sábado, 28 de abril de 2018

CASAS

Entrevistada hoje pelo Diário de Notícias, Assunção Cristas diz:

«É mentira que a lei de 2012 desprotegesse as pessoas com mais de 65 anos [...] Sem acordo, o contrato continuava vitalício [...] Há casos de senhorios mal formados que se aproveitaram do desconhecimento dos inquilinos. [...] Deve ser feito um levantamento das pessoas enganadas que vão ser despejadas

Ora bem, o que a líder do CDS não explicou, e Fernanda Câncio não perguntou, foi o seguinte — «E o processo de despejo avançou com vício de forma?»

Quem decreta o despejo? Um juiz ou o funcionário de turno? Se o processo tem lacunas, é nulo. Ou não será?

sexta-feira, 27 de abril de 2018

BDSM


A esquizofrenia talvez explique o súbito fascínio dos media portugueses por Yanis Varoufakis, o homem que mergulhou a Grécia no estado em que se encontra. Sejamos claros: foi a sua actuação desastrosa, um compósito de atrabílis, pose e nonsense, que deu azo à intolerância da UE, do BCE e do FMI. Alvo de desprezo e chacota por parte de largos sectores da opinião pública europeia, Varoufakis saiu pela esquerda baixa ao fim de cinco meses como titular das Finanças. Tivesse ele tido tomates para impor a solução que em 2015 esteve por um triz, ou seja, a saída da Grécia da moeda única, e teria legitimidade para dizer os disparates que diz. Continuavam a ser disparates, mas proferidos por alguém com autoridade. Enquanto os gregos sofrem toda a sorte de restrições, Varoufakis renunciou em 2015 ao lugar de deputado (o circuito Helena Rubinstein dá outra tusa). Incapaz de perceber a solução portuguesa, atordoado com o facto de Centeno presidir ao Eurogrupo, constrói narrativas paroxísticas para caucionar fantasias. Os seus aliados portugueses bem podem limpar as mãos à parede.

quinta-feira, 26 de abril de 2018

LÉSBICAS


Como em todos os 26 de Abril, celebra-se hoje o Dia da Igualdade Lésbica, e o Parlamento Europeu promove uma sessão sobre os direitos das mulheres homossexuais. Sabemos o nome das espanholas, francesas, alemãs, inglesas e dinamarquesas que vão estar na sessão. E portuguesas? Vai haver?

No El País, 26 espanholas dão a cara: são médicas, advogadas, polícias, empresárias, desportistas, executivas, jornalistas, modelos, guionistas, professoras, e outras de outras profissões. Clique na imagem.

IGUALDADE

Um detalhe lateral, porém marcante, da inauguração, ontem, do Jardim Mário Soares, sobressai do à-vontade com que homens e mulheres de várias gerações afirmaram em público as suas identidades, outrora rotuladas de ‘desviantes’. Deputados, autarcas, professores, intelectuais, profissionais liberais, quadros de empresa, escritores, artistas plásticos, actores, estudantes, etc., levaram os seus maridos, as suas mulheres, os seus companheiros e namorados de todos os sexos, fazendo juntos a festa. É claro que não foi a primeira vez. Mas ontem foi na rua, a sol aberto, e foi bonito de ver.

