António Maria Lisboa, Eugénio de Andrade, José Carlos Ary dos Santos, António Manuel Couto Viana, Ruy Cinatti, Al Berto, Alexandre O’Neill, Vitorino Nemésio, David Mourão-Ferreira, Miguel Torga, Ângelo de Lima e Pedro Tamen.]

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terça-feira, 15 de fevereiro de 2022

REPETIR É PRECISO


O Tribunal Constitucional deu provimento às reclamações apresentadas por cinco partidos: CHEGA, PAN, LIVRE, VOLT e MAS.

E os membros das mesas que anularam 157.205 votos ficam a rir-se? Não lhes são pedidas responsabilidades?

Na repetição não será admitido o voto postal, apenas o voto presencial nas representações diplomáticas.

Clique na imagem do Público.

domingo, 13 de fevereiro de 2022

TAMEN


UM POEMA POR SEMANA — Para este domingo escolhi três versículos aforísticos de Dentro de Momentos de Pedro Tamen (1934-2021), personalidade destacada do grupo de católicos progressistas que se afirmou contra o Estado Novo nos anos 1960.

Natural de Lisboa, Pedro Tamen estreou-se em livro com Poema para Todos os Dias (1956). Além de poeta, foi professor do ensino secundário, cineclubista, crítico literário, editor e director de revistas. Notabilizou-se como tradutor de, entre muitos outros, Gilgamesh, Sade, Flaubert, Proust, Foucault, Bataille, Sartre e Perec.

Daniel na Cova dos Leões (1970) impôs definitivamente o timbre da sua poesia, uma liturgia anticonvencional, culta e sarcástica. 

Durante a Guerra Colonial fez duas comissões de serviço militar em Moçambique.

Tendo colaborado largamente na imprensa, pertenceu ao núcleo fundador da revista O Tempo e o Modo. Dirigiu a editora Moraes (onde criou a colecção Círculo de Poesia) durante dezoito anos. Entre 1975 e 2000 foi administrador da Fundação Calouste Gulbenkian. Foi laureado com os mais importantes prémios literários nacionais, tendo recebido comendas em Espanha e França. Publicado em 2013, Retábulo das Memórias colige a obra poética completa, dezanove livros e dispersos.

Constituem o poema desta semana três versículos de Dentro de Momentos (1984). A imagem foi obtida a partir da primeira edição desse livro, acompanhada de colagens de Fernando de Azevedo e integrada, nessa data, na colecção Mvsarvm Officia da Imprensa Nacional.

Falecido em Setúbal em Julho de 2021, Pedro Tamen é pai de Miguel Tamen, ensaísta, tradutor e professor catedrático da Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa. 

[Antes deste, foram publicados poemas de Rui Knopfli, Luiza Neto Jorge, Mário Cesariny, Natália Correia, Jorge de Sena, Glória de Sant’Anna, Mário de Sá-Carneiro, Sophia de Mello Breyner Andresen, Herberto Helder, Florbela Espanca, António Gedeão, Fiama Hasse Pais Brandão, Reinaldo Ferreira, Judith Teixeira, Armando Silva Carvalho, Irene Lisboa, António Botto, Ana Hatherly, Alberto de Lacerda, Merícia de Lemos, Vasco Graça Moura, Fernanda de Castro, José Gomes Ferreira, Natércia Freire, Gomes Leal, Salette Tavares, Camilo Pessanha, Edith Arvelos, Cesário Verde, António José Forte, Francisco Bugalho, Leonor de Almeida, Carlos de Oliveira, Fernando Assis Pacheco, José Blanc de Portugal, Luís Miguel Nava, António Maria Lisboa, Eugénio de Andrade, José Carlos Ary dos Santos, António Manuel Couto Viana, Ruy Cinatti, Al Berto, Alexandre O’Neill, Vitorino Nemésio, David Mourão-Ferreira, Miguel Torga e Ângelo de Lima.]

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quinta-feira, 10 de fevereiro de 2022

ALMUDENA GRANDES


Hoje na Sábado

A morte precoce de Almudena Grandes (1960-2021) interrompeu um dos projectos mais ambiciosos da literatura de Espanha, a série de Episódios de Uma Guerra Interminável, terminada com A Mãe de Frankenstein, agora traduzido. Inspirando-se na vida de Aurora Rodríguez Carballeira, uma feminista avant la lettre, Almudena Grandes — formada em História — expõe a forma como o regime de Franco lidava com a psiquiatria.

