sábado, 18 de junho de 2016

PESOS & MEDIDAS

A pretexto do aumento residual do salário mínimo e de algumas prestações sociais, a Direita repete todos os dias que o Governo conduz o país para o abismo. Passos, Cristas e respectivos corifeus não poupam no catastrofismo. Mas foi o executivo PSD/CDS quem, duas semanas antes das eleições de Outubro, aumentou os salários do chefe de gabinete, dos assessores e das secretárias pessoais do Tribunal Constitucional. O decreto-lei é de 16 de Setembro. Desse modo, o chefe de gabinete do presidente do TC passou a ter direito a um salário bruto de 4.150 euros (em vez de 3.375), os assessores 3.500 (em vez de 2.700) e as secretárias pessoais 2.000 (em vez de 1.856). A mim não me incomodam nada os salários altos e, para ser franco, estes valores estão longe de ser altos. Depois da retenção do IRS e da quota da Segurança Social, sofrem um corte nunca inferior a 42%. Se necessário fosse, fica demonstrado o comportamento bipolar da oposição. Já agora, referir que o ministério das Finanças ainda não começou a processar os novos valores.

sexta-feira, 17 de junho de 2016

UK OUT?


Hoje, o quadro é este. A média de todas as sondagens divulgadas até ao momento corresponde a 48% de britânicos a favor do Brexit e 43% a favor da permanência na UE. Imagem do Financial Times. Clique para ver melhor.

quinta-feira, 16 de junho de 2016

CLAUDIO MAGRIS


Hoje na Sábado escrevo sobre Uma Causa Improcedente, de Claudio Magris (n. 1939), que voltou ao romance após um intervalo de nove anos. Publicado no ano passado, acaba de ser traduzido. Quem leu Às Cegas reencontra algumas das obsessões do autor, sobretudo as que dizem respeito ao papel da Itália durante a Segunda Guerra Mundial. Aliado de Hitler, Mussolini mandou perseguir, prender, torturar e assassinar os adversários do Eixo, em especial compatriotas seus (muitos atravessaram a fronteira para ingressarem no exército jugoslavo), mas também eslovenos e croatas, além de judeus de todas as origens que acabaram no forno crematório da Risiera di San Sabba. Uma Causa Improcedente parte de factos concretos: o campo de morte em Trieste, utilizado entre Setembro de 1943 e Abril de 1945, e, na mesma cidade, o Museo Della Guerra Per La Pace Diego de Henriquez. Magris sabe que toda a ficção se nutre de realidade. Embora o seu nome seja omisso, Diego de Henriquez (1909-1974) está no centro da intriga: «Sem esse homem e sem a sua totalizante paixão este livro não teria sido escrito.» Ao invés, Luísa é uma personagem totalmente ficcionada. Magris intercala as vidas de ambos, Diego e Luísa, com a sua própria memória histórica. Monólogos interiores, pequenos apontamentos, descrições de fôlego: «Descobrir que aqueles belos terraços iluminados eram a outra fachada da Risiera — o salão recomendável, de representação, daquele como de todos os matadouros…» (o campo de concentração de Trieste ocupava um complexo industrial imponente). Diego não esquece os demónios ávidos «de carne humana», por isso insiste no projecto do Museu da Guerra, palco da Humanidade desfigurada. Sobrepondo os tempos da narração, fragmentada entre flashbacks e o presente, por vezes episódios estranhos à urdidura, indiferente ao efeito que possa ter na leitura a sobrecarga de informação sobre material de guerra (canhões, tanques, espessura de blindagens, aviões, submarinos, etc.), Magris compõe um quadro dantesco, matizado pela música de uma prosa enxuta: «A alma entra num outro corpo, talvez num jaguar, também numa planta, num cato, alguém devora o meu corpo, aqui, ali, a rede cede como uma teia de aranha cai entre os catos.» Indispensável. Cinco estrelas.

FORD, OF COURSE


Richard Ford, americano, 72 anos, é o vencedor deste ano do Prémio Princesa das Astúrias (categoria Letras). Ford, uma das vozes mais importantes da literatura contemporânea em qualquer língua, é autor de uma obra parcimoniosa, publicada a partir de 1976: sete romances, um volume que colige quatro novelas, cinco colectâneas de contos e uma peça de teatro. Mais uma vez, o prémio confirma a justeza das escolhas, em todas as categorias: Artes, Ciências Sociais, Comunicação e Humanidades, Letras, Investigação Científica, Cooperação Internacional, Concórdia, Desporto. Nenhum autor português o recebeu, embora a língua portuguesa esteja representada pela brasileira Nélida Piñon (2005), de origem galega.

