sábado, 2 de novembro de 2019

SENA, CEM ANOS


Faz hoje cem anos que nasceu Jorge de Sena (1919-1978), o mais importante intelectual português do século XX. Poeta, romancista, contista, dramaturgo, ensaísta, camonista, historiador da literatura, memorialista, crítico, antologiador, tradutor e professor, Sena é uma figura ímpar da língua portuguesa. 

De um texto que escrevi e publiquei em 1999, mais tarde coligido no meu livro Comenda de Fogo (2002), respigo alguns acidentes biográficos. Não é uma transcrição do texto original. As obras citadas correspondem a uma ínfima parte da bibliografia do autor.

Natural de Lisboa, Sena fez estudos de piano e foi aluno de Rómulo de Carvalho (o poeta António Gedeão) no Liceu Camões. Aos 17 anos ingressou na Escola Naval, tendo feito uma viagem no navio-escola Sagres, entre Outubro de 1937 e Fevereiro de 1938. Em 14 de Março de 1938 foi excluído da Marinha de Guerra.

Sob o pseudónimo de Teles de Abreu publicou os primeiros textos em Março de 1939. O primeiro livro  —  Perseguição  —  saiu em Junho de 1942. Concluiu o curso de engenharia civil em Novembro de 1944. Viu-se obrigado a fazer o serviço militar entre 1945 e 1946. Durante doze anos (1947-59) desenvolveu actividade profissional no ministério das Obras Públicas. Em Março de 1949 casou-se com Maria Mécia de Freitas Lopes, irmã de Óscar Lopes. Co-dirigiu as 2.ª e 3.ª séries dos Cadernos de Poesia (1951-53). Fez um estágio de engenharia em Inglaterra, no ano (1952) em que começou a traduzir os poemas ingleses de Fernando Pessoa. Em 1953, divulgou a poesia de Kavafis.

A PIDE apreendeu As Evidências (1955), rotulando o livro de subversivo e pornográfico. Publicou a tradução de Porgy & Bess. A 11 de Março de 1959 envolveu-se no frustrado Golpe da Sé e, no mês seguinte, publicou o primeiro volume de ensaios, Da Poesia Portuguesa. Face à situação política do país, parte a 7 de Agosto para o Brasil, desembarcando no Recife. Mécia e os sete filhos nascidos em Portugal juntam-se-lhe a 17 de Outubro.

O exílio brasileiro, que duraria seis anos, foi o corolário de uma intricada teia de insatisfações. Discurso directo: «Em Portugal, se eu me tivesse lançado na engenharia particularmente, à margem da minha actividade oficial de funcionário, poderia ter ganho muito dinheiro talvez. E houve muitas pessoas que estranhavam que o não fizesse. Mas se eu tivesse feito isso, quando teria sido o escritor que, em 1959, tinha títulos suficientes para mudar de vida

O início da docência universitária  —  na Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Assis, em São Paulo  —  mudou tudo, porque «uma situação financeiramente desafogada [...] bolsas de pesquisa, etc., me garantiram a possibilidade de dedicar-me integralmente à produção literária.» No Brasil, à margem da docência, foi director literário da Editora Agir, do Rio de Janeiro, fez conferências, participou de congressos, e colaborou largamente na imprensa. Em 1960 publica Andanças do Demónio, primeira colectânea de contos. Demitiu-se da direcção da Unidade Democrática Portuguesa no mesmo ano em que publicou O Reino da Estupidez. Em Março de 1963 torna-se cidadão brasileiro. No ano em que começa a escrever Sinais de Fogo, prestou provas de doutoramento (1964) com uma tese sobre Os Sonetos de Camões e o Soneto Quinhentista Peninsular.

Entretanto, na sequência do golpe militar brasileiro de 31 de Março de 1964, Sena foi demitido por telefone da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de São José do Rio Preto, onde desde 1962 era professor visitante. O ambiente torna-se irrespirável e Sena troca o Brasil pelos Estados Unidos. Tem agora mais dois filhos, nascidos em terra brasileira. 