VUILLARD & FINN


Esta semana, na Sábado, escrevo sobre A Ordem do Dia, Prémio Goncourt 2017, o ‘romance’ que assinala a estreia, em Portugal, do francês Éric Vuillard (n. 1968). Várias vezes laureado, Vuillard é autor de obras sobre temas históricos, como sejam a queda do império Inca, a Revolução Francesa, a colonização do Congo, a Primeira Guerra Mundial, tendo desta vez feito pontaria ao III Reich e, em particular, ao apoio das grandes indústrias alemãs, como a Opel, Telefunken, Krupp, Siemens, Basf, Allianz, IG Farben, Agfa, Varta e Bayer. Sem esse apoio, Hitler não teria chegado onde chegou. A precisão é tal que nos questionamos sobre se A Ordem do Dia é, como anunciado, um romance ou, em vez disso, uma crónica sobre factos da História. Palavras do autor: «A literatura autoriza tudo». De facto, em 20 de Fevereiro de 1933, em Berlim, teve lugar a reunião fatal: «As sombras penetraram no grande vestíbulo do palacete do presidente da Assembleia; em breve, porém, deixará de haver Assembleia…» Vuillard descreve com elegância não isenta de sarcasmo o encontro dos sacerdotes da alta finança em casa de Göring, então presidente do Reichstag. São todos citados pelo nome. Com as eleições de Março no horizonte, Göring recorda as responsabilidades de cada um: destruir os sindicatos e acabar com o comunismo. O primeiro capítulo é um prodígio de ironia sobre a história da Opel, «um império incorporado noutro império». Por outro lado, o retrato que faz de Edward Wood, Lorde Halifax, o ministro britânico que deitava água na fervura do Anschluss, tem alto teor de corrosão: «No que toca às ideias, Halifax não tem grandes pudores.» É portanto neste registo de crónica factual que o ‘romance’ progride. Está lá tudo: o incêndio do Reichstag, Dachau, a ominosa Noite das Facas Longas, as leis da eugenia, os recenseamentos étnicos, a noção de espaço vital, o assassinato de Dollfuss, o encontro de Hitler e Schuschnigg em Berchtesgaden, a anexação austríaca, a invasão da Checoslováquia, conversas de Ribbentrop, o flop da primeira série de tanques Panzer… Interessante, mas pouco romanesco. Quatro estrelas. Publicou a Dom Quixote.

Escrevo ainda sobre A Mulher à Janela, romance de estreia de A. J. Finn, pseudónimo de Daniel Mallory (n. 1980), reputado editor de thrillers e crítico literário. Lembram-se de Janela Indiscreta, de Hitchcock? O livro é inspirado no filme. Coincidência ou não, assim que saiu do prelo, os direitos da obra foram comprados para adaptação ao cinema. Escrito no termo de mais uma depressão do autor, o romance corresponde a um guião bem esgalhado, com estrutura de planos sinalizada e diálogos adequados. No livro, em vez do fotógrafo do filme, temos Anna Fox, uma psicóloga infantil, agorafóbica, que vive com o filho e um gato, e um dia testemunha o indizível. Anna tem a mesma idade que o autor. Como ele, vive em Manhattan e vê muito cinema. O livro está encharcado de referências cinéfilas, algumas redundantes, nem todas com direito a nota de rodapé. O convívio com os Russell, a família disfuncional que foi viver para o outro lado da rua, muda a sua vida. As coisas não são exactamente o que parecem, mas não será esse o fascínio dos thrillers? Quatro estrelas. Publicou a Presença.

quarta-feira, 25 de abril de 2018

SOARES & ABRIL


No dia dos 44 anos do 25 de Abril, a zona verde do Campo Grande passa a chamar-se Jardim Mário Soares.

Na extremidade Sul, junto a Entrecampos e à Biblioteca Nacional (uma área com 62 mil metros quadrados), o jardim foi todo redesenhado, substituídas dezoito árvores em risco de queda, melhorada a circulação pedonal, a iluminação nocturna, o isolamento sonoro e o sistema de rega e drenagem. Perto da alameda da Universidade de Lisboa, o Go Fit, um ginásio com seis mil metros quadrados e equipamento de topo, tem capacidade para receber dez mil pessoas. Ocupa o espaço onde outrora existiram duas piscinas. Há também um parque infantil com escalada. Uma parceria entre a Câmara de Lisboa e a Sociedade Portuguesa de Matemática permitiu instalar uma peça de ilusão de óptica, o quarto de Ames, bem como caminhos, ao longo do jardim, com os principais feitos na área da matemática.

A inauguração ocorrerá quando forem 13:00h, com a presença do Presidente da República, do Presidente da Assembleia da República, do primeiro-ministro e do presidente da Câmara de Lisboa. Onde quer que esteja, Soares ficará feliz.

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terça-feira, 24 de abril de 2018

HABITAÇÃO


O primeiro-ministro apresentou ontem, com pompa e circunstância, um ambicioso programa a que chamou “Nova Geração de Políticas de Habitação”. O pacote legislativo associado entrará em vigor por fases, coincidindo a última com os 50 anos do 25 de Abril, ou seja, 2024. A Direita deu pinotes. O PSD falou mesmo de «um novo 11 de Março». BE, PCP e PEV subscrevem. As associações de senhorios e inquilinos, idem.

