quinta-feira, 5 de abril de 2018

ELIZABETH STROUT


Hoje na Sábado escrevo sobre Tudo É Possível, da norte-americana Elizabeth Strout (n. 1956), autora que faz parte de um grupo que, por uma ou outra razão, se mantém arredio à edição portuguesa. E não devia. O romance mais recente, laureado com o Story Prize de 2018, acaba de ser traduzido. A autora tem sido aclamada pela crítica mais exigente, indiferente ao facto de vários dos seus livros serem bestsellers e, entre outros prémios, recebeu o Pulitzer de Ficção em 2008. Quem tenha lido O Meu Nome é Lucy Barton (2016) identifica a personagem central de Tudo É Possível. O romance pode ser lido como uma sequência de contos unidos pelo mesmo fio condutor. Denominador comum: o sexo. O plot gira em torno do regresso de Lucy Barton à vila do Illinois que a vira partir, adolescente ‘excluída’, para Nova Iorque. Regressa como escritora, e esse regresso, a pretexto do lançamento do seu livro de memórias, vai iluminar os recessos mais negros do passado dos habitantes de Amgash. Embora as situações sejam diferentes, como não pensar em Dürrenmatt e A Visita da Velha Senhora? Na terra todos conhecem as histórias de todos. Algumas são terríveis, como a infância devastadora de Sebastian, repetidamente estuprado pelo pai. Outras fúteis, como a mexeriquice acerca da frigidez de Patty, mulher de Sebastian e filha da mulher que protagonizou um adultério gravado nos anais Amgash. Chegados à velhice ou à meia-idade, o rancor deixara de pedir licença. O regresso de Lucy potencia várias formas de atrabílis. No capítulo Irmã, ela própria tem o seu momento de catarse. Em conversa com os irmãos, sofre um ataque de pânico e vê-se obrigada a partir. Elizabeth Strout compõe as personagens com precisão não isenta de subtileza. Por exemplo, Charlie, o homem «da dor indizível», antigo combatente no Vietname, sofre de stress pós-traumático. Linda vive longe, num meio glittering em tudo oposto ao da irmã (Patty) e dos outros. Crime, travestismo, compaixão, voyeurismo, luta de classes, homossexualidade, tudo perpassa nesta constelação de vidas interligadas. Toda a vulnerabilidade será castigada? Quatro estrelas. Publicou a Alfaguara.