Ontem fez-se História. Doravante, o 8 de Novembro de 2015 poderá ficar marcado como o dia em que a Esquerda portuguesa percebeu o óbvio: prejudica o país defender idiossincrasias particulares em detrimento de um denominador comum. Passados 40 anos sobre o 25 de Novembro, o PS assume o compromisso de governar com o apoio parlamentar do BE, do PCP e dos Verdes. Em 4 de Outubro, os portugueses elegeram deputados, cabendo portanto ao Parlamento decidir quem deve governar.
O nó górdio foi desatado pelo PCP, quando, ao início da noite, Jerónimo de Sousa transmitiu a decisão unânime do Comité Central: «Nada obsta à formação de um Governo de iniciativa do PS que assegure uma solução duradoura na perspectiva da legislatura.» Estando na sala quem não soubesse o que é uma legislatura, o líder comunista precisou: «Como não houve revisão constitucional, uma legislatura são quatro anos.» Claro como água.
Duas horas mais tarde, o PS reuniu a sua Comissão Política, a que se juntaram deputados e eurodeputados. O partido decidiu formalizar uma aliança parlamentar com o BE, o PCP e os Verdes, e apresentar uma moção de rejeição ao programa de Governo que hoje começa a ser discutido no Parlamento. A proposta de António Costa foi aprovada por 69 votos a favor e cinco contra, sem abstenções. (No sábado, a Comissão Nacional havia mandatado Costa com 163 votos a favor, sete contra e duas abstenções.) O secretário-geral do PS está portanto em condições de derrubar Passos Coelho e apresentar uma alternativa ao Presidente da República.
A contestação da ala direitista esvaziou. Francisco Assis foi claro: «Desejei boa sorte a António Costa, que vai ser primeiro-ministro e, obviamente, não vou fazer mais nenhuma consideração, porque o caso está internamente resolvido. A minha posição é conhecida, o partido vai seguir por outro caminho, mas tenho de respeitar as decisões tomadas democraticamente.»
Tudo indica que o XX Governo Constitucional seja rejeitado amanhã. Cavaco, Passos & Portas devem ter presente que foi a intolerância dos últimos quatro anos que levou a este desfecho. Aconteça o que acontecer, nada será como dantes.
A imagem é de José Caria, para o Expresso.