Não tenho por hábito comentar prémios (aos amigos laureados felicito-os privadamente), excepto três: o Nobel da Literatura, o Camões e o Pessoa.
Ignorando o passado do professor de Coimbra, pessoa sobre quem toda a vida ouvi elogios, vindos de gente de Esquerda, sobretudo da Esquerda marxista, na sua maioria académicos de universidades de Lisboa, Porto, Braga e Coimbra, a distinção pareceu-me ajustada. Estava errado.
Aqui chegados, apercebi-me com surpresa da indignação gerada pela atribuição do prémio. Intelectuais que admiro, como Mario de Carvalho, Luis Filipe Castro Mendes e Jorge Silva Melo (nenhum dos três com propensão para delírios persecutórios) reagiram com violência, ora pedindo a demissão da ministra da Cultura, ora denunciando o conúbio do laureado com o Estado Novo, durante a crise académica de 1969, e mais tarde no III Congresso da Oposição Democrática (Aveiro, 1973). Amigas minhas, antigas alunas de Aguiar e Silva, também relataram episódios funestos da misoginia do professor.
Em Moçambique nunca ouvi falar de Aguiar e Silva. Quem se interessava por teoria da literatura comprava o livro de René Wellek e Austin Warren, no original (1948) ou na tradução da Europa-América. Já em Portugal, um catedrático amigo aconselhou-me a obra de Aguiar e Silva. Anos mais tarde, professores mais jovens, oriundos da extrema-esquerda, enfatizavam o carácter único, excelentíssimo, da obra. Os conservadores ignoravam o homem. Dito de outro modo: em 45 anos de gossip, nunca ouvi nada contra o carácter do laureado.
A controvérsia prossegue. A maioria lamenta a infelicidade do prémio, mas Manuel Alegre e Vítor Serrão (entre outros) consideram-no muito merecido. Tudo isto é lamentável. Ficaria bem ao laureado recusar o prémio. Não seria o primeiro e encerrava o assunto.
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