Aurora foi internada depois de matar a filha de dezoito anos, a famosa Hildegart, menina-prodígio e activista republicana, abatida pela mãe com quatro tiros de pistola. O interesse da autora pela história clínica de Aurora começou no momento em que leu El Manuscrito Encontrado em Ciempozuelos, do psiquiatra Guillermo Rendueles Olmedo.

Como em livros anteriores, também neste se cruzam personagens fictícias e pessoas reais (entre outros, o psiquiatra Juan José López Ibor, que pretendia curar a homossexualidade dos pacientes), factos históricos e situações efabuladas. O manicómio feminino de Ciempozuelos existe, estando associado à tentativa de reconquista da cidade por parte do Quinto Regimento republicano, comandado por Gustavo Durán, amigo de Lorca, Buñuel e Alberti, figura lendária de Guerra Civil de Espanha.

Narrado a três vozes, uma delas a do psiquiatra Germán Velázquez Martín, A Mãe de Frankenstein centra-se nos últimos anos de vida de Aurora, fazendo o relato cru de como a repressão do nacional-catolicismo espanhol se estendia à esfera da saúde mental. Germán, que viveu exilado na Suíça durante quinze anos, regressa ao país em 1954, trazendo com ele métodos humanos e um medicamento experimental, a Clorpromazina. Ali chegado, Germán interessa-se pelo ‘caso’ de Aurora, bem como pela natureza da relação da filicida com a enfermeira María Castejón. É sobre este eixo central que se desenvolve a narrativa, tendo como pano de fundo as diversas faces da ignomínia franquista, como por exemplo o roubo de crianças filhas de republicanos, para serem entregues a famílias católicas. 

Uma extensa nota da autora contextualiza as relações de contiguidade entre ficção e realidade. A útil tábua de personagens que fecha o volume podia (e devia) ter sido inserida a abrir.

Escritos contra a amnésia histórica, os cinco romances que compõem a série de Episódios de Uma Guerra Interminável (o sexto ficou por concluir) estendem à segunda metade do século XX a saga ficcional escrita por Benito Pérez Galdós sobre os anos 1800.

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terça-feira, 8 de fevereiro de 2022

CIBERATAQUE


A Vodafone foi ontem à noite alvo de um ciberataque. Embora, ao fim de doze horas, tenham sido recuperados os serviços de voz e os dados móveis 3G, mantêm-se out o serviço de televisão e as redes de dados móveis 4G e 5G.

Um comunicado da empresa esclarece:

«Já recuperámos os serviços de voz móvel e os serviços de dados móveis estão disponíveis exclusivamente na rede 3G em quase todo o país. Infelizmente, a dimensão e a gravidade do acto criminoso a que fomos sujeitos implica para todos os demais serviços um cuidadoso e prolongado trabalho de recuperação. [...] Temos na Vodafone Portugal e no Grupo uma equipa experiente de profissionais de cibersegurança que, em conjunto com as autoridades competentes, está a realizar uma investigação aprofundada para perceber e ultrapassar a situação

Depois dos ciberataques ao Expresso, que inutilizou o site do jornal e todos os seus arquivos, à SIC e à revista Sábado, chegou a vez da Vodafone.

Imagem obtida hoje às 09:45h. Clique.

segunda-feira, 7 de fevereiro de 2022

ÂNGELO DE LIMA


UM POEMA POR SEMANA — Para este domingo escolhi o mais famoso poema de Ângelo de Lima (1872-1921), o simbolista que, tal como seu pai — o poeta Pedro de Lima —, morreu louco.

Natural do Porto, Ângelo de Lima nasceu no seio de uma família burguesa. Frequentou o Colégio Militar de Lisboa, de onde foi expulso, e a Academia de Belas Artes do Porto. Em 1891, integrado numa expedição a Manica e Sofala, cumpriu serviço militar em Moçambique.

