O tema da transferência para o Porto da Autoridade Nacional do Medicamento e Produtos de Saúde, vulgo Infarmed, ocupa várias páginas do Público. A choradeira de Rui Moreira não me interessa. Só lhe fica mal dizer que levou aquilo a sério. Qualquer pessoa com sentido prático percebia que, sem medidas radicais de logística e tesouraria (e porventura de natureza legislativa), a mudança não era viável. Tudo isso é claro desde 21 de Novembro de 2017, data em que o ministro da Saúde anunciou ao país uma medida que não tinha condições de concretizar a 1 de Janeiro de 2019.
O que me interessa no dossiê do Público são os números do relatório do grupo de trabalho criado pelo Governo para avaliar a viabilidade da mudança, mais os da Porto Business School sobre o funcionamento do Infarmed.
Dizem-nos esses números que as obras de adaptação do edifício onde o Infarmed ficaria instalado no Porto teriam o custo de 4,25 milhões de euros, não ficando prontas em menos de 30 meses (dois anos e meio). Esses 4,25 milhões de euros fazem parte do pacote de 17 milhões de euros que custaria a mudança. Verdade que há números sobre hipotéticas poupanças futuras, mas não vale contar com o ovo no cu da galinha.
O mais importante nem são os milhões para adaptar o edifício da Manutenção Militar (na zona ribeirinha), construir o laboratório e o data center. Nenhuma destas obras está sequer planeada, mas isso não preocupa o autarca-mor da Invicta.
Importantes são as pessoas. Ou seja, os 354 funcionários do Infarmed, dos quais apenas dez mostraram disponibilidade para a mudança. Se o Governo via vantagem na mudança do Infarmed para o Porto, tinha de o explicar. Em seguida, confrontado com recusa geral dos funcionários, devia, logo naquela altura, ter aberto concursos com carácter de urgência para recrutar na área do Grande Porto. Não acredito que ficassem desertos. Mesmo assim, com procedimentos concursais, adjudicações e obras, antes de 2022 nada aconteceria. Se nós tivéssemos uma imprensa atenta, e um jornalista que soubesse contar pelos dedos, o ministro da Saúde teria sido obrigado a esclarecer a natureza falaciosa do calendário.
Se vivêssemos na Coreia do Norte, os funcionários eram arrastados pelos cabelos. Vivendo em democracia, isso não acontece. Transferir 354 funcionários e respectivas famílias, significa obrigar perto de mil pessoas a mudar de vida. Não vale a pena entrar em detalhes de compra ou arrendamento de casa, vagas em escolas e faculdades, gestão de compromissos em Lisboa, etc.
Nas primeiras semanas (ainda em 2017) após a fake new, um punhado de técnicos especializados rescindiu com o Estado e foi trabalhar para o sector privado do medicamento. A sangria estancou quando foi garantido que a mudança não se faria. Mesmo um pólo de natureza administrativa, para manter as aparências, com pessoal reduzido a recrutar in loco, orçaria em seis milhões de euros.
Sobra ainda a posição das associações do sector do medicamento, a indústria farmacêutica, as empresas de dispositivos médicos, etc., todas contra a mudança.
É a Máquina? Claro que é a Máquina. Rui Moreira nasceu ontem?