Algumas medidas:

— Apoio financeiro para arrendamento a famílias com rendimentos até 1700 euros líquidos.
— Os agregados familiares só podem candidatar-se a uma casa cujo valor de renda não represente um esforço superior a 27% do seu rendimento líquido.
— Apoio financeiro para associações de moradores e cooperativas de habitação.
— Apoio financeiro para famílias de classe média incapazes de suportar rendas aos valores de mercado, mas cujos rendimentos são demasiado altos para poderem beneficiar de arrendamento apoiado.
— Os senhorios que aplicarem rendas abaixo do valor de mercado (sendo 20% o desconto mínimo), de duração nunca inferior a 5 anos, terão redução de IMI de 50%.
— A taxa liberatória do IRS baixa dos actuais 28% para 14% nos contratos de duração igual ou superior a 10 anos, e para 10% nos de duração igual ou superior a 20 anos.
— Os senhorios vão beneficiar de um seguro de renda que os compensará de incumprimento do inquilino.
— Os contratos de duração igual ou superior a 20 anos terão isenção total de IMI.
— Os inquilinos com 65 anos ou mais anos de idade, e também os deficientes, têm os contratos automaticamente renovados.
— Às famílias que pretendam mudar a residência permanente da cidade para o campo, o Estado subarrenda a casa desocupada “a preço justo”.
— O INE já começou a publicar os valores de renda praticados em cada freguesia.
Agora é preciso pôr isto tudo em corpo de Lei, começando por revogar a ominosa Lei Cristas. A ver vamos.

Clique na foto do Expresso.

segunda-feira, 23 de abril de 2018

TERROR EM TORONTO


Um homem de 25 anos, antigo aluno do Seneca College, gestor de um aplicativo do Google Play sobre estacionamento de carros, atropelou deliberadamente várias pessoas que circulavam na Avenida Yonge St-Sheppard, de Toronto. O ataque causou 10 mortos e 16 feridos em estado grave. A polícia deteve o homem e subscreve a tese do distúrbio mental. Kathleen Wynne, primeira-ministra do Ontário, é mais céptica.

Clique na foto do jornal Toronto Sun.

BOOKS


Dia Mundial do Livro.
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sábado, 21 de abril de 2018

A INVICTA


Tendo visitado o Porto umas seis dúzias de vezes, nunca ali tinha permanecido cinco dias seguidos. Gostei francamente da experiência. O Porto que me era familiar circunscreve-se ao eixo Campo Alegre/Foz, porque é lá que moram os amigos e, por essa razão, a deslocação para o downtown revelou outra cidade. Verdade que o downtown de 2018 não é o de 1988. Obras de reordenamento urbano, limpeza, recuperação de edifícios, comércio de qualidade, oferta de hotéis, cafés restaurados com bom gosto, esplanadas, tudo contribui para fazer do Porto actual uma cidade convidativa.

Fiquei fã da zona de Sá da Bandeira. E descobri a Rua das Flores, onde fica a Ourivesaria Alliança, durante décadas a maior da Península Ibérica. Os lisboetas conhecem a Alliança da Rua Garrett, mas a casa-mãe, fundada em 1925, embora já não disponha dos cinco andares originais, tem uma elegante casa de chá no piso térreo. Quem for avesso a baixelas e cristais pode ir ao Mercador Café fazer uma refeição ligeira ou beber um copo em ambiente simpático e civilizado. Os bibliófilos encontram dois alfarrabistas, sendo um deles o famoso Chaminé da Mota. A Igreja da Misericórdia merece uma visita, bem como o MMIPO (museu da Misericórdia) e a Chocolataria das Flores. Uma dúzia de barzinhos frequentados por malta nova, trendy, e franceses estruturalistas, dão um toque de cosmopolitismo soixante-huitard. No topo Sul fica o Largo de São Domingos, com esplanadas e a cara lavada. Dois restaurantes merecem atenção: o Traça e o LSD, especialmente o primeiro, que entrou para a minha lista portuense.

É evidente que o centro histórico do Porto não se resume à Rua das Flores, mas foi a zona mais agradável que visitei. Quanto à Rua de Santa Catarina, outrora aprazível, está transformada numa espécie de Chinatown, não tanto pelas lojas, pois há de tudo, mas pelo tipo de esquizofrenia universal. Numa altura em que a cidade se renova, é incompreensível o estado de decadência do magnífico edifício do antigo Cinema Batalha. A reabilitação prevista para 2019 avança? Oxalá. Do outro lado da praça, o Teatro de São João está um brinco.