A 7 de Outubro de 1965, após seis anos de Brasil, Sena e a família desembarcam em Nova Iorque, em trânsito para a Universidade do Wisconsin (Madison). Os treze anos seguintes, os anos americanos, foram uma sucessão de realizações académicas (em 1967 foi nomeado professor catedrático efectivo de Literatura Portuguesa e Brasileira), colóquios e congressos internacionais, viagens planetárias, conferências em vários países, trabalho insano, uma obra notável que não parou de crescer: «Podereis roubar-me tudo: / as ideias, as palavras, as imagens, / e também as metáforas, os temas, os motivos [...] E podereis depois não me citar, / suprimir-me, ignorar-me, aclamar até / outros ladrões mais felizes [...] Nada tereis, mas nada: nem os ossos, / que um vosso esqueleto há-de ser buscado, / para passar por meu. E para outros ladrões, / iguais a vós, de joelhos, porem flores no túmulo

De Portugal chega uma tardia consagração: a revista O Tempo e o Modo dedica-lhe, em Abril de 1968, o n.º 59, inteiramente dedicado (são 134 páginas) à sua pessoa: nota de abertura, breve autobiografia, entrevista sulfurosa, antologia seniana, artigos de fundo e depoimentos de 24 escritores. Foi uma espécie de reconciliação nacional, embora persistissem muitos anticorpos. E quando, a 22 de Dezembro, tenta entrar em Portugal, é detido pela PIDE na fronteira de Valencia de Alcantara. Blanc de Portugal intercede junto de Marcello Caetano e ao fim de 24 horas concedem-lhe visto de entrada. Ficará em Lisboa durante dois meses. 

Em 1969 sai Peregrinatio ad Loca Infecta e, no ano seguinte, muda-se do Wisconsin para a Califórnia. Em Julho de 1972 visita Moçambique, proferindo três conferências em Lourenço Marques. Durante uma visita à ilha de Moçambique, na companhia de Rui Knopfli, escreve: «[...] Tudo passou aqui  —  Almeidas e Gonzagas, / Bocages e Albuquerques, desde o Gama. / Naqueles tempos se fazia o espanto / desta pequena aldeia citadina / de brancos, negros, indianos e cristãos, / e muçulmanos, brâmanes e ateus. / Europa e África, o Brasil e as Índias, / cruzou-se tudo aqui neste calor tão branco / como do forte a cal no pátio, e tão cruzado / como a elegância das nervuras simples / da capela pequena do Baluarte. / Jazem hoje aqui em lápides perdidas / os nomes todos dessa gente que, / como hoje os negros, se chegava às rochas, / baixava as calças e largava ao mar / a malcheirosa escória de estar vivo [...] como se te limparas de miséria, / e de desgraça e de injustiça e dor / de ver que eram tão poucos os melhores, / enquanto a caca ia-se na brisa esbelta, / igual ao que se esquece e se lançou de nós.» 

Publicará ainda duas excepcionais colectâneas de poesia, Conheço o Sal... e Outros Poemas (1974) e Sobre Esta Praia... Oito Meditações à Beira do Pacífico (1977), considerado o seu testamento poético: «Deitados no saber de ao sol queimarem / o mais oculto de si mesmos são / dois jovens e uma jovem misturados. / Um dos rapazes se recosta contra o corpo / do outro rapaz que alonga dorso e pernas [...] São, como deuses, animais sem cio? / Ou são, como animais, humanos que se aceitam? / Ela é de quem? De um deles só, dos dois? / Um deles será dela mas também do outro? / Será cada um dos três dos outros dois? / Ambos os machos serão fêmeas do outro? / Ou só um deles? Qual dos dois? O que / sentado se recosta? O que deitado / aceita contra o seu o corpo recostado? / Os três são muito belos... [...]» 

