O assassinato de Jamal Khashoggi (1958-2018), um de vários correspondentes estrangeiros do Washington Post, não foi a primeira nem será a última execução de um jornalista. Pondo de lado o horror do episódio (o jornalista terá sido desmembrado em vida, acabando por morrer ao fim de sete minutos, no momento da decapitação), o que surpreende é a pronta reacção da Turquia, país que não é um modelo de liberdades e garantias.
Ontem, após dezassete dias de pressão por parte de Ankara, Washington e Londres, a Arábia Saudita acabou por reconhecer a morte de Khashoggi no interior do consulado saudita em Istambul, onde o jornalista se tinha deslocado, no passado dia 2, para obter documentação necessária ao casamento com uma turca. Segundo as autoridades de Riade, a morte terá ocorrido em consequência de uma luta corpo a corpo. Mas, se é assim, o que os impede de devolver o corpo?
Riade também diz que os responsáveis directos são 18, e estão presos. Três altos funcionários dos serviços secretos sauditas, um deles muito próximo do príncipe herdeiro Mohammad bin Salman, teriam sido demitidos.
A Turquia avisou os Estados Unidos, com base em gravações de imagem e som: Khashoggi foi desmembrado até morrer. Ou seja: a Turquia assume que monitoriza o interior de instalações diplomáticas estrangeiras. Não é inédito, mas permanece um interdito.
Isto suscita outra questão: os alegados assassinos puderam regressar à Arábia Saudita (existem imagens do embarque) sem serem incomodados pelas autoridades turcas. Porquê?
O próprio empenho de Trump, que mandou um emissário falar com o rei saudita, não deixa de ser curioso. Afinal, a defesa da liberdade de expressão não faz parte dos traços distintivos do presidente americano.
O assassinato de Jamal Khashoggi suscita a repulsa do mundo civilizado, com certeza que sim. O que continua por explicar é o tom da reacção de Ankara e Washgington, porque nenhuma destas ondas de choque bate certo.