Lia Gama foi a entrevistada de ontem no programa Alta Definição, do jornalista Daniel Oliveira, na SIC. Vi agora. Um daqueles momentos raros de televisão.
Lia, que no próximo dia 24 vai receber o prémio Sophia Carreira (assunto omisso da conversa), expõe a sua vida com uma naturalidade desarmante, por vezes crua: violência doméstica na infância, maioridade aos 13, Paris, vigilância da Pide, o teatro, o dedo amputado do fotógrafo Sérgio Guimarães, outros amores, noitadas, bezanas, o casamento, os meses de Angola nos anos de brasa da guerra colonial, o filho, a disciplina do actor, a solidão.
Conheci a Lia em Lourenço Marques, no dia do meu 21.º aniversário (1970), em circunstâncias peculiares. Ainda há três dias estivemos juntos, a rir-nos muito, mas ela foi incapaz de mencionar que estava para sair a entrevista, tal como, na conversa com Daniel Oliveira, não faz referência aos autores que interpretou, e foram alguns dos maiores (Shakespeare, Gorki, Beckett, Genet, Sartre, Fassbinder, Gombrowicz e outros), nem aos encenadores com quem trabalhou, e também aí podia ter puxado dos galões, porque trabalhou com toda a gente que importa. Quem a ouvir, parece que só fez teatro de boulevard na companhia de Vasco Morgado. Também não fala dos filmes, e foram tantos, de realizadores tão diferentes como Manoel de Oliveira, Fernando Lopes, Fonseca e Costa, Solveig Nordlund, Alberto Seixas Santos, Joaquim Leitão, Alain Tanner e outros. Nenhuma pose, apenas a vida como ela tem sido. Vale a pena ir ver.
Na imagem, Lia Gama fotografada por Jorge Gonçalves durante a representação de Aos Que Nasceram Depois de Nós, de Brecht, dirigida por Jorge Silva Melo para os Artistas Unidos e Companhia de Teatro de Braga, em 1998.
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