Apesar da doença que o mina, agravada por problemas cardíacos, vê publicados os contos reunidos em Os Grão Capitães (1976) e a novela O Físico Prodigioso (1977), agora editada isoladamente. Em Abril de 1977 recebe o prémio internacional de poesia Etna-Taormina, na Sicília. Na ocasião, dirá: «A minha poesia nada tem de patriótica ou de nacionalista, e eu sempre me quis e me fiz um cidadão do mundo, no tempo e no espaço

Vem depois a Portugal, para conferências na Gulbenkian e no 10 de Junho. O discurso da Guarda, no Dia de Portugal, a convite de Eanes, comentado por dois coevos ilustres  —  Saramago e Vergílio Ferreira  —, dá a medida do feedback nacional. Para Saramago, foi uma «imprecação lançada contra os ouvidos rolhados dos espectadores de perto e de longe». Para Vergílio, todo o azedume foi pouco: «E o Jorge de Sena fez a sua cena. Berrou, gesticulou, invectivou. Foi aclamado em delírio. A mesa da presidência veio toda em peso palmear-lhe as costas. Fiquei logo subalternizado.» Sobrou-lhe um sacudido ano de vida. Mágoa maior, o descaso da Universidade portuguesa, que lhe fechou as portas.

O último poema  —  Aviso a cardíacos e outras pessoas atacadas de semelhantes males  —  foi escrito a 19 de Março de 1978. Antes de morrer, ainda vê publicadas as suas Dialécticas Aplicadas da Literatura bem como as Antigas e Novas Andanças do Demónio, obras centrais do ensaio e da ficção senianas.

Em Junho de 1978, quando morreu em Santa Bárbara, na Califórnia, tinha 58 anos. Em Setembro de 2009 os restos mortais foram trasladados para Lisboa.

Mas Sinais de Fogo, obra maior da ficção romanesca em língua portuguesa, provavelmente o romance mais importante do século XX português, só foi publicado postumamente, como também as colectâneas poéticas 40 Anos de Servidão (1979), Sequências (1980), que tem tido uma recepção crítica eviesada, fruto talvez da desembaraçada ultrapassagem de vários interditos, Visão Perpétua (1982), os dois volumes da juvenília reunida por Mécia de Sena em Post-Scriptum II (1985) e os magníficos 80 Poemas de Emily Dickinson (1979). Por escassas semanas, também Poesia do Século XX, que fecha o homérico trabalho de tradução iniciado com Poesia de 26 Séculos (1972), se lhe tornou obra póstuma.

Clique na imagem, o retrato de Sena por Fernando Lemos.

sexta-feira, 1 de novembro de 2019

NHS VS SNS


Os detractores do Serviço Nacional de Saúde ou, mais latamente, todos os que (nunca tendo ido além de Badajoz) repetem o mantra... só no nosso país, devem ler a crónica de Clara Ferreira Alves publicada na edição de hoje da revista do Expresso48 horas no sistema de saúde inglês.

Resumo: a jornalista partiu um pé ao descer as escadas do metro, em Londres, tendo sido observada num hospital universitário, situado perto de Kings Cross, ao fim de quase seis horas de espera. A indispensável cirurgia, suposta ser imediata, foi remetida para as calendas.

«Como é residente em Portugal, recomendamos que viaje para o seu país para se operar...» — foi o veredicto do NHS.

CFA voltou a Portugal, onde foi tratada.

Clique na imagem do Expresso.

quinta-feira, 31 de outubro de 2019

TRAGÉDIA GRENFELL


O incêndio da Torre Grenfell, no bairro de North Kensington, em Londres, deu-se a 14 de Junho 2017. Fez 72 vítimas identificadas, embora tudo indique que tenham sido mais de cem, ou seja, o número de pessoas nunca encontradas, mas alegadamente residentes no local, em regime de subaluguer, por serem imigrantes ilegais. Os 24 andares da Torre Grenfell eram ocupados por apartamentos arrendados a imigrantes.

Ontem, passados mais de 28 meses sobre a tragédia, foi divulgado o relatório oficial da polícia, entregue na véspera aos familiares das vítimas identificadas.

Esse relatório responsabiliza directamente a London Fire Brigade pela dimensão do desastre, notando que vários bombeiros recusaram participar do inquérito.

North Kensington está para Londres como a Buraca para Lisboa ou o Aleixo para o Porto, e todos sabemos que há uma hierarquia de tragédias.

Familiares de algumas vítimas tencionam processar a LFB enquanto instituição e alguns dos seus membros enquanto profissionais que não cumpriram (ou cumpriram de forma errada) as suas funções. A acusação mais frequente diz respeito ao facto de, em simultâneo, terem ocorrido dois tipos de actuação: enquanto alguns moradores receberam ordem de evacuação imediata, a outros foi dito que deviam permanecer dentro de casa. O resultado ficou à vista de todos.

