sexta-feira, 14 de junho de 2019

ESTUÁRIO


Com Estuário (2018), Lídia Jorge acaba de vencer o Grande Prémio de Literatura DST.

Faz hoje exactamente um ano, publiquei na Sábado um texto de que transcrevo um breve excerto:

«A ficção portuguesa sofreu uma guinada quando Lídia Jorge publicou o primeiro livro. É bom verificar que, ao fim de 38 anos, a obra permanece incólume. O título mais recente, ‘Estuário’, mantém a pujança inaugural. Dominando na perfeição todos os recursos narrativos, a autora constrói o romance a partir da figura de Edmundo Galeano, um jovem regressado do inferno de Dadaab, um dos campos de refugiados que o ACNUR mantém no Quénia [...] Lídia Jorge é muito hábil na forma como ilustra o contraponto das premências. De um lado, os equívocos da ajuda humanitária. Do outro, o desajuste das famílias. [...]»

Parabéns, Lídia.

Foto de António Pedro Ferreira para a Visão. Clique.

PASSO IMPORTANTE

Com os votos favoráveis do PS, BE, PSD, PCP, PEV e PAN, a Assembleia da República aprovou hoje o fim das taxas moderadoras nos Centros de Saúde e nas consultas e exames prescritos por médicos ao serviço do SNS.

O CDS votou contra.

O MUNDO ESTÁ PERIGOSO


Guterres chegou à capa da Time, um feito até hoje só conseguido por Salazar, Dean of Dictators, 1946, Spínola, Coup in Portugal, 1974 e, sob o título Red Threat in Portugal (1975), os rostos de Otelo, Vasco Gonçalves e Costa Gomes dentro de uma foice e um martelo.

Até hoje, nenhum escritor, músico, cientista ou artista plástico.

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quinta-feira, 13 de junho de 2019

SUCESSÃO DE MAY


A primeira volta das eleições para líder dos tories, hoje efectuada, deu este resultado:

Vencedor, Boris Johnson, com 114 votos.

Os outros: Jeremy Hunt, 43 / Michael Gove, 37 / Dominic Raab, 27 / Sajid Javid, 23 / Matt Hancock, 20 / Rory Stewart, 19.

Por não terem obtido o score mínimo de 17 votos para poderem passar à segunda volta, foram eliminados:

Andrea Leadsom, antiga líder da Câmara dos Comuns, 11 / Mark Harper, 10 / Esther McVey, 9.

Após três voltas reservadas a deputados e membros do Governo, a votação final será feita por todos os militantes do partido.

Clique na imagem do Guardian.

quarta-feira, 12 de junho de 2019

O FOLHETIM


Temendo o que aí vem (estamos a falar do senhor ou da senhora que substituirá Theresa May como líder dos tories e, nessa qualidade, chefe de Governo), o Labour e alguns conservadores pró-europeus da Escócia e dos Verdes apresentaram hoje nos Comuns uma moção visando impedir um Brexit sem acordo.

Dito de outro modo, quiseram travar o passo a Boris Johnson, que promete sair sem acordo e sem pagar. Foram derrotados por 309 contra 298 votos.

Por mais voltas que dêem, a realidade é uma: eles querem sair, e querem fazê-lo sem acordo. May era um empecilho. Mas a Fronda continua.

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SEIS. PORQUE SIM.


Hoje, na Sábado, um apanhado de escolhas pessoais. Quem gosta de ler fica bem servido. Que melhor ocasião para falar de vários livros de uma assentada senão o período da Feira? 

Escolhi seis, todos com justa causa. Chico Buarque, o mais recente vencedor do Prémio Camões, regressa com Tantas Palavras, volume que reúne as letras de todas as canções. Regresso a Reims, de Didier Eribon, é um amargo ajuste de contas. A reedição de O Nu na Antiguidade Clássica, de Sophia de Mello Breyner Andresen, surge no ano das celebrações do centenário da autora. Less, de Andrew Sean Greer, recebeu o Pulitzer de Ficção 2018. A Morte é um Acto Solitário, um thriller de Ray Bradbury, mantém-se aliciante. Last but not least, Serotonina, de Michel Houellebecq, traz de volta o único romancista francês contemporâneo capaz de ombrear com os mais notáveis dos seus pares noutros idiomas.

Compositor, letrista, cantor, ficcionista e dramaturgo, o brasileiro Chico Buarque (n. 1944) reuniu em Tantas Palavras as letras escritas entre 1964 e 2017. Pretexto para recordar Cálice, hino de protesto contra a ditadura militar, proibido durante cinco anos: «Como é difícil acordar calado / Se na calada da noite eu me dano…» O songbook inclui portofolio fotográfico e uma reportagem biográfica feita pelo jornalista Humberto Werneck. O livro foi lançado em 1989, com o título Chico Buarque: Letra e Música, mas foi revisto e actualizado para esta nova edição. Quatro estrelas. Editou a Companhia das Letras.

Chegou finalmente a Portugal o polémico Regresso a Reims, autobiografia do sociólogo francês Didier Eribon (n. 1953), biógrafo de Foucault. A partir das suas origens proletárias, Eribon analisa as relações no seio da família, a vergonha social, a construção de identidades e, tema central, a traição de classe: «uma parte de mim que eu tinha recusado». Mas também algumas razões que levaram os operários franceses a trocar o Partido Comunista por Le Pen. A morte do pai serve de pretexto à catarse. Homossexual assumido, teórico da cultura gay, o autor regressa aos lugares da infância e adolescência para desatar o nó górdio dos equívocos. Não é amável. Cinco estrelas. Editou a Dom Quixote.

