sábado, 9 de abril de 2016

MAIORIA MANTÉM-SE

Foi divulgado hoje o mais recente estudo da Aximage para o Correio da Manhã. PS — 35,6%. PSD — 33,5%. BE — 10%. CDU — 6,2%. CDS — 4,2%. Maioria de Esquerda  51,8%. Confiança para primeiro-ministro: Costa — 50,8%. Passos — 38,8%.

CULTURA & ESTADO

Ando há mais de dez anos a bater na mesma tecla: não faz sentido existir ministério (ou secretaria) da Cultura. Disse-o dezenas de vezes aqui no blogue, repeti em entrevistas e programas de televisão, creio que já abordei o assunto no Facebook, e até fui citado a esse respeito por um dos titulares do cargo. Ninguém concorda. Estou sozinho. Do meu ponto de vista, um ministro ou secretário da Cultura fará sentido na Coreia do Norte ou no Zimbabwe. Adiante. Em seu lugar deveriam coexistir dois Institutos, com autonomia administrativa e financeira, um com a tutela do Património, outro com a tutela das Artes. O argumento do Conselho de Ministros não me comove.

Não compete a um membro do Governo decidir se o dinheiro vai para o filme A e não para o filme B, para a companhia de teatro C ou D, para o músico E ou F, se é fulano ou beltrano que representa o país nas bienais de Veneza ou no Festival de Edimburgo, e por aí fora. Temos aliás um exemplo: o Instituto Camões, tutelado pelo ministério dos Negócios Estrangeiros, e não pela Cultura, é a entidade que decide os apoios do Estado às traduções de obras de autores nacionais, as idas de escritores ao estrangeiro, etc. Isto não tem nada a ver com as capacidades profissionais de algumas das dezenas de personalidades de todos os sexos que, nos últimos 42 anos, ocuparam os cargos de ministro, secretário ou subsecretário de Estado da Cultura. Disse.

O COLARINHO DE LOUÇÃ

Francisco Louçã foi de gravata à posse de conselheiro de Estado. E, naturalmente, não a meteu no bolso durante a reunião. O Observador fez manchete. E foi ouvir uma senhora, I presume, citada com um palavrão inglês que significará, I presume, especialista em dress code, a qual afirmou ser inadmissível usar gravata de seda com colarinho de botões. Onde é que estas almas descobrem estas coisas?

CONTRA A INIQUIDADE

O Parlamento aprovou ontem em votação final global um diploma do PS+BE+PCP que impede a venda de habitação própria e permanente de pessoas com dívidas ao Fisco. O PSD votou contra. O CDS absteve-se. Se o valor patrimonial do imóvel for superior a 574 mil euros, a possibilidade de venda fica suspensa durante um ano.

sexta-feira, 8 de abril de 2016

SOARES SAI


Na sequência da polémica que envolveu o ministro da Cultura e um articulista do Público

«Torno público que apresentei esta manhã ao senhor primeiro-ministro, António Costa, a minha demissão do XXI Governo Constitucional. Faço-o por razões que têm a ver com a minha profunda solidariedade com o Governo e o primeiro-ministro, e o seu projecto político de esquerda. [...] Demito-me também por razões que têm a ver com o meu respeito pelos valores da liberdade. Não aceito prescindir do direito à expressão da opinião e palavra

A imagem é do Expresso. Clique.

PALÁCIO CHIADO


Toda a gente conhece o Palácio Quintela-Farrobo da rua do Alecrim, quanto mais não seja porque durante quarenta anos foi lá que o IADE funcionou. Desocupado há dois anos, reabriu agora, restaurado (vitrais, frescos, soalhos, etc.), como Palácio Chiado, um multiplex gourmet onde cabe um bar e sete restaurantes. Mas só o japonês Sushic Chiado, irmão do Renaissance Almada, tem lugares sentados e serviço de mesa. Existe ainda uma sala particular para eventos privados com capacidade máxima para 25 pessoas. Também há uma área de exposições de arte. Quem viajou alguma coisa conhece o conceito: cartão à entrada para ir registando o consumo, oferta diversificada e por aí fora. Fecha às duas da manhã. Clique na imagem.

DON’T ASK, DON’T TELL

O Presidente da República aceitou o pedido de demissão, por “razões pessoais”, do general Carlos Jerónimo, chefe do Estado-Maior do Exército. Aparentemente, as “razões pessoais” têm que ver com o desagrado do ex-CEME face à posição pública do ministro da Defesa que exigiu explicações à direcção do Colégio Militar sobre a exclusão de alunos homossexuais. O mandato do general Carlos Jerónimo só terminava em Fevereiro de 2018.

