Sapatos de Corda — Agustina é um relato desempoeirado da vida da escritora: a família, o Douro, os livros, os anos de Esposende, a casa do Gólgota, os Verões em Guéthary, a gestão parcimoniosa das amizades, a desconfiança do milieu literário, a natural coqueteria, o enfado com o paroquialismo indígena, a política, as viagens, os filmes de Manoel de Oliveira, o apoio do marido. Excertos de cartas escritas por Agustina à mãe e à filha iluminam o texto. O mesmo se diga da vasta iconografia: fotografias de várias épocas, reproduções, desenhos de Alberto Luís e Mónica Baldaque.
Em matéria de revelações, sirva de exemplo a história do Jaguar: Agustina, que não dava importância nenhuma a automóveis, pediu um Jaguar a Cupertino de Miranda a título de direitos de autor pela biografia encomendada pelo banqueiro. O Jaguar, cinza com estofos vermelhos, seria mais tarde vendido a um militar de Abril.
Há mais, naturalmente. Até porque Mónica Baldaque não omite o seu próprio percurso: infância, relações com os pais, colégio, anos de Lisboa — onde concluiu o curso de pintura na Escola Superior de Belas-Artes —, namoricos, vida profissional, casamento, filhos, direcção de dois museus (Soares dos Reis, Literatura), artistas e escritores com quem privou, acompanhamento da reedição da obra de Agustina, etc. O episódio envolvendo um improvável Corto Maltese é uma das várias passagens enigmáticas do livro.
Enquanto não chega a biografia de Agustina escrita pelo historiador Rui Ramos, Sapatos de Corda — Agustina é o melhor que li até hoje sobre a Sibila. Nessa medida, se Barthes falou no prazer do texto, seria fútil repetir o óbvio.
Clique na imagem.