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quinta-feira, 19 de abril de 2018

MEXIA & SEBALD


Hoje na Sábado escrevo sobre Lá Fora, de Pedro Mexia (n. 1972). Ao contrário da percepção geral, a crónica não é um género muito praticado entre nós. As pessoas confundem crónica com panfleto. Crónica é outra coisa. E Mexia é dos raros cultores avisados. Avisado no sentido de discreto e sensato, qualidades que não beliscam a ironia, a emoção e, sem pose, a costela de erudito. Lá Fora, a colectânea mais recente, reúne textos publicados entre 2006 e 2017. O texto mais antigo, A sauna da democracia, é o retrato nítido do Parlamento. Se tivesse sido escrito pelo Eça a pretexto do estado da Nação sob Hintze Ribeiro, não seria diferente do estado da Nação sob Sócrates. Em flashes breves, Mexia sinaliza os pares da República. Por exemplo: «Nuno Melo lembrava o entusiasmo de um magala que vai às meninas. […] Bernardino Soares nunca foi novo.» O livro é um conjunto de evocações, viagens, afinidades electivas. Por serem momentos decisivos da vida do autor, o texto sobre o encerramento do Tribunal da Boa Hora estabelece uma ponte com o da deslocalização do ‘Diário de Notícias’ para fora do edifício de Pardal Monteiro. No primeiro, Mexia evoca o tempo em que cumpria com tédio o estágio de advocacia; no segundo, os primeiros anos inteiramente dedicados à escrita. Em registo oposto, Uma noite no Lux é um dos textos melhor conseguidos do livro. O mito da discoteca do Cais da Pedra não resiste à mordacidade do noctívago acidental: os «moços com pulôveres amarelos e dentes a mais», os projectores de luz «comprados nuns saldos da Stasi», etc. Sobre a Figueira da Foz, um texto comovido: «Aqui aprendi tudo e não aconteceu nada.» Mas também Maputo, aliás Lourenço Marques, reconstruída a partir de «autobiografias de terceiros». Porque foi a cidade colonial que Mexia tentou ‘encontrar’. A paleta de temas inclui assuntos tão diferentes como a polémica em torno da estátua de Catarina de Bragança, em Nova Iorque; a relação de Leonard Cohen com Marianne Ihlen; o terror metódico de Auschwitz; os judeus sefarditas de Amesterdão; o massacre de Utoya, na Noruega; e outros que o autor expõe com igual brilho. Quatro estrelas. Publicou a Tinta da China.

Escrevo ainda sobre a reedição de Pátria Apátrida, do alemão W.G. Sebald (1944-2001), colectânea de ensaios que dá a medida do sucesso do autor num país que só o descobriu depois de morto. Figura incontrornável do academismo alemão, ensaísta brilhante, Sebald notabilizou-se junto do grande público por intermédio das suas reflexões sobre decandentismo, identidade e memória. Os ensaios reunidos em Pátria Apátrida detêm-se com especial minúcia numa plêiade de autores de língua alemã, casos de, entre outros, Franz Kafka, Hermann Broch, Peter Handke, Charles Sealsfield, Leopold Kompert e Joseph Roth. Em consequência, a questão judaica é um tema em pauta: Para leste, para oeste. Aporias das histórias de gueto em língua alemã é, dos textos coligidos, um dos mais aliciantes. Sebald faz close reading das obras e autores estudados, com remissões de vária ordem (sociológica, política, literária), mas a clareza da escrita, sempre fluente, induz a leitura. Vejamos, sobre O Castelo, de Kafka: «O fado da família Barnabas é uma sociologia sinóptica do povo judeu. Na sua consequência mais extrema, a conclusão é que a minoria oprimida…» Um leitor menos apetrechado, mas não fútil, procurará inteirar-se do quadro geral. E só tem a ganhar. Quatro estrelas. Publicou a Quetzal.

sábado, 14 de abril de 2018

MILOS FORMAN 1932-2018


Após doença breve, morreu ontem à noite, na sua casa do Connecticut, o realizador checo Miloš Forman, naturalizado americano desde 1968. Autor de filmes que ficaram no imaginário popular, como foi o caso de, entre outros, O Baile dos Bombeiros (1967), proibido após a invasão de Praga pela URSS, Voando Sobre um Ninho de Cucos (1975, cinco óscares), Amadeus (1984, oito óscares) e Valmont (1989), Forman, que também era actor, tornou-se um nome de referência da história do cinema. Filho de pais judeus, praticamente não os conheceu, pois foram mortos num campo de concentração nazi. Tinha 86 anos.