Além de poeta, foi também pintor. Tendo poemas publicados em vários jornais e revistas literárias, uma delas o n.º 2 de Orpheu (1915), não publicou nenhum livro em vida. A sua breve Autobiografia foi publicada em 1992. O aparecimento da obra em volume deve-se a Fernando Guimarães, que em 1971 publicou as suas Poesias Completas.

Em 1894 foi internado no Hospital do Conde de Ferreira, no Porto, por alegadamente manter relações incestuosas com uma filha natural de seu pai. Teve alta ao fim de quatro anos, indo então viver para o Algarve. Em Dezembro de 1901, por ter dito um palavrão, foi preso no Teatro Dona Amélia [actual Teatro de São Luiz], de Lisboa. Internado no Hospital de Rilhafoles, ali permaneceu até morrer.

O poema desta semana foi publicado em várias revistas literárias a partir de 1900. A imagem pertence a Século de Ouro. Antologia Crítica da Poesia Portuguesa do Século XX, organizada por Osvaldo Manuel Silvestre e Pedro Serra, publicada em 2002 pela Cotovia e Angelus Novus.

[Antes deste, foram publicados poemas de Rui Knopfli, Luiza Neto Jorge, Mário Cesariny, Natália Correia, Jorge de Sena, Glória de Sant’Anna, Mário de Sá-Carneiro, Sophia de Mello Breyner Andresen, Herberto Helder, Florbela Espanca, António Gedeão, Fiama Hasse Pais Brandão, Reinaldo Ferreira, Judith Teixeira, Armando Silva Carvalho, Irene Lisboa, António Botto, Ana Hatherly, Alberto de Lacerda, Merícia de Lemos, Vasco Graça Moura, Fernanda de Castro, José Gomes Ferreira, Natércia Freire, Gomes Leal, Salette Tavares, Camilo Pessanha, Edith Arvelos, Cesário Verde, António José Forte, Francisco Bugalho, Leonor de Almeida, Carlos de Oliveira, Fernando Assis Pacheco, José Blanc de Portugal, Luís Miguel Nava, António Maria Lisboa, Eugénio de Andrade, José Carlos Ary dos Santos, António Manuel Couto Viana, Ruy Cinatti, Al Berto, Alexandre O’Neil, Vitorino Nemésio, David Mourão-Ferreira e Miguel Torga.]

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quinta-feira, 3 de fevereiro de 2022

LAURO ANTÓNIO 1942-2022


Vítima de ataque cardíaco fulminante, morreu hoje Lauro António, cineasta, encenador, crítico e professor. Tinha 79 anos.

Notabilizado com Manhã Submersa (1980), o mais célebre dos filmes que realizou, Lauro António desenvolveu grande actividade no cineclubismo, na rádio e na televisão. Foi director de festivais de cinema, arte sobre a qual deixa uma extensa bibliografia de mais de cem títulos.

A partir de uma doação sua à Câmara de Setúbal (milhares de livros, mas também filmes, fotografias, cartazes, documentos, objectos, etc.), foi inaugurada naquela cidade, em Maio do ano passado, a Casa das Imagens.

Os meus sentimentos a Maria Eduarda Colares, a seu filho Frederico Corado, mas também a Alexandra Prado Coelho.

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quarta-feira, 2 de fevereiro de 2022

MONICA VITTI 1931-2022


Morreu hoje Monica Vitti, musa de Antonioni e uma das grandes divas do cinema europeu dos anos 1960-70. Tinha 90 anos e sofria da doença de Alzheimer há mais de 25 anos.

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segunda-feira, 31 de janeiro de 2022

ABSOLUTA, OF COURSE



Maioria absoluta do PS. O Presidente da República começa a ouvir amanhã, nos termos do artigo 187.º, n.º 1, da Constituição, os Partidos com representação parlamentar. Clique nas imagens.

A NOITE MAIS LONGA


Quando faltam contar apenas os votos da emigração, o PS tem 117 deputados eleitos, o que faz dele o vencedor do acto eleitoral, com maioria absoluta. 

— O PSD perdeu 6 deputados mas mantém-se no 2.º lugar.

— Perdendo 14 deputados, o BE passou do 3.º para 6.º lugar.

— Perdendo 6 deputados, a CDU passou do 4.º para 5.º lugar.