Convém sublinhar que o inquérito levou 28 meses a concluir.

Clique na imagem da BBC.

quarta-feira, 30 de outubro de 2019

C. G. JUNG


Hoje na Sábado escrevo sobre a autobiografia de C. G. Jung (1875-1961), Memórias, Sonhos, Reflexões, organizada por Aniela Jaffé. Uma autobiografia a quatro mãos não corresponde às convenções do género, mas foi o que fizeram Jung e Aniela Jaffé. Antes de morrer, Jung  o fundador da psicologia analítica, acedeu a escrever e falar sobre si. Aniela organizou a obra. O Prólogo, os três primeiros capítulos — Infância, Os anos de escola, Os anos da universidade —, bem como os textos sobre Théodore Flournoy, Richard Wilhelm e Heinrich Zimmer, foram escritos por Jung; o restante foi redigido por Aniela a partir de conversas entre ambos. Depois de entrar em rota de colisão com Freud, que o admirava, Jung fixou o conceito de individuação. Interessado por terapia da dança, arte, religião, ciências paranormais e outros temas, viajante incansável (o Magreb, a Índia, o Quénia. o Uganda, etc.), Jung foi uma personalidade ímpar que esta semi-autobiografia ajuda a descobrir. Além da introdução de Aniela, o volume inclui árvore genealógica, glossário científico, cartas e trechos de obras de Jung. Quatro estrelas. Publicou a  Relógio d’Água.

terça-feira, 29 de outubro de 2019

VERGONHA

Os eurodeputados portugueses Álvaro Amaro, do PSD, e Nuno Melo, do CDS, votaram contra o salvamento de migrantes.

Foi por dois votos (290 contra 288) que o Parlamento Europeu rejeitou hoje a resolução não vinculativa que pretendia vincular a UE às operações de busca e salvamento no Mediterrâneo.

Entre os 36 abstencionistas encontra-se outro deputado português: José Manuel Fernandes, do PSD.

REINO VAI A VOTOS


Como previsto, e por ampla maioria — 438 votos a favor e 20 contra —, Westminster votou favoravelmente a marcação de eleições gerais para o próximo 12 de Dezembro.

Foi rejeitada a data de 9 de Dezembro, preferida do Lib Dem e dos deputados escoceses.

Não foram aprovadas as propostas que permitiam a votação de jovens de 16 e 17 anos.

Também não foram aprovadas as propostas que permitiam a votação de cidadãos da UE residentes no Reino Unido.

Boris ganhou em toda a linha.

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BORIS CONSEGUE ELEIÇÕES


As coisas começam a compor-se. Westminster deve aprovar hoje ao fim da tarde a marcação de eleições gerais em Dezembro.

A dúvida agora está em saber se a data escolhida será o dia 9 (uma segunda-feira), como pretende o Lib Dem, ou o dia 12 (uma quinta-feira), como prefere o Governo.

O Labour acabou convencido porque, diz Corbyn, as eleições vão obrigar a que haja Brexit «com acordo». O líder trabalhista diz que o partido travará «a maior batalha de todos os tempos», com vista a mudar radicalmente o Reino Unido. A ver vamos.

Para já, o Financial Times publicou um gráfico com a média das sondagens dos últimos dez meses, onde se vê que o Partido Conservador mantém uma vantagem de 11 pontos sobre o Labour.

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domingo, 27 de outubro de 2019

PROGRAMA EM DISCUSSÃO


O programa do Governo foi ontem aprovado em Conselho de Ministros, enviado à Assembleia da República e publicado online. Será discutido na AR nos próximos dias 30 e 31.

Destaco estas duas passagens, ambas relativas à progressividade fiscal.

«[...] Neste campo, o Governo irá:

• Dar continuidade ao desenvolvimento de mecanismos que acentuem a progressividade do IRS, revendo os respetivos escalões.

• Caminhar no sentido do englobamento dos diversos tipos de rendimentos em sede de IRS, eliminando as diferenças entre taxas [...]»

A ver vamos. O primeiro ponto (revisão dos escalões) é fundamental.

sábado, 26 de outubro de 2019

E VÃO DUAS


No Palácio da Ajuda, perante o Presidente da República, tomou esta manhã posse o XXII Governo Constitucional, chefiado por António Costa.