O NÃO HOLANDÊS

A vitória do NÃO no referendo holandês sobre o acordo UE-Ucrânia tem sido tratado com displicência pelos media. Mas não adianta tapar o sol com a peneira. O resultado tem força de lei porque a participação no referendo foi superior a 30%. Facto: o acordo UE-Ucrânia foi rejeitado por 61,1% dos votantes, situação que devia levar à demissão do Governo de Mark Rutte. A ver vamos o que sucede.

quinta-feira, 7 de abril de 2016

ANA ZANATTI


Hoje na Sábado escrevo sobre O Sexo Inútil, de Ana Zanatti (n. 1949), mais conhecida como actriz, mas autora de romances, contos, poemas e literatura para a infância. Trata-se de um ensaio aberto sobre o universo LGBT. Chamo-lhe ensaio aberto porque a autora teve a habilidade de driblar a genologia. Uma obra pioneira por dar a conhecer o interdito: a violência exercida no seio da família sobre rapazes e raparigas que têm a coragem de assumir a sua identidade homossexual, em meios urbanos e classes letradas, no coração da alta classe média de Lisboa e Cascais. O senso comum torna difícil associar este tipo de comportamentos a estratos “educados” da sociedade? O ponto é esse: fazer luz sobre o inominável. Será com um misto de perplexidade e vergonha que muitos leitores irão interrogar-se: como é possível, na Europa do século XXI? A síntese de Viriato Soromenho-Marques, autor do prefácio, é perfeita: «Este é um livro sobre o que de mais profundo vive no coração da condição humana.» Num hábil patchwork, Ana Zanatti intercala a correspondência trocada com Joana, nome fictício da jovem universitária que corrobora o drama em pauta, com envios de natureza autobiográfica, reflexões sobre a sociedade portuguesa, excertos do diário da adolescência, bem como dezenas de testemunhos, de pais e filhos, quase todos sob anonimato. Num apêndice, coligem-se histórias na primeira pessoa, algumas das quais colocadas em linha no site da rede ex aequo. Uma epígrafe de Virginia Woolf, «The eyes of others, our prisons; their thoughts, our cages», sinaliza a sanção. Ser hetero ou homossexual (uso o termo para ambos os sexos) não é uma escolha. Verdade que a diferença contraria a norma, mas a letra da Lei não pode ter dois pesos e duas medidas conforme se esteja na esfera pública ou privada. No dia em que a dualidade acabar, poderemos falar de avanço civilizacional. Sejamos claros: este é um livro contra o preconceito. Ana Zanatti faz um tour d’horizon entre os anos 1960 (a sua adolescência) e a actualidade. O retrato incomoda mas é nesse “atrito” que reside a sua força. Lídia Jorge assina o posfácio. Quatro estrelas.

Escrevo ainda sobre Estufa com Ciclâmenes, de Rebecca West (1892-1983). Quando a Primeira Grande Guerra terminou, a autora escreveu um romance, O Regresso do Soldado, sobre o conflito que devastou a Europa entre 1914 e 1918. Ainda nenhuma mulher o havia feito.  Agora volta a servir-se da guerra como Leitmotiv. Simbiose de jornalismo literário e ensaio, o livro colige três textos de A Train of Powder, uma extensa reportagem sobre os julgamentos de Nuremberga, aos quais a autora assistiu como enviada do Daily Telegraph. Sem perder de vista as implicações morais, Rebecca relata os factos com objectividade: «Na primeira parte da leitura da sentença não houve referências aos acusados, apenas às instituições que haviam formado.» Quando o jornal lhe pediu para cobrir os julgamentos, era já uma autora consagrada, com cinco romances e sete livros de não-ficção publicados. Desde sempre ligada à política, feminismo incluído, manteve uma longa relação com H. G. Wells, pai do seu filho. Estufa com Ciclâmenes suscita um problema prático: o livro vai para a estante de Literatura, ou para a de História? Diria, sem favor, que fica bem nas duas. Quatro estrelas. Editou a Relógio d’Água.

quarta-feira, 6 de abril de 2016

BRASIL A VOTOS


Dentro e fora do Brasil já toda a gente percebeu que Dilma acabou. Mesmo que o impeachment seja chumbado (e tudo indica o contrário), a Presidente não tem condições para prosseguir. Ganha por isso força a ideia de antecipar para Outubro as eleições presidenciais de 2018. É um desfecho plausível. A avaliar por declarações da nomenklatura política brasileira, PT, PMDB e PSDB parecem estar de acordo. Dos 513 parlamentares, 234 já se manifestaram a favor do impeachment, 110 contra, e 169 recusam divulgar o sentido do voto. A ver vamos. Clique na imagem.