Dos livros de Ford traduzidos em Portugal, destacaria quatro romances: A Última Oportunidade (1981), O Jornalista Desportivo (1986), Dia da Independência (1995), e a indiscutível obra-prima que é Canadá (2012). Mas há mais por onde escolher mesmo em tradução portuguesa. Clique na imagem.

quarta-feira, 15 de junho de 2016

WILLIAM


A Attitude é uma revista gay, britânica, que se publica desde 1994. Não usa paninhos quentes: grafismo e conteúdo explícito. Pois bem, o príncipe William (ou seja, o duque de Cambridge) faz a capa do número de Julho, que chega às bancas no próximo dia 22. É muito claro nas afirmações que faz em entrevista. Uma das fotos, de 2004, mostra-o de speedo a sair da piscina. Lembrar que o neto da rainha dinamiza um grupo de apoio à comunidade gay em matérias como o assédio moral e o bullying, praticados na escola, no emprego e no espaço público. E anteontem esteve com a mulher na embaixada americana a apresentar condolências pelo massacre de Orlando. Clique na imagem.

O MEDO DO BREXIT

Elena Ferrante, Slavoj Žižek, Javier Marías, Cees Nooteboom e Yanis Varoufakis fazem parte de um conjunto de dez personalidades europeias que apelam publicamente à permanência do Reino Unido na UE. O Guardian publica hoje as cartas abertas de cada um deles. Deixo uma síntese de Žižek — «And it is because of this margin of hope that I am tempted to say: vote against Brexit, but do it as a devout Christian who supports a sinner while secretly cursing him.» A longa carta mete Mandela e Lula pelo meio. Noutro plano, escuso de acrescentar que ler Varoufakis a celebrar a vantagem de permanecer na UE não se resolve com uma simples embalagem de Guronsan.

terça-feira, 14 de junho de 2016

POIS

O livro mais vendido na Feira de Lisboa foi o Mein Kampf, de Hitler. Edição Guerra & Paz, com noventa páginas de prefácio de Manuel S. Fonseca, contextualizando a obra. Logo a seguir, o mais vendido foi o último romance de José Rodrigues dos Santos (Gradiva). Quem dá estas novidades é o Diário de Notícias.

O BURACO DA CGD

Segundo a imprensa tablóide, seria da responsabilidade de Carlos Santos Ferreira e Armando Vara, nomeados por Teixeira dos Santos em 2005. Mas ambos deixaram a Caixa Geral de Depósitos em Janeiro de 2008, transitando para o Millennium BCP. Então o buraco da CGD vem de 2007? Verdade? A ser assim, o que andou Faria de Oliveira a fazer como CEO da Caixa entre 2008 e 2011, e como Chairman entre 2011 e 2013? Com a agravante, convém recordar, de Faria de Oliveira presidir à Associação Portuguesa de Bancos desde Abril de 2012, e de ser membro dos conselhos consultivos do Banco de Portugal e da CMVM. Os ministros Vítor Gaspar (2011-13) e Maria Luís Albuquerque (2013-15) não deram por nada? O que andou a fazer a administração presidida, desde 2013, por José Agostinho de Matos? Os funcionários da troika destacados em Lisboa entre 2011 e 2015 passaram esses quatro anos a fazer o quê? Atirando para Carlos Santos Ferreira e Armando Vara a responsabilidade do buraco da Caixa, a imprensa tablóide revela um continuum de cumplicidades. Entretanto, desapareceram dois bancos: o BES e o BANIF.

segunda-feira, 13 de junho de 2016

A BARBÁRIE


O Daesh já reivindicou o ataque à discoteca gay Pulse: «Foi um soldado do Califado.» O matador, nascido nos Estados Unidos no seio de uma família afegã, era segurança de profissão. Não gostava de ver homens a beijarem-se, declarou o pai aos media. Obama foi claro: «Não vamos ceder ao medo ou virar-nos uns contra os outros. Vamos permanecer unidos como americanos para proteger o nosso povo, defender a nossa nação e agir contra os que nos ameaçam.» O massacre de Orlando foi o ataque a tiro mais mortífero da História dos Estados Unidos. Foi declarado estado de emergência em toda a Flórida e, nas últimas 24 horas, realizaram-se marchas de repúdio em cidades de vários Estados americanos.

