No meu ensaio Fractura (2003) escrevi que a obra do autor traz consigo «o travo desabusado de um deboche camp com seu quê de fundador…» Seria fútil acrescentar uma palavra ao que escrevi há dezoito anos.
Natural de Lisboa, Mário de Sá-Carneiro, órfão de mãe desde os dois anos de idade, partiu para Paris em 1912, meses após o suicídio, no pátio do Liceu Camões, do seu muito querido amigo Tomás Cabreira Júnior, com quem escrevera Amizade (1910), peça representada no Clube Estefânia. Data dessa época o convívio com Fernando Pessoa.
Antes da partida do pai para Lourenço Marques, cidade onde o poeta cogitou fixar-se (o avô paterno dirigia os Portos e Caminhos de Ferro de Moçambique), viaja pela Europa. Por fim estabelecido em Paris, Mário de Sá-Carneiro matricula-se no curso de Direito da Sorbonne, que nunca frequentará, frequenta o milieu literário e artístico, e termina A Confissão de Lúcio, narrativa camp publicada em 1914.
O essencial da obra foi escrito na capital francesa, onde se suicida com cinco frascos de estricnina, num quarto do Grand Hôtel de Nice (Montmartre), no dia 26 de Abril de 1916, três semanas antes de completar 26 anos. O amigo José Araújo assiste aos últimos estertores.
Datado de 1916, o poema desta semana surgiu na edição póstuma de Poesias Completas, volume organizado por João Gaspar Simões e publicado em 1946 pela Ática. Faz parte dos poemas ‘irritantes’ — o adjectivo é do autor —, inseridos na extensa correspondência trocada com Pessoa. Na carta que o acompanha, esclarece tê-lo escrito no dia em que lhe roubaram um guarda-chuva.
A imagem foi obtida a partir de Poesia Completa de Mário de Sá-Carneiro (2017), editado por Ricardo Vasconcelos e publicado pela Tinta da China.
[Antes deste, foram publicados poemas de Rui Knopfli, Luiza Neto Jorge, Mário Cesariny, Natália Correia, Jorge de Sena e Glória de Sant’Anna.]
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