segunda-feira, 18 de novembro de 2019

THE CROWN, AGAIN


Vi os dois primeiros episódios da série de Peter Morgan. Magníficos.

Isabel II está com 38 anos e Olivia Colman é perfeita no papel. Não diria o mesmo de Helena Bonham Carter, que faz um retrato histriónico de Margarida (a personalidade da actriz acentua o lado antipático). Tobias Menzies devolve-nos um Filipe mais sarcástico. Etc.

O mais interessante, porém, são os temas abordados. Por exemplo:

No Outono de 1964, sem dinheiro para honrar os compromissos com o FMI, e portanto à beira da bancarrota, o Reino Unido vê-se obrigado a pedir mil milhões de libras aos Estados Unidos. O trabalhista Harold Wilson, primeiro-ministro desde Outubro, não consegue que Lyndon B. Johnson autorize o empréstimo. Quem desfaz o nó? Margarida, a irmã da rainha, durante uma visita (1965) aos Estados Unidos na companhia do marido, Antony Armstrong-Jones. Tudo se resolve num jantar na Casa Branca, no meio de anedotas porcas e muito álcool. As peripécias que conduzem ao jantar são deveras interessantes, mas não vou contar tudo.

O caso Blunt não é ignorado. Isabel II fica atónita ao descobrir que Sir Anthony Blunt, historiador de arte e Surveyor of the King and Queen’s Picture, era o 4.º homem do anel de cinco espiões de Cambridge. Ela desconfiava de Wilson, saiu-lhe Blunt. Sobre Blunt, além da extensa bibliografia histórica, existe um romance notável de John Banville, O Intocável. Foi também ele quem deu origem ao personagem Maurice, no romance The Climate of Treason de Andrew Boyle.

Voltando à série. A rainha fica indignada mas, em nome dos interesses do Reino, prefere fingir que nada aconteceu.

Blunt, que ocupava o cargo desde 1945, a convite de George VI, permanecerá no lugar até 1972. Só será publicamente exposto em Novembro de 1979, na Câmara dos Comuns, por Margaret Thatcher. Perdeu os títulos mas nada lhe aconteceu até morrer, pois tinha imunidade. O actor Samuel West é o Blunt da série.

E um dos momentos altos é a conversa que mantém com Filipe, o príncipe consorte, durante um vernissage. Filipe diz-lhe que devia ser denunciado, mas Blunt recorda-lhe a existência de fotografias comprometedoras do Caso Profumo (as fotos desapareceram de casa de Stephen Ward, o osteopata da alta sociedade responsável pela rede de prostituição de luxo que serviu de pano de fundo ao escândalo), fotos que estariam em mãos seguras, embora pudessem surgir a qualquer momento.

Sempre se suspeitou que Filipe fosse o membro sénior da família real... envolvido no caso, mas creio que é a primeira vez que isso é dito com todas as letras.

De resto, fotografia, diálogos, recriação de ambientes, guarda-roupa, reconstituições (como o interior dos Vickers VC 10 da BOAC), etc., tudo superlativo.

Clique na imagem: o casal real na série e na realidade.