COMEÇOU


Por volta das duas da madrugada, hora portuguesa, os Estados Unidos, o Reino Unido e a França bombardearam os arredores de Damasco e outra localidade a Norte da capital síria. Sabemos como começou, não sabemos como irá acabar. O Senado americano, o Parlamento britânico e o Senado francês autorizaram a operação.

A imagem do New York Times mostra o momento em que os mísseis sobrevoavam Damasco. Clique.

sexta-feira, 13 de abril de 2018

IDENTIDADE DE GÉNERO


Por 109 contra 106 votos, o Parlamento aprovou hoje a nova lei de identidade de género, baixando para 16 anos a idade para mudar de sexo no Cartão do Cidadão. Acaba também a obrigatoriedade de apresentar relatório médico. Votaram a favor: PS, BE, PAN, PEV e Teresa Leal Coelho, do PSD. Votaram contra: PSD e CDS. O PCP absteve-se.

LITERATURA SEM NOBEL?


Sara Danius, secretária permanente e porta-voz da Fundação Nobel, demitiu-se ontem na sequência da demissão de Katarina Frostenson, poeta, membro da Academia Sueca, casada com o fotógrafo Jean-Claude Arnault, acusado de assédio sexual por dezoito mulheres. O escândalo rebentou em Novembro, e o apoio de Sara Danius a Katarina Frostenson levou à demissão, a semana passada, de três membros da Academia. Agora que Katarina bateu com a porta, Sara foi forçada a fazer o mesmo. O busílis é que a Academia ficou sem quorum para decidir sobre o Nobel da Literatura. A eleição de novos membros está vedada enquanto não for resolvido o processo que opõe dois membros (ausentes das votações dos últimos anos) à direcção da Academia. O rei Carlos XVI Gustavo acompanha a situação de perto.

Na imagem, Sara Danius. Clique.

TORTURA

Carlos Botas, capitão, ex-comandante da GNR de Santiago do Cacém, foi ontem condenado pelo Tribunal de Setúbal a 4 anos e 6 meses de prisão efectiva por, em 2011, ter chicoteado repetidamente quatro suspeitos de assaltos na Comporta. «Na minha zona ninguém rouba», reiterou. Em Portugal, terá sido a primeira condenação de um militar/polícia por tortura.

quinta-feira, 12 de abril de 2018

CORTÁZAR & MÃE


Hoje na Sábado escrevo sobre o romance de estreia de Julio Cortázar (1914-1984), Os Prémios, finalmente traduzido. Não foi o primeiro que o autor escreveu, mas foi o primeiro a ser publicado, antecipando O Jogo do Mundo (1963), o livro da consagração, epítome da ruptura com o modelo clássico da ficção latino-americana. A trama é simples: os vencedores da lotaria têm direito a um cruzeiro. O destino é desconhecido e há regras a cumprir. Depois de um encontro no café London, de Buenos Aires, um grupo de contemplados aceita embarcar num cargueiro misto da Magenta Star. Como o embarque se faz às escuras, desconhecem o nome do navio, Malcolm. Deveras enigmático. Nenhum deles tem afinidades entre si: nem origem social, nem profissão, nem convicções ideológicas, nem conta bancária, nem sequer as razões pelas quais aceitaram o prémio. A partir daí, tudo gira em torno do quotidiano de Lucio, Nora, Medrano, Paula, Raúl, Claudia, Felipe, Persio e outros. Idiossincrasias, equívocos, sexo (área em que Cortázar revela exemplar à-vontade), rancores, pusilanimidades, intrigas, decepções, arrivismo, prosápia intelectual, atritos, tudo contribui para fazer daquele peculiar microcosmo um retrato da sociedade da época. Persio, provável alter ego de Cortázar, parece ser o único com a chave dos acontecimentos. Medo e perplexidade face ao desconhecido. A existência de tifo a bordo piora a situação. Por que motivo o navio foi autorizado a partir com tripulantes doentes? Porquê a inexplicada ancoragem? A proibição de aceder à ponte tem a ver com o tifo? A tripulação nada esclarece e o seu mutismo provoca um motim entre os passageiros. O desfecho pícaro quadra de viés com a retórica existencialista. A grelha semântica seria afinada com O Jogo do Mundo, mas, por enquanto, largas passagens são redundantes. Filho de um diplomata argentino, Cortázar nasceu na Bélgica, poucas semanas após a eclosão da Primeira Guerra Mundial. Mais tarde viveu na Argentina, onde publicou contos e outros textos. Em 1951, descontente com o regime de Perón, fixa-se em Paris como tradutor da Unesco. Em 1981, em protesto contra a ditadura militar de Videla e Viola, solicita e obtém a nacionalidade francesa. Quatro estrelas. Publicou a Cavalo de Ferro.