Após a cerimónia, que incluiu discursos do PR e do primeiro-ministro, os 70 membros do Governo seguiram para Presidência do Conselho de Ministros em dois autocarros da Carris movidos a gás natural.

A primeira reunião do executivo serviu para discutir e aprovar o programa do Governo, que será enviado ao Parlamento. Em princípio, o debate parlamentar ocorrerá na próxima semana.

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sexta-feira, 25 de outubro de 2019

FERRO REELEITO


Por 178 votos a favor, 44 brancos e 8 nulos, Eduardo Ferro Rodrigues foi esta tarde reeleito Presidente da Assembleia da República.

Uma vez que a soma do PS (108) +BE (19) +PCP (10) +PAN (4) +PEV (2) +LIVRE (1) dá 144 deputados, os restantes 34 votos tiveram que vir de partidos da Direita.

Em 2015 tinha sido eleito por 120 votos.

Os vice-presidentes da AR serão Edite Estrela, do PS, Fernando Negrão, do PSD, José Manuel Pureza, do BE, e António Filipe, do PCP.

Por seu turno, Ana Catarina Mendes foi eleita nova líder da bancada parlamentar do PS.

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quarta-feira, 23 de outubro de 2019

RESULTADOS OFICIAIS


O Tribunal Constitucional indeferiu o recurso do PSD sobre a forma de classificação dos votos nulos da emigração. A birra não serviu para nada. O recurso interposto pelo ALIANÇA foi rejeitado. A Comissão Nacional de Eleições publicou hoje em Diário da República o mapa oficial com os resultados finais globais das eleições.

Com representação parlamentar:

PS = 36,35% e 108 deputados

PSD = 27,77% e 79 deputados
BE = 9,52% e 19 deputados
CDU = 6,34% e 12 deputados 
CDS = 4,22% e 5 deputados
PAN = 3,32% e 4 deputados

CHEGA = 1,35% e 1 deputado
IL = 1,29% e 1 deputado
LIVRE = 1,09% e 1 deputado

terça-feira, 22 de outubro de 2019

DEPUTADOS VS GOVERNO


Grande alarido nos media porque 26 dos 108 deputados eleitos pelo PS no passado dia 6 vão ocupar cargos ministeriais. Ainda bem que assim é. Mas deviam ser 70, ou seja, o primeiro-ministro, os 19 ministros e os 50 secretários de Estado.

Dito de outro modo: o Governo, qualquer que seja, deve ser constituído por cidadãos eleitos. Não está em causa a qualidade das pessoas que, não tendo concorrido às eleições, vão agora integrar o executivo. Algumas, estou em crer, farão bons lugares. Como fez Centeno, que não concorreu às eleições de 2015 (e devia, porque foi ele o coordenador do programa económico do PS), embora o tenha feito agora.

Em Portugal sempre se cultivou o mito dos ‘especialistas’. Sucede que os membros do Governo são decisores políticos, não são técnicos. Como tal, devem passar pelo crivo do escrutínio popular.

No Reino Unido, por exemplo, os membros do Governo (eleitos previamente deputados) até participam nas votações em Westminster.

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segunda-feira, 21 de outubro de 2019

GOVERNO COMPLETO


António Costa apresentou ao Presidente da República a lista dos novos 50 secretários de Estado. São 18 mulheres e 32 homens.

Nuno Artur Silva é o novo secretário de Estado do Cinema, Audiovisual e Media (ministério da Cultura). Não esquecer que foi o Nuno quem, entre 2015 e 2018, na qualidade de administrador da direcção de programas, ‘formatou’ a RTP pós-troika.

No ministério do Ambiente e da Transição Energética, João Galamba sobe de secretário de Estado da Energia para secretário de Estado Adjunto e da Energia. 

Não houve mexidas nos ministérios das Finanças (Centeno) e das Infraestruturas e Habitação (Pedro Nuno Santos), mas nos restantes a renovação é profunda.

