A reedição de O Bom Soldado, de Ford Madox Ford (1873-1939), traz de volta um mogul da literatura. Simplificando muito, pode-se dizer que Quadrilha, o poema de Carlos Drummond de Andrade, é uma “síntese” irónica, deslocada no tempo, no lugar e nas intenções, da obra-prima que Ford Madox Ford publicou em 1915. O intróito da edição canónica de 1927 (uma carta escrita à mulher, Stella, depois do affaire com Jean Rhys), leva-nos a supor que se trata de um roman à clef. Será Edward Ashburnham um alter-ego do autor? Abrindo com a frase famosa — «Esta é a mais triste história jamais contada.» —, O Bom Soldado é um tratado ácido sobre a imprevisibilidade das paixões. / Relógio d'Água
Quem gosta de ficção científica conhece Frank Herbert (1920-1986), autor de clássicos do género, em particular os seis romances da saga Duna, que David Lynch transpôs para o cinema em 1984. Herbert, um “autodidacta” libertário, é frequentemente comparado a Tolkien, o erudito que escreveu O Senhor dos Anéis. Compósito de política, religião, ecologia e alteração de consciência em ambiente interestelar feudal, num futuro longínquo, tudo gira em torno da mélange da imortalidade. A história de Paul Atreides, senhor de Arrakis (adversário dos Harkonnen), tem galvanizado sucessivas gerações. O volume inclui cartas cartográficas e um glossário da terminologia do Império. / Relógio d'Água
Editar em forma de antologia breve As Farpas que Ramalho Ortigão (1836-1915) publicou entre 1872 e 1883, acrescentando-lhe textos posteriores publicados até 1914, alguns deles na Gazeta de Notícias do Rio de Janeiro, é uma forma hábil de pôr o leitor a reflectir sobre o presente, a partir da vida portuguesa durante a monarquia constitucional e nos primeiros anos da República. Francisco Abreu fez a selecção deste Ramalho a solo (como é sabido, Eça de Queirós foi co-autor das Farpas antes de partir para Havana), optando por textos que «denotam uma espantosa — e deveras preocupante — actualidade.» Viriato Soromenho-Marques assina o prefácio. / Manufactura
Saiu finalmente em português o primeiro romance de Richard Zimler (n. 1956), Insubmissos, publicado em língua inglesa em 1996. No prefácio, o autor explica: «Nessa altura [1996] eu ainda não tinha cidadania portuguesa. […] A possibilidade de me ser negada a renovação do visto de trabalho pareceu-nos muito real…» Tendo como Leitmotiv a Sida, então associada à comunidade gay, a tradução ficou “congelada”. Até hoje. Escrito em linguagem crua, Insubmissos aborda a homossexualidade dos seus personagens. Importa pouco saber se o narrador (um professor de guitarra clássica, judeu) e o autor são uma e a mesma pessoa. Lê-se com agrado e as suas ocasionais fragilidades não beliscam o plot. / Porto Editora
Professor de psicologia clínica em Columbia e colaborador de revistas de prestígio, Andrew Solomon (n. 1963) tornou-se conhecido do grande público depois de publicar O Demónio da Depressão. Mas a sua obra tem um espectro mais largo, indo dos direitos LGBT à arte soviética. Tendo o suicídio como denominador comum, a Quetzal reuniu nove ensaios, alguns publicados no New York Tomes, na New Yorker, etc., e editou Um Crime da Solidão. Solomon fala de celebridades que puseram termo à vida, como a designer Kate Spade, o actor Robin Williams, o chef de cozinha Anthony Bourdain, mas também de sua mãe. Um livrinho didáctico que ajuda a perceber as possíveis razões de um acto tão radical. / Quetzal