quinta-feira, 15 de julho de 2021

GUERRA CIVIL NO HORIZONTE?


Com dez mil soldados na rua, a África do Sul começou a convocar reservistas, o que não acontecia desde os anos 1990. Após sete dias de tumultos e desordem generalizada, o número de mortos subiu para 117, tendo sido efectuadas mais de três mil prisões. Nosiviwe Mapisa-Nqakula, a ministra da Defesa, quer em acção 25 mil efectivos do Exército.

Tudo começou no passado dia 9, nas províncias de KwaZulu-Natal e Gauteng, quando o antigo Presidente Jacob Zuma se entregou à polícia para cumprir a pena de prisão de quinze meses a que foi condenado por ter recusado comparecer perante a Comissão Zondo, um colectivo nomeado para investigar alegados actos de corrupção durante os nove anos (2009-18) em que foi Presidente. 

Neste momento a violência atinge várias regiões do país, com as principais autoestradas cortadas, dezenas de centros comerciais saqueados e incendiados, milhares de lojas vandalizadas, distribuição de alimentos à beira da ruptura desde que a Tiger Brands suspendeu a actividade, postos de combustíveis abandonados e outras infraestruturas críticas nas mãos dos insurrectos. A refinaria de petróleo Sapref, a maior da África Subsariana, também suspendeu a operação.

A prisão de Zuma terá sido o detonador da profunda crise económica que afecta a África do Sul, país que se debate com uma taxa de desemprego de 32% (superior a 50% nos menores de 30 anos), corte dos subsídios estatais que vigoraram até 2019 e, agora, os efeitos da pandemia: 2,3 milhões de infectados, mais de 65 mil mortos.

Com cerca de 60 milhões de habitantes (sendo brancos 8%), a África do Sul é a segunda maior economia de África e a 32.ª a nível mundial. A oposição responsabiliza Cyril Ramaphosa, o actual Presidente, de ter negligenciado os repetidos avisos dos serviços secretos.

Sabemos como começou, não sabemos como vai acabar. Guerra civil no horizonte?

Na imagem, uma rua de Joanesburgo no passado dia 11. Clique.

CHRISTIAN BOLTANSKI 1944-2021


Christian Boltanski morreu ontem em Paris, no Hospital Cochin. A causa não foi determinada, há quem fale de cancro, mas Annette Messager, sua mulher, não confirma.

Autodidacta, tornou-se um dos mais importantes artistas visuais franceses, célebre do Japão à Patagónia, conhecido pelas instalações provocatórias — como a pirâmide de roupas usadas que em 2010 ocupou o Grand Palais —, os vídeos escatológicos, a fotografia e os filmes autobiográficos. No ano passado, quando a pandemia encerrou os museus franceses, o Centro Pompidou exibia desde o Outono de 2019 uma grande retrospectiva da sua obra.

Menschlich (1994), um dos seus livros mais conhecidos, reúne mil e trezentos retratos dos anos 1970-80, tendo como denominador comum o horror do Holocausto. Boltanski tem origem judaica, tendo seus pais (uma escritora e um médico) sofrido a violência da França ocupada.

Começou pela pintura (1957-68), mas seria nas artes visuais que se notabilizaria, estando representado em museus de Paris, Grenoble, Madrid, Nova Iorque, Quebec, ilha japonesa de Teshima, etc. Em 2010, em troca de uma choruda renda vitalícia, “vendeu” a sua vida a um milionário australiano, ficando este com o direito de filmar Boltanski 24 horas por dia.

Clique na imagem.

quarta-feira, 14 de julho de 2021

MAIS ALVALADE


Hoje ao fim da tarde, como previsto, lá nos juntámos todos no Parlatório do Jardim Mário Soares, ali no Campo Grande, para apoiar a recandidatura de José António Borges ao cargo de Presidente da Junta de Freguesia de Alvalade. A data não podia ter sido melhor escolhida.

Muito boa intervenção do incumbente, após Luís Nazaré e Fernando Medina terem feito o balanço do mandato que termina em Setembro.

Quadro do Banco de Portugal desde 2013, membro da Comissão Política Nacional do PS, antigo adjunto ministerial, licenciado em Direito pela Universidade Nova de Lisboa e a terminar um mestrado de Economia e Políticas Públicas no ISCTE, José António Borges tem feito um trabalho notável na Freguesia a que preside.

Como amigo e membro da sua Comissão de Honra, faço questão de assinalar a minha satisfação em vê-lo prosseguir esse trabalho.