AFECTOS, DIZ ELE

O subdirector do Colégio Militar, tenente-coronel António José Ruivo Grilo, disse ao Observador na passada sexta-feira:

«Nas situações de afectos [homossexualidade] obviamente não podemos fazer transferência de escola. Falamos com o encarregado de educação para que percebam que o filho acabou de perder espaço de convivência interna e a partir daí vai ter grandes dificuldades de relacionamento com os pares. Porque é o que se verifica. São excluídos.»

Sucede que a Constituição da República (e as leis em vigor) não permite discriminações com base na orientação sexual. O ministério da Defesa já pediu esclarecimentos e o BE quer ouvir no Parlamento a direcção do colégio. Tudo chega atrasado a Portugal, até o conveniente don’t ask, don’t tell...

SHAKESPEARE


Vi em diferido a primeira de quatro peças de Shakespeare com que a RTP-2 está a assinalar os 400 anos da morte do poeta e dramaturgo. Produzidas pelo Globe Theather, as peças são exibidas aos sábados à noite: Romeu e Julieta, no passado dia 2, A Tempestade, no próximo dia 9, Tanto barulho para nada, dia 16, e Noite de Reis, dia 23, data em que se comemoram 452 anos do nascimento do autor. Dia 30 será exibido o documentário Shakespeare: Last Will & Testament. Não queriam a RTP a cumprir serviço público? Aí o têm. Na imagem, Adetomiwa Edun (o nigeriano que estudou em Eton), atraente Romeu, e Ellie Kendrick, como Julieta.

terça-feira, 5 de abril de 2016

IR AO POTE NA ISLÂNDIA

Os portugueses, e foram muitos, que andaram a dizer que na Islândia é que era bom, deviam reflectir nas consequências do populismo. Em 2013, elegeram Sigmundur Davío Gunnlaugsson para resgatar a honra perdida do país. Anteontem descobriram que Gunnlaugsson, o primeiro-ministro “impoluto”, depositou milhares de milhões em offshores. Veio de onde, esse dinheiro? Gunnlaugsson teve que fugir de uma conferência de imprensa que estava a ser transmitida em directo. E a população exige eleições imediatas.

Gunnlaugsson não é o rei da Arábia Saudita, nem sequer Putin. Gunnlaugsson é o primeiro-ministro de um país com menos população que o concelho de Sintra. Gunnlaugsson é o primeiro-ministro de um país cuja dívida, em 2008, representava 900% (novecentos!) do PIB. Gunnlaugsson é o primeiro-ministro de um país que declarou falência porque os seus três maiores bancos (Glitnir, Landsbanki e Kaupthing) colapsaram. A simples lembrança da onda de puritanismo que então se verificou, ainda hoje provoca náuseas. Há portanto uma espécie de justiça poética na revelação de que Gunnlaugsson e o senhor Platini são farinha do mesmo saco.

segunda-feira, 4 de abril de 2016

PANAMA LEAKS

Isto não se faz ao DCIAP e à CMTV. Então Sócrates, que fez tudo e mais um par de botas, não consta dos Panama Leaks? Nem uma referência de raspão, uma nota de rodapé, uma insinuação de viés, nos mais de onze milhões de registos e ficheiros (1970-2015) coligidos e analisados pelo International Consortium of Investigative Journalists?

Caramba: são cerca de 215 mil empresas com sede em offshores, envolvendo chefes de Estado (entre outros, Putin e o rei da Arábia Saudita), primeiros-ministros (entre outros, os da Islândia e do Paquistão), dezenas de dirigentes políticos de cinquenta países, ministros de vários governos, o pai de David Cameron, familiares próximos do presidente chinês Xi Jinping, o violoncelista russo Sergei Roldugin, nomes de topo do futebol (como Platini e Messi), celebridades avulsas, etc., e o Sócrates não é citado? Alguma coisa não bate certo. O ICIJ até encontrou um português, de seu nome Idalécio de Castro Rodrigues de Oliveira. E no conjunto das offshores investigadas, um total de 107 estão directamente relacionadas com o caso Lava Jato. Se calhar a Operação Marquês nunca existiu.