domingo, 12 de junho de 2016

ORLANDO, MASSACRE

As pessoas que estavam a divertir-se na discoteca Pulse não eram WASP (white anglo-saxon protestant), eram membros da comunidade hispânica. A Pulse é a discoteca gay de Orlando onde um tarado abateu 50 pessoas a tiro, fazendo reféns mais 300. Houve quem conseguisse fugir. O pesadelo acabou quando uma brigada da polícia de choque invadiu o local e abateu o atirador. Rescaldo: 50 mortos, 53 feridos em estado grave. Aconteceu ontem à noite (sete da manhã de hoje em Lisboa), e as autoridades americanas ainda não sabem se o atirador era um radical islâmico. Mas quem quer saber de um massacre anti-gay na cidade-Disney?

sexta-feira, 10 de junho de 2016

COMO DEVE SER

Fernando Medina, presidente da Câmara de Lisboa, podia estar hoje em Bilderberg, por ter sido um dos três convidados portugueses. Mas preferiu ficar em Lisboa. Afinal, os dias 10 e 13 de Junho são datas caras à cidade. Os holofotes internacionais podem esperar.

quinta-feira, 9 de junho de 2016

EUROSONDAGEM


Maioria de Esquerda = 53,3%. Subiu 0,5% relativamente a Maio. Em matéria de popularidade, Marcelo e António Costa continuam no topo. Clique na imagem do Expresso para ler melhor.

quarta-feira, 8 de junho de 2016

MUDAM-SE OS TEMPOS

A propósito da exaltação de Marques Mendes com as 35 horas de trabalho no sector público, propondo o seu veto, Francisco Louçã lembra no Público que o conselheiro-comentador era membro do governo de Cavaco que introduziu esse limite (revogado por Passos & Portas). Na sua qualidade de secretário de Estado da Presidência, Mendes «tinha por função coordenar a produção legislativa do governo, verificar as leis, preparar a sua redacção final.» Nessa altura não lhe ocorreu nenhuma inconstitucionalidade. Espero que no próximo domingo a SIC confronte Mendes com o facto.

MS CLINTON, OF COURSE


Hillary tem a nomeação garantida. Ainda bem. Clique na imagem.

MÁRIO DE SÁ-CARNEIRO


Hoje na Sábado escrevo sobre a Obra Essencial de Mário de Sá-Carneiro (1890-1916), volume planeado por Fernando Pessoa, executor literário do amigo precocemente suicidado, que até hoje nunca vira a luz do dia. Isso acontece agora, pela mão exigente e criteriosa de Vasco Silva, no ano do centenário de Sá-Carneiro. Nas suas quase seiscentas páginas, colige o texto programático que Pessoa publicou na revista Athena em Novembro de 1924, bem como Dispersão, Indícios de Ouro, Manucure e Últimos Poemas, duas narrativas em prosa — A Confissão de Lúcio e Céu em Fogo —, além de textos avulsos, correspondência entre Pessoa e João Gaspar Simões, cartas astrológicas, uma entrevista e as respostas a um inquérito. Não se trata, portanto, de uma edição crítica, mas do Sá-Carneiro que Pessoa considerava essencial. Na Nota Editorial, Vasco Silva dá conta da metodologia seguida (as edições de referência para a fixação do texto). Uma minuciosa cronologia, índice de primeiros versos e bibliografia, completam o volume. Acrescentar que a edição, de capa dura e esmerado apuro gráfico, resulta de um mecanismo de financiamento colectivo por parte de um grupo de leitores. Cinco estrelas. Publicou a E-Primatur.

sábado, 4 de junho de 2016

PROJECTO?

No prólogo de uma entrevista com Vasco Pulido Valente, hoje publicada no Expresso (o pretexto é dizer mal de Marcelo), escreve Ângela Silva: «Pulido Valente fala das memórias que está a começar a escrever, da sua passagem, em breve, dos jornais para um projeto online...» Um projecto online? Então uma publicação com dois anos é um projecto? Toda a gente sabe que VPV deixou o Público há meses, e vai começar a escrever, a partir de Outubro, no Observador. Goste-se ou não, o Observador é um jornal, com forte marca ideológica, presumo que mais lido que o Expresso. O suporte digital é irrelevante. Custa assim tanto dizer o nome da concorrência?