— Perdendo 3 deputados, o PAN passou do 6.º para 8.º lugar.

— A extrema-direita do CH conseguiu eleger 12 deputados.

— Os liberais elegeram 8.

— O CDS e o PEV não obtiveram representação parlamentar.

Apesar da manipulação e do medo [mais de um milhão de portugueses confinados], aumentou o número de votantes. A abstenção baixou, o que não acontecia há dezassete anos.

A maioria absoluta do PS — e a continuação de António Costa como primeiro-ministro — é motivo de regozijo. 

Sem surpresa, os portugueses penalizaram fortemente quem chumbou o OE para 2022. Estava escrito nas estrelas? Parece que sim.

Nota patética da noite: Francisco Rodrigues dos Santos conseguiu a proeza de fazer implodir o CDS, um dos Partidos fundadores da democracia portuguesa.

Imagem: secretaria-geral do MAI. Clique.

domingo, 30 de janeiro de 2022

TORGA


UM POEMA POR SEMANA — Para este domingo escolhi Primeira Endecha de Miguel Torga (1907-1995), um dos mais influentes escritores portugueses do século XX.

Natural de São Martinho de Anta (Sabrosa), Torga — pseudónimo de Adolfo Correia da Rocha — foi, ainda criança, moço de recados de uma família abastada do Porto e candidato a seminarista. Aos 13 anos emigrou para o Brasil, onde viveu cinco anos como apanhador de café na Fazenda de Santa Cruz, em Minas Gerais, tendo regressado a Portugal em 1925.

Publicou o primeiro livro, Ansiedade (1928), no ano em que se matriculou na Faculdade de Medicina da Universidade de Coimbra.

Médico otorrinolaringologista de profissão, Miguel Torga publicou, além de poesia, contos, novelas, romances, peças de teatro, ensaios, crónicas, cinco volumes de memórias e dezasseis volumes do famoso «Diário». Homem de esquerda, teve livros apreendidos, foi preso pela PIDE e impedido de viajar para o estrangeiro.

Adversário da integração de Portugal na Comunidade Económica Europeia, militou publicamente contra a assinatura do Tratado de Maastricht.

Em 1960, a Universidade de Montpellier propôs o seu nome para o Nobel da Literatura, ao mesmo tempo que a intelligentsia portuguesa propunha Aquilino Ribeiro (nenhum dos dois ganhou). Voltaria a ser candidato em 1978, dessa vez sob unanimidade nacional. Traduzido em vários países europeus, recebeu, entre outros, os prémios Montaigne (1981), Camões (1989) e Vida Literária (1992).

Foi casado com a professora e ensaísta Andrée Crabbé Rocha e é pai da professora e ensaísta Clara Rocha.

O poema desta semana pertence a Abismo (1932). A imagem foi obtida a partir do primeiro volume de Poesia Completa (2007), publicado pela Dom Quixote. Foi a primeira vez que um livro seu apareceu nas livrarias sob chancela editorial: em vida, todos os seus livros foram publicados em edição de autor.

[Antes deste, foram publicados poemas de Rui Knopfli, Luiza Neto Jorge, Mário Cesariny, Natália Correia, Jorge de Sena, Glória de Sant’Anna, Mário de Sá-Carneiro, Sophia de Mello Breyner Andresen, Herberto Helder, Florbela Espanca, António Gedeão, Fiama Hasse Pais Brandão, Reinaldo Ferreira, Judith Teixeira, Armando Silva Carvalho, Irene Lisboa, António Botto, Ana Hatherly, Alberto de Lacerda, Merícia de Lemos, Vasco Graça Moura, Fernanda de Castro, José Gomes Ferreira, Natércia Freire, Gomes Leal, Salette Tavares, Camilo Pessanha, Edith Arvelos, Cesário Verde, António José Forte, Francisco Bugalho, Leonor de Almeida, Carlos de Oliveira, Fernando Assis Pacheco, José Blanc de Portugal, Luís Miguel Nava, António Maria Lisboa, Eugénio de Andrade, José Carlos Ary dos Santos, António Manuel Couto Viana, Ruy Cinatti, Al Berto, Alexandre O’Neil, Vitorino Nemésio e David Mourão-Ferreira.]

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