Na imagem, José António Borges no uso da palavra, vendo-se, sentados à direita, Luís Nazaré e Fernando Medina. Clique.

terça-feira, 13 de julho de 2021

CULTURA VS PATRIMÓNIO

A minha recente visita a Tomar deu azo a que publicasse no Facebook fotografias do património histórico da cidade. Uma delas, da Janela do Capítulo (Convento de Cristo), gerou uma onda de indignação. A «incúria» da Direcção-Geral do Património Cultural foi apontada, por quase toda a gente, como causa do «estado miserável, vergonhoso, etc.» da referida janela.

Onde é que eu quero chegar? Quem me conhece, ou simplesmente lê o que escrevo à margem da literatura — entre 2005 e 2011 este blogue foi dos mais lidos —, sabe que discordo da existência de ministérios da Cultura, coisa muito apreciada em França, na antiga URSS, em Cuba, na China e afins. Digo-o com o à vontade de quem é ou foi (alguns morreram) amigo de vários titulares do cargo. Um deles, na primeira entrevista que deu após a posse, até me citou a esse respeito. Adiante.

Manda a verdade dizer que o interior do Convento de Cristo se encontra em muito bom estado de conservação. Mas não é isso que me interessa.

Como em tudo na vida, não podemos comer o bolo e ficar com ele. Ou há dinheiro para apoiar o teatro, o cinema, a música, as bolsas de criação literária, as artes performativas, as mil e uma Fundações culturais que existem de Norte a Sul do país, os arraiais temáticos, etc., ou para restaurar e conservar o Património. Para as duas coisas nunca houve: uns remendos aqui, outros ali, queixas de todos os lados.

Enquanto não houver um ministério do Património, com orçamento adequado, o pouco dinheiro do ministério da Cultura terá como prioridade subvencionar, em registo de esmola (ou seja, em termos análogos aos do rendimento social de inserção), um reduzido núcleo de actores, encenadores, músicos, bailarinos, cineastas, performers, etc., negligenciando museus — o MNAA e o MNAC já têm catálogo? —, monumentos, igrejas, bibliotecas públicas, palácios de reconhecido interesse histórico, castelos, pelourinhos, aquedutos (o de Pegões nem sinalizado está), pontes romanas, edifícios classificados, etc. Para tudo não há.

A opção é justa: entre pessoas e pedras, primeiro estão as pessoas. Mas temos de saber, com clareza, aquilo que queremos.

domingo, 11 de julho de 2021

NATÉRCIA FREIRE


UM POEMA POR SEMANA — Para hoje escolhi Braços Longos de Natércia Freire (1919-2004), poetisa que durante vinte anos coordenou a página de Artes & Letras do Diário de Notícias, lugar de que foi afastada no imediato pós-25 de Abril. Foram mais de mil páginas, onde colaboraram todos os nomes que, entre 1954 e 1974, contavam na Literatura portuguesa.

Natural de Benavente, Natércia Freire estudou música (canto e composição), fez o curso do Magistério Primário e leccionou antes de dedicar-se por inteiro à vida literária. Além de poesia escreveu contos, tendo-se estreado com Castelos de Sonho (1935). Recebeu duas vezes o Prémio Antero de Quental (1947 e 1952), o Prémio Ricardo Malheiros da Academia das Ciências de Lisboa (1955) e, em 1971, o Prémio Nacional de Poesia. Era irmã da escritora Maria da Graça Freire.

Entre 1971 e 1974 fez parte da Comissão de Leitura da Fundação Calouste Gulbenkian.

Pedro Sena-Lino, seu neto, organizou — juntamente com Alexandre Nave e José Félix Duque — O Livro de Natércia, publicado em 2005. Volume de evocação da autora, com prefácio de Jorge Sampaio, conta com a colaboração de 51 poetas (um deles eu próprio) e 21 artistas plásticos.

No centenário do seu nascimento (2019) foi nobilitada a título póstumo com o grau de Grande-Oficial da Ordem do Infante D. Henrique.

O poema desta semana integra Anel de Sete Pedras (1952). A imagem foi obtida a partir do 1.º volume da Terceira Série de Líricas Portuguesas, a mítica antologia organizada por Jorge de Sena, publicada pela Portugália [este primeiro volume] em 1972.

[Antes deste, foram publicados poemas de Rui Knopfli, Luiza Neto Jorge, Mário Cesariny, Natália Correia, Jorge de Sena, Glória de Sant’Anna, Mário de Sá-Carneiro, Sophia de Mello Breyner Andresen, Herberto Helder, Florbela Espanca, António Gedeão, Fiama Hasse Pais Brandão, Reinaldo Ferreira, Judith Teixeira, Armando Silva Carvalho, Irene Lisboa, António Botto, Ana Hatherly, Alberto de Lacerda, Merícia de Lemos, Vasco Graça Moura, Fernanda de Castro e José Gomes Ferreira.]

Clique na imagem.