Clique no retrato de Nuno Artur Silva.

sábado, 19 de outubro de 2019

PRÉMIO PRINCESA DAS ASTÚRIAS


A escritora norte-americana Siri Hustvedt, 64 anos, recebeu ontem o prémio Prémio Princesa das Astúrias de Letras. Siri Hustvedt, mulher de Paul Auster, tem origem norueguesa, mas tanto ela como os pais já nasceram nos Estados Unidos.

Siri Hustvedt é romancista, contista e ensaísta, mas também publicou um livro de poemas. Em Portugal estão traduzidos seis dos seus livros de ficção.

Refiro o facto porque o Prémio Princesa das Astúrias de Letras tem mantido, desde a sua criação, em 1981, um assinalável nível de coerência.

Entre outros, foram laureados José Hierro, Gonzalo Torrente Ballester, Juan Rulfo, Mario Vargas Llosa, Camilo José Cela, Günter Grass, Doris Lessing, Arthur Miller, Susan Sontag, Claudio Magris, Nélida Piñón, Paul Auster, Amos Oz, Margaret Atwood, Ismail Kadaré, Amin Maalouf, Leonard Cohen, Philip Roth, John Banville, Leonardo Padura, Richard Ford e Adam Zagajewski.

Entre 1981 e 2013, o prémio designou-se Príncipe das Astúrias. A partir de 2014, com a subida ao trono de Filipe VI, a titularidade passou para a herdeira da Coroa, a princesa Leonor, princesa das Astúrias.

Além das Letras, o prémio distingue as Humanidades, as Ciências Sociais, as Artes, a Investigação Científica, a Cooperação Internacional, a Paz e os Desportos.

Ontem, o prémio das Artes foi atribuído a Peter Brook, 94 anos, considerado por muitos o maior encenador vivo. Brook foi durante muitos anos a imagem de marca da Royal Shakespeare Company,

A cerimónia decorreu como sempre em Oviedo, capital das Astúrias, com a presença da família real (incluindo a rainha-mãe), do duque de Alba, e de vários líderes políticos.

Clique nas imagens de El País. Siri Hustvedt, a chegar; e Peter Brook a receber o diploma das mãos de Leonor, princesa das Astúrias.

sexta-feira, 18 de outubro de 2019

GANZA


O PSD pediu a recontagem dos votos da emigração. Para quê? Por desconfiar que não são dois mais dois? Por achar que são três mais um? Por achar que tem direito aos quatro? Nada disso.

Rui Rio aceita o resultado que deu 2 ao PS e outros 2 ao PSD.

O que o PSD quer saber é se os nulos contam como nulos ou, como o partido defende, como votos da abstenção, caso em que a percentagem do PSD subiria para 27,8%.

Isto não é um sketch dos Monty Python.

Clique na imagem do Expresso.

quinta-feira, 17 de outubro de 2019

NOVO GOVERNO

Ainda não tomou posse, mas o elenco de ministros e secretários de Estado com assento em Conselho de Ministros suscita-me alguns comentários.

— Quatro ministros de Estado não será excessivo?
— Augusto Santos Silva demonstra fair play por aceitar passar de número 2 para número 3.
— Pedro Siza Vieira é o representante dos Illuminati?
— A continuação de Mário Centeno, Mariana Vieira da Silva, Tiago Brandão Rodrigues, Nelson de Souza, João Gomes Cravinho, Graça Fonseca e Pedro Nuno Santos (este último com competências acrescidas), é uma excelente notícia.
— A continuação de Eduardo Cabrita desaponta-me.
— A continuação de Manuel Heitor surpreende-me. No mundo académico e científico diz-se dele o que Mafoma não disse do toucinho.
— A continuação de João Pedro Matos Fernandes (com competências acrescidas) deixou perplexo o milieu ambiental. Desconheço de que lado está a razão.
— A continuação de Francisca Van Dunen deitou por terra as especulações mais rasteiras.
— Sobre Marta Temido não sei o que pensar.
— A criação do ministério da Modernização do Estado e da Administração Pública impunha-se. Oxalá Alexandra Leitão possa fazer o que se espera que faça.
— A entrada de Ana Mendes Godinho para o lugar que foi de Vieira da Silva levanta todas as interrogações.
— Duarte Cordeiro não deveria ter subido a ministro?
— André Moz Caldas, antigo presidente da Junta de Freguesia de Alvalade (onde fez um excelente trabalho), vai com certeza ser um bom secretário de Estado da Presidência do Conselho de Ministros.
— Ana Abrunhosa, Maria do Céu Albuquerque, Ricardo Serrão Santos, Tiago Antunes: quatro nomes sobre os quais não tenho opinião.

