quinta-feira, 7 de outubro de 2021

NOBEL DA LITERATURA 2021


O Nobel da Literatura 2021 foi há pouco atribuído ao tanzaniano Abdulrazak Gurnah, 73 anos, natural de Zanzibar.

Autor de uma dezena de romances, um livro de contos e vários ensaios sobre autores de língua inglesa e literatura pós-colonial, Gurnah estudou na Inglaterra e deu aulas na Nigéria antes de transferir-se para a Universidade de Kent, onde se doutorou em 1982.

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LIVROS PARA O OUTONO


Hoje na Sábado.

A partir da morte de Hamnet Shakespeare, Maggie O’Farrell (n. 1972) escreveu Hamnet, romance inspirado na vida do bardo com Anne Hathaway. É a história de um casal de Stratford-upon-Avon. O’Farrell diz apenas: «Cerca de quatro anos depois, o pai escreveu uma peça chamada Hamlet.» (O mesmo nome escrevia-se nas duas formas.) É desconhecida a causa da morte de Hamnet, mas no romance é vítima da peste. Quando o filho morre, já Shakespeare estava estabelecido em Londres. Portanto, tudo gira em torno de Anne e dos filhos. Mais exactamente, sobre o luto da mulher que se sente responsável pela morte do filho de onze anos. Sem beliscar factos históricos, a narrativa é deveras empolgante. Com Hamnet, O’Farrell ganhou o Women’s Prize for Fiction 2020.

Com nova tradução, temos de volta Olá, América!, uma das distopias mais famosas do inglês J.G. Ballard (1930-2009). Publicado pela primeira vez em 1981, o livro “antecipa” o apocalipse dos Estados Unidos nos anos 2100, após um colapso ambiental (a Rússia barrou o Estreito de Bering que liga o Pacífico ao Ártico) e financeiro de proporções bíblicas. Com Charles Manson na Casa Branca e dois terços dos norte-americanos expatriados na Europa e na Ásia, um grupo de aventureiros parte de Inglaterra para averiguar o que se passa do outro lado do Atlântico. Excessivo, irónico, mordaz, por vezes burlesco, Olá, América! é uma visão dantesca do fracasso do sonho americano.

Com A Anomalia, Hervé Le Tellier (n. 1957) venceu no ano passado o Prémio Goncourt. O livro foi agora traduzido por Tânia Ganho, que encontrou o registo certo do thriller. Dividido em três partes, sinalizadas por versos de Queneau, A Anomalia é uma sucessão de narrativas escritas de acordo com o perfil das respectivas personagens, muito diferentes entre si. Tudo se passa num voo entre Paris e Nova Iorque, mas podia ser num festival literário, tantas são as referências literárias (nomes, citações, trocadilhos, opinião). Ficcionista, ensaísta e colunista político, Le Tellier é o paradigma do intelectual público francês. Mérito maior: ao contrário de outros laureados da sua geração, o que escreve não provoca enfado.

A ficção identitária vive um momento alto, e A Outra Metade de Brit Bennett (n. 1990) é do melhor que tem sido escrito sobre interditos étnicos. Em Mallard, a cidade do romance, ninguém se casava com gente escura. Até aqui, nada que o inventário do racismo não ilustre. O ponto é outro: de forma a ficarem cada vez mais claros, os negros de Mallard fazem casamentos mistos. Com dezasseis anos, as gémeas Vignes fogem da cidade após o linchamento do pai. Contudo, enredam-se noutro tipo de contradições. Stella casa com um branco desconhecedor das suas origens, e Desiree regressa à cidade com uma filha negra como o alcatrão. Estamos nos anos 1950, no auge do segregacionismo. A saga prossegue até aos anos 1970, com as filhas de ambas em confronto com novas realidades (a transexualidade, etc.) e perspectivas de vida opostas. Brit Bennett é um nome a fixar.

Pode um irlandês, radicado em Nova Iorque, ficcionar o quotidiano da Palestina? Foi o que fez Colum McCann (n. 1965), professor do Hunter College. O livro tem um título estranho, Apeirogon, que significa polígono infinito. McCann conta a história de dois homens, um judeu e um palestiniano, unidos pelo denominador comum de terem perdido as filhas pré-adolescentes: em 1997, Smadar, 13 anos, vítima de bombistas suícidas; em 2007, Abir, 10 anos, com um tiro na nuca. Não são personagens de ficção, isto aconteceu. Os factos foram «compilados a partir de uma série de entrevistas em Jerusalém, Nova Iorque, Jericó e Beit Jala», embora o autor tenha arredondado o discurso. Ao longo de mil e um capítulos (Mitterrand e família, amante incluída, surgem no sexto), como nas mil e uma noites do clássico árabe, McCann tenta expor o absurdo do conflito que opõe os dois Estados. São muitas as derivações de tema e sentido, da Flauta Mágica à Mossad. Vários capítulos resumem-se a uma única linha. Também há ilustrações. Como refere o subtítulo, trata-se de viagens infinitas.

A italiana Rosa Ventrella regressa com A Maledicência. Quem gostou de História de Uma Família Decente vai gostar deste regresso ao coração da Apúlia. Tendo a Segunda Guerra Mundial em pano de fundo (e, mais tarde, a reforma agrária), o romance opõe a fome e a moral, no registo fluente a que a autora nos habituou.

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terça-feira, 5 de outubro de 2021

FERNANDO ECHEVARRÍA 1929-2021


Morreu ontem Fernando Echevarría, um dos grandes poetas portugueses do século XX. Filho de pai português e mãe espanhola, Echevarría nasceu em Cabezón de la Sal, onde seu pai se exilara após o fracasso da denominada Monarquia do Norte. Foi aliás em Espanha que concluiu os estudos de Filosofia e Teologia.

Estreou-se em livro com Entre Dois Anjos (1956), tendo publicado com regularidade durante sessenta anos consecutivos. Em 1961 emigrou para Paris, integrando movimentos oposicionistas, como o Movimento de Acção Revolucionária e a Frente Patriótica de Libertação Nacional, de que foi um dos fundadores. Pertenceu ao Grupo de Argel, país onde se radicou em 1963. Em 1966 regressou a França, onde viveu mais de vinte anos. Regressou a Portugal na segunda metade dos anos 1980, fixando residência no Porto.

Traduzido em vários idiomas, várias vezes premiado, recusou todos os cargos oficiais que depois de 1974 lhe foram sendo propostos.

A notícia só hoje foi divulgada por sua mulher. Echevarría tinha 92 anos e estava internado.

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