Os leitores de Sophia de Mello Breyner Andresen (1919-2004) que não tenham lido O Nu na Antiguidade Clássica, ensaio que fixa a visão da autora sobre a Grécia, têm agora oportunidade de o fazer, com uma vantagem suplementar: o volume inclui uma antologia de poemas sobre a Grécia e Roma, organizada por Maria Andresen de Sousa Tavares. Seria pleonástico sublinhar a excelência do texto e dos poemas. Diversa iconografia ilustra a obra. Cinco estrelas. Editou a Assírio & Alvim.

As idiossincrasias da vida literária e os empecilhos da meia-idade são os temas de Less, o romance mais recente de Andrew Sean Greer (n. 1970). Nenhum deles é novo em literatura, mas o registo humorístico soa a novidade. Brincando com a sua própria carreira por interposto Arthur Less, o anti-herói (um escritor gay, obscuro, à beira de completar 50 anos), Greer questiona os mecanismos de legitimação dos seus pares. Podia ter sido um tiro no pé, mas saiu-lhe o Pulitzer. Três estrelas. Editou a Quetzal.

A maioria dos leitores continua a associar o nome de Ray Bradbury (1920-2012) a Fahrenheit 451, romance distópico a partir do qual Truffaut fez um filme mítico. Mas quem gosta de policiais à moda antiga deve ler A Morte é um Acto Solitário. Tem crimes por decifrar, um detective chamado Elmo Crumley e uma série de personagens bem esgalhadas. Tudo se passa nos anos 1940, em Venice, o subúrbio de Los Angeles onde o autor vivia nessa época. Quatro estrelas. Editou a Cavalo de Ferro.

No tom desbocado que fez a fortuna da obra e a lenda do autor, o último romance de Michel Houellebecq (n. 1956), Serotonina, elege a decadência europeia como razão de todos os males. O protagonista é um engenheiro agrónomo, francês, dependente de antidepressivos, cuja namorada, japonesa, frequenta «serões libertinos» registados em vídeos escabrosos. O conceito de elevador social é ilustrado por um imigrante português, Joaquim da Silva, outrora pedreiro, actual proprietário de uma tabacaria bem localizada, ou seja, um privilegiado face aos agricultores franceses. Houellebecq está longe do seu melhor, mas continua a honrar as tradições da literatura. Três estrelas. Editou a Alfaguara.

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terça-feira, 11 de junho de 2019

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A partir de hoje numa livraria perto de si. Ou no stand da Dom Quixote na Feira do Livro de Lisboa. As edições de 2000 e 2007 estão esgotadas. Não é amável, mas a realidade também não.

segunda-feira, 10 de junho de 2019

A GALILEU


Caroline Tyssen não desiste. Faz ela muito bem. A Galileu merece todo o nosso apoio. Em Novembro de 1975, quando viemos de Lourenço Marques (o Jorge e eu), fomos viver para Cascais. Vinte e dois anos marcantes. A Galileu tornou-se a nossa livraria. Não andarei longe da verdade se disser que por ali passava três em cada sete dias da semana, guiado pela Caroline ou por uma das suas filhas, senão mesmo pelo saudoso Duarte Nuno Oliveira, cavalheiro entre cavalheiros.

Ali me cruzei com Fernando Assis Pacheco, Eugénio Lisboa, Herberto Helder, a Ló e o Garizo do Carmo, David Mourão-Ferreira e tantos outros. Ali levei Rui Knopfli uma vez, para lhe provar que o mundo não acabava na Waterstones. Ainda hoje, sempre que passamos por Cascais, damos um salto ao n.º 24 da Avenida Valbom. Quem tiver tempo, faça o mesmo: encontra preciosidades e conselhos sábios. Também calha encontrar Marcelo, o Presidente da República. Em 2014, a festa do 42.º aniversário foi bonita e juntou amigos queridos.

Sobre a descoberta da Galileu, transcrevo do meu livro de memórias:

«Uma tarde em que fui com o Jorge comer gelados ao Santini [...] descobrimos a Livraria Galileu, fundada por Caroline Tyssen. O que nos chamou a atenção foram as mesas de livros usados colocadas no passeio, cheias de paperbacks ingleses. Os fundos de literatura portuguesa estavam na cave, sobretudo raridades em segunda mão. Rotatividade era um conceito ignorado. Livro que ficasse no andar de cima sem vender, descia, ao fim de meses, para a cave. Nunca era devolvido. Encontrei preciosidades a preços irrisórios. Nessa primeira visita chamou-me a atenção uma prateleira com autores de direita: Agustina Bessa-Luís, António Quadros, Joaquim Paço d’Arcos, Rodrigo Emílio, Pinharanda Gomes e outros. Uma temeridade no Outono de 1975. Facto é que mais depressa se vendiam os poemas de Agostinho Neto que os de Sophia. Dessa visita inaugural trouxe livros de Agustina, largamente ignorada em Moçambique. Ignorada no sentido de pouco lida. As Pessoas Felizes (1975) foi um deles. Romance fulgurante como muito poucos. [...]» — Um Rapaz a Arder, Quetzal, 2013.

A foto foi roubada à Caroline. Clique