BREXIT OR NOT

A possibilidade do Brexit está a aterrorizar as elites de Londres. Depois dos apelos dramáticos dos banqueiros e dos patrões da indústria, chegou a vez da intelligentsia. Alguns exemplos: Dame Carol Ann Duffy, poeta (a primeira mulher e a primeira personalidade LGBT a ocupar o lugar de Poet Laureate); escritores como Hilary Mantel, Ian McEwan, John le Carré, Michael Morpugo e Tom Stoppard; cineastas como Danny Boyle e Stephen Frears; actores como Benedict Cumberbatch, Bill Nighy, Dominic West, John Hurt, Keira Knightley e Kristin Scott Thomas; artistas plásticos como Anish Kapoor e Tracey Emin; a performer Paloma Faith e muitos outros. O abaixo assinado dos artistas e intelectuais tem centenas de aderentes.

E O BURACO?

O Governo prepara-se para mudar tudo na gestão da Caixa Geral de Depósitos. O novo CEO será António Domingues, que esta semana saiu do BPI. O presidente do Conselho Fiscal será Guilherme d’Oliveira Martins, ex-presidente do Tribunal de Contas e actual administrador executivo da Fundação Calouste Gulbenkian. É extinto o cargo de Chairman. Em seu lugar, é criado um conselho de administração não-executivo, constituído por doze membros, entre os quais Rui Vilar, ex-presidente da Gulbenkian e da REN; Leonor Beleza, presidente da Fundação Champalimaud; Bernardo Trindade, ex-secretário de Estado de um governo de Sócrates; e Pedro Norton, ex-CEO da Impresa. Nos termos de uma directiva do BCE, a nova administração da CGD auferirá salários superiores aos actuais. A administração PAF vai toda à vida.

quinta-feira, 2 de junho de 2016

COLM TÓIBÍN


Hoje na Sábado escrevo sobre Nora Webster, o romance mais recente do irlandês Colm Tóibín (n. 1955). Professor dos dois lados do Atlântico, escrita criativa em Manchester, Humanidades em Nova Iorque, autor de vasta obra ensaística e dez romances, Tóibín escreve desta vez sobre as armadilhas da solidão. Provavelmente inspirado na vida da sua própria mãe, o plot tem a cadência das narrativas auto-referenciais. A escrita é lisa, isenta de ênfase, mas isso não é novidade para quem leu os livros anteriores. Não era fácil a vida na Irlanda dos anos 1960-70. Nora é uma viúva precoce, uma mulher de meia-idade com quatro filhos e seis libras por semana de pensão de viuvez. A morte do marido deixou-a suspensa no vazio. Agora, até a solicitude dos vizinhos se tornou um empecilho, no limite da intrusão. Quem tenha lido Brooklyn, depressa identifica a May Lacey que surge no primeiro capítulo. Mas Nora estava farta. Farta de ouvir dizer que «o tempo cura tudo», metia-se no carro, saía de Enniscorthy e ia chorar para perto do mar. Vira-se obrigada a vender a modesta casa de praia, mas fora feliz em Cush, e era para lá que fugia. Parecia-lhe sensato deixar os filhos longe da dor. Mais tarde tomará consciência do erro. Quando Maurice morreu não queria pensar em nada, nem sequer no sofrimento dos filhos. Menos ainda em política. O marido estivera ligado ao Fianna Fáil e uma das filhas acabará por seguir as pisadas do pai. Os interstícios da ficção são pontuados por factos e personagens reais (os motins de Derry, o escândalo que envolveu Charles Haughey, o ministro das Finanças acusado de traficar armas para o IRA, por exemplo), estratagema que torna a leitura muito aliciante. Como não podia deixar de ser numa história irlandesa, a querela religiosa, vexata quaestio entre todas, surge como parte da intriga. A partir do momento em que Nora vem à tona da depressão, voltando a cantar e dando novo rumo à sua vida, o romance ganha outro fôlego. Quatro estrelas.

segunda-feira, 30 de maio de 2016

PRÉMIO CAMÕES 2016

O brasileiro Raduan Nassar, 80 anos, venceu o Prémio Camões 2016. Nassar publicou apenas três livros: o romance Lavoura Arcaica (1975), a novela Um Copo de Cólera (1978), títulos que em 1980 foram reunidos num único volume, e a colectânea de contos Menina a Caminho (1994). Em Portugal, os seus livros estão publicados pelas editoras Relógio d’Água e Cotovia.