sábado, 3 de novembro de 2018

TOURADAS OUT


Obviamente.

sexta-feira, 2 de novembro de 2018

ABATER, DIZ ELE

Wilson Witzel, 50 anos, membro do Partido Social Cristão, juiz demissionário, novo governador do Rio de Janeiro (eleito com 59,9% dos votos), mandatou as delegacias de polícia para formarem grupos de atiradores — os chamados ‘atiradores designados’ — que terão como função abater criminosos armados.

Flávio Pacca, o principal conselheiro de Witzel, deu uma entrevista em que explica: «O criminoso com fuzil não precisa ter ninguém na mira de uma arma para ser abatido. Quando qualifico o policial eu protejo a comunidade

Por seu turno, entrevistado anteontem pela GloboNews, no programa Estúdio 1, o governador Witzel sublinhou: «Até de helicópteros, quem esteja numa favela portando um fuzil. A aeronave ajuda e preserva vidas nas favelas. Dos moradores e dos policiais. Os traficantes ocupam o tecto das casas e tentam tirar proveito disso. Se temos atiradores preparados podemos inibir ataques às pessoas. A única pessoa que tem que ter medo é o criminoso e não a sociedade

Isto parece uma anedota de mau gosto. Infelizmente, não é.

MORO DUBLÊ DE BERIA


A escolha de Sérgio Moro para ministro da Justiça e da Segurança Pública só espanta quem vive na lua. O juiz da Operação Lava Jato participou sem pudor nas eleições brasileiras a partir do momento em que mandou prender Lula, o homem que liderava todas as sondagens para Presidente.

Bolsonaro quer apenas 15 ministérios (em vez dos 39 de Dilma) e tem estado a fundir vários. Face à nova orgânica — Justiça e Segurança Pública —, Moro vai, além da Justiça, tutelar também a Secretaria Nacional de Segurança Pública, a Força Nacional, a Polícia Federal, a Polícia Rodoviária Federal, o Departamento Penitenciário, a Secretaria Nacional de Políticas sobre Drogas, a Controladoria Geral da União, a Comissão de Amnistia, a Fundação Nacional do Índio, bem como os organismos responsáveis pela lavagem de dinheiro e fuga de capitais.

Quem aplaudiu a medida e a escolha do titular? Acertou: Fernando Henrique Cardoso.

Desde Beria (URSS) que não se via tamanha concentração de poder num único homem. Comentários para quê?

Clique na imagem do jornal brasileiro Globo.

quarta-feira, 31 de outubro de 2018

CABRAL & MORRIS


Hoje na Sábado escrevo sobre Pão de Açúcar, de Afonso Reis Cabral (n. 1990). A partir do brutal assassinato de Gisberta Salce Junior, transexual brasileira, o autor escreveu este romance não-ficcional. Quem leu A Sangue Frio, de Truman Capote, identifica o género. Factos: em Fevereiro de 2006, Gisberta, 45 anos, foi encontrada morta no poço alagado de um prédio inacabado da cidade do Porto, conhecido como Pão de Açúcar. Durante três dias, fora repetidamente violada e espancada por catorze rapazes, onze deles sob tutela da Oficina de São José, instituição católica vocacionada para o acolhimento de menores. Apenas um deles era maior de 16 anos. Gisberta foi atirada semi-nua para o poço, na presunção de que não resistira à tortura: pancada, queimaduras de cigarro, penetração com paus de madeira. A autópsia demonstrou que estava viva no momento da queda. Gisberta tinha sida, era toxicodependente, prostituta e sem-abrigo. Montou a sua barraca naquele andar vazio do Pão de Açúcar. Um dos rapazes é filho de uma prostituta que contratara como ama-seca uma mulher amiga de Gisberta. Em Setembro de 2007 todos estavam em liberdade. O caso chocou a opinião pública, mobilizou a comunidade LGBTI e deu origem a manifestações culturais (um documentário, duas peças de teatro, um poema notável de Alberto Pimenta, uma balada de Pedro Abrunhosa também interpretada por Maria Bethânia, vários textos de análise) que têm o seu corolário no romance de Afonso Reis Cabral agora publicado. Ficcionando a persona de Gisberta, foi com este material que o autor lidou. A narrativa centra-se no quotidiano dos rapazes (os da Oficina de São José e os outros três), tentando explicar o caldo de cultura que propiciou a barbárie. A deriva “literária” rouba força ao discurso. Diz o narrador: «Assim em repouso, bateu-me uma falta de ar que era tanto tristeza como excesso de amizade e muita falta de carinho.» O romance é antecedido de uma Nota Antes e fecha com uma Nota Depois. O autor deixa claro que está a lidar com factos verídicos alvo de cobertura mediática. É uma espécie de Balada dos Catorze, bem intencionada e naïve. Três estrelas. Publicou a Dom Quixote.