NÚMEROS OFICIAIS

Encerrada ontem à noite a contagem da votação dos emigrantes, o PS ganhou mais dois deputados e o PSD outros dois. Cada um dos partidos elegeu um deputado pelo círculo da Europa e um deputado pelo círculo Fora da Europa.

Nos últimos vinte anos, é a 1.ª vez que o PS elege um deputado pelo círculo Fora da Europa.

Os 230 deputados ficam assim distribuídos: 

PS com 108
PSD com 79
BE com 19
PCP com 10
CDS com 5
PAN com 4
PEV com 2
CHEGA com 1
IL com 1
LIVRE com 1

Dos pequenos partidos, o mais votado foi o PAN. 

Por esta ordem, BE, CDS e CDU tiveram menos votos que o PAN.

A abstenção final global foi de 48,5%. Votos nulos foram 22,3%.

O atraso ficou a dever-se à contagem dos votos de Macau.

BREXIT FECHADO?


Tudo preparado para 31 de Outubro. A UE percebeu que, com Boris, se não fosse a bem, ia a mal. O tuíte de Jean-Claude Juncker é claro.

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terça-feira, 15 de outubro de 2019

HAROLD BLOOM 1930-2019


Harold Bloom, o crítico literário mais influente dos últimos cem anos, morreu ontem à noite no hospital de New Haven (Connecticut) onde se encontrava internado.

Professor de Yale, Bloom deixou uma obra extensa, com vários livros publicados em Portugal, entre eles A Angústia da Influência, 1973, com tradução de Miguel Tamen, e O Cânone Ocidental, 1994, close reading da obra dos 26 escritores mais importantes da literatura ocidental, de Dante a Thomas Pynchon, com tradução de Manuel Frias Martins. Há outros.

Em língua portuguesa, publicadas no Brasil, estão traduzidas três obras incontornáveis: Poesia e Repressão, 1976, com tradução de Cillu Maia, Shakespeare: A Invenção do Humano, 1998, e Génio, 2002, ambas com tradução de José Roberto O’Shea. Sobre peças de Shakespeare escreveu vários outros livros. No famoso The Book of J., 1990, sustenta que longos trechos da Bíblia foram escritos por uma mulher.

Politicamente incorrecto, combateu a crítica marxista, o afrocentrismo e o feminismo, ou seja, aquilo que designava por escola do ressentimento. Admirava profundamente Emily Dickinson, Jane Austen, George Eliot, Virginia Woolf, Toni Morrison, Maya Angelou e Amy Tan. Detestava a saga Harry Potter e, de um modo geral, a cultura popular. Mas gostava de Álvaro de Campos e não desgostava de Saramago. Tinha 89 anos.

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segunda-feira, 14 de outubro de 2019

IRONIA TRÁGICA

Toda a gente se lembra do desastre nuclear de Fukushima, em consequêndia do tsunami de Tōhoku, ocorrido a 11 de Março de 2011, o qual provocou no imediato 18 mil mortos e cerca de 7 mil feridos (continuando desaparecidas mais de 3 mil pessoas). Foi há oito anos.

O Governo japonês fez o que pôde, mas o desastre nuclear de Fukushima ficou sem solução.

Mais de um milhão de toneladas de água contaminada começou a ser armazenada, embora a capacidade dos tanques esgote em 2022.

Yoshiaki Harada, ex-ministro do ambiente do Governo japonês, deu no mês passado uma entrevista onde dizia que a única solução era... despejar a água radioactiva no Pacífico.

Não me lembro de ouvir nenhum ambientalista, ou políticos de países da UE, ou políticos de países terceiros, comentarem estas declarações, que podem ser lidas no Guardian do passado 10 de Setembro.

Agora, o Tufão Hagibis começou a resolver o assunto de forma expedita. Destroços contaminados da antiga central nuclear de Fukushima estão a ser arrastados para o mar.