Escrevo ainda sobre Publicação da Mortalidade, a poesia reunida de Valter Hugo Mãe (n. 1971). Mais conhecido como ficcionista, o autor voltou à poesia. Melhor dito, reuniu num único volume os poemas definitivos. Os livros originais foram agrupados sem referência à primeira publicação. Nenhuma introdução ou simples nota indica os critérios da recolha. O leitor terá de descobrir por si os poemas omissos ou de tal modo alterados que devêm inéditos. Valter Hugo Mãe tinha dez livros de poesia publicados quando o primeiro de sete romances fez dele um autor mediático. Portanto, o grande mérito desta poesia reunida consiste na demonstração do conseguimento do autor enquanto poeta (em detrimento do ficcionista, entenda-se). Numa época em que a narrativa vive refém da retórica mais adiposa, a sua poesia não tem medo da elipse: «vem ver-nos / tarda nada chega a primavera / e as flores que plantámos no / quintal vão florir como / símios loucos aos teus pés». A lição modernista é recuperada com brio. Noutro registo, a sequência «os olhos encaracolados de sonho» (um extenso poema) dá a medida do fôlego do poeta. Quatro estrelas. Publicou a Assírio & Alvim.

RECUO?

A reviravolta indicia que alguém tomou as rédeas em Washington. Depois das ameaças que fizeram subir a tensão para níveis incomportáveis, Sarah Huckabee Sanders, porta-voz da Casa Branca, esclareceu que, existindo outras opções, não está iminente um ataque à Síria. Antes assim. Não obstante, Theresa May mantém para hoje uma reunião de emergência do Governo britânico com vista a acertar detalhes da intervenção. Se formos optimistas, podemos concluir que alguém fez um desenho ao Presidente.

quarta-feira, 11 de abril de 2018

SÍRIA

Parece estar iminente um ataque aéreo à Síria por parte dos Estados Unidos. A aviação civil já foi avisada para a ocorrência de perturbações na área do Mediterrâneo oriental. Há porém um sério busílis: havendo, como parece haver, militares e equipamento russo em todas as instalações militares sírias, um ataque à Síria será também um ataque à Rússia. Para já não falar do Irão.

Claro que a Síria é um pretexto. O vasto mundo, a Ocidente e a Oriente, a ONU, a NATO e a UE borrifam-se para a tragédia síria. Mas Trump tem de distrair a opinião pública das declarações de duas mulheres: Karen McDougal, ex-modelo da Playboy, alega ter tido durante um ano (2006) uma relação amorosa com o Presidente e de, em conformidade, ter recebido 150 mil dólares; e Stephanie Clifford, actriz porno conhecida como Stormy Daniels, recebeu 130 mil dólares para garantir que mantinha a boca fechada durante a eleição presidencial de 2016. Bem pode Trump dizer que tudo não passa de... A total witch hunt, que Robert S. Mueller III, o Procurador, não se comoveu. Agentes do FBI invadiram e revistaram o gabinete do advogado pessoal do Presidente, Michael D. Cohen, recolhendo provas dos pagamentos e outras acusações. Tudo isto explica a urgência do ataque à Síria. A ver vamos.

segunda-feira, 9 de abril de 2018

ORBÁN REELEITO


A reeleição de Viktor Orbán para um terceiro mandato consecutivo deve fazer a Europa reflectir. O outdoor da imagem ilustra o enfoque da campanha eleitoral: Stop à emigração. Com este slogan, o partido de Orbán, o Fidesz, ou Magyar Polgári Szövetség, elegeu 70% dos deputados do Parlamento húngaro. O mundo está perigoso.

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