Escrevo ainda sobre Manhattan’45, de Jan Morris (n. 1926). Vários livros da autora têm sido traduzidos entre nós, sendo este o mais recente. Não se trata de um livro de viagens: é um livro sobre como era Manhattam em 1945, logo após o fim da Segunda Guerra Mundial. Cada um dos sete capítulos tem secções autónomas sobre temas específicos: os transeuntes da Midtown, a fina flor, judeus, celebridades, as ruas, vida ao ar livre, tradições, etc., breves ensaios de recorte sociológico sobre a Nova Iorque de 1945, nas circunstâncias próprias do Armistício. O livro é de 1987, mas esta edição inclui a introdução de 2011. Seja como for, a escrita de Morris é de tal modo envolvente que nos esquecemos do facto central: aquela cidade já não existe. Um exemplo: a Ópera (o Met) não funciona desde 1966 na morada indicada. Uma nota de rodapé sinaliza o detalhe en passant, mas a minuciosa descrição dos programas operáticos e dos seus frequentadores reporta a 1945. Numa escrita de primeiríssima água, Morris doseia cultura, informação, humor, história, memória e idiossincrasias pessoais. Cinco estrelas. Publicou a Tinta da China.

terça-feira, 30 de outubro de 2018

POESIA


Chegaram hoje da tipografia os primeiros exemplares. Deu-me muito prazer organizar em volume único toda a poesia de António Botto (1897-1959), publicada entre 1921 e 1959. 

São 22 livros: os quinze que compõem Canções — Adolescente / Curiosidades Estéticas / Piquenas Esculturas / Olimpíadas / Dandismo / Ciúme / Baionetas da Morte / Piquenas Canções de Cabaret / Intervalo / Aves de Um Parque Real / Poema de Cinza / Tristes Cantigas de Amor / A Vida Que Te Dei / Sonetos / Toda a Vida —, e ainda Motivos de Beleza, Cartas Que Me Foram Devolvidas, Cantares, O Livro do Povo, Ódio e Amor, Fátima. Poema do Mundo, e o livro póstumo Ainda Não Se Escreveu. Nas suas 815 páginas, o volume inclui também os poemas escritos para o filme Gado Bravo (1934), de António Lopes Ribeiro.

A magnífica foto da capa, que desconstrói por completo a imagem de dandy associada ao poeta, é da autoria de Mário Novais. 

Numa livraria perto de si a partir do próximo 9 de Novembro.

segunda-feira, 29 de outubro de 2018

A INDIFERENÇA

O que mais impressiona no resultado das eleições brasileiras não são os 57,8 milhões de brasileiros que votaram em Bolsonaro. São os 31,5 milhões de abstencionistas, num país onde o voto é obrigatório. Além dos mais de trinta milhões de brasileiros que recusaram votar, outros 11 milhões boicotaram o acto, votando nulo (8,6 milhões) ou em branco (2,4 milhões). Dito de outra forma, 31% dos eleitores inscritos borrifou-se para as eleições.

Agora é esperar para ver. Os 10,7 milhões de votos que separam Bolsonaro (57.797.466 = 55,2%) de Haddad (47.040.859 = 44,8%) ilustram a bipolarização da sociedade brasileira.

Daqui até 1 de Janeiro, data da inauguração presidencial, muita água vai correr sob as pontes.

domingo, 28 de outubro de 2018

BRASIL VIROU

Consumaram-se os piores prognósticos. Com 99% do apuramento feito, Bolsonaro foi eleito Presidente com 55,2% dos votos válidos. Haddad ficou com 44,8%. A ver vamos se daqui a um ano os 57,7 milhões de brasileiros que votaram Bolsonaro estão de cara levantada.

BRASIL EM TRANSE

Há três semanas, 50 milhões de brasileiros votaram em Bolsonaro. O Brasil tem 50 milhões de fascistas? Não precisa. O fascismo português durou 48 anos (1926-1974). Portugal tinha 10 milhões de fascistas?

O fascismo português começou com a ditadura militar, instaurada nove dias após o pronunciamento militar de 28 de Maio de 1926 (Gomes da Costa) que pôs termo à Primeira República. Continuou com a ditadura civil, estabelecida com a eleição de Carmona em Março de 1928. Entrou em velocidade de cruzeiro em Julho de 1932, quando Salazar foi nomeado chefe do VIII Governo da Ditadura. Até que, em Abril de 1933, a entrada em vigor de uma nova Constituição instituiu o Estado Novo. Doravante, Salazar seria Presidente do Conselho, cargo que ocupou até 27 de Setembro de 1968. Marcello Caetano encerrou o capítulo em Abril de 1974.

Sem a Guerra Colonial, que durou 13 anos e mobilizou um milhão e meio de homens, o fascismo português teria acabado em 1974?

Relativizar o que se passa no Brasil é muito perigoso.