Quem viaja ou viajou para a África do Sul após a queda do apartheid (1994), descreve a Joanesburgo actual como a Nova Iorque do filme de Carpenter, e a Cidade do Cabo como o paraíso na terra. Em Joanesburgo, os sul-africanos das classes altas, os executivos estrangeiros das multinacionais, e o segmento da comunidade branca com elevado poder de compra, tiveram de mudar-se para cidades-satélite, na realidade cidades-bunker, que não existiam há trinta anos. O bairro de Hillbrow, que no meu tempo de rapaz era um oásis de cosmopolitismo (restaurantes e cafés franceses, galerias de arte, cinemas, clubes gay, livrarias abertas 24 horas, comércio de luxo), o epicentro da boémia, o sítio onde os intelectuais faziam questão de morar, tornou-se um filme de terror. Em contrapartida, a fazer fé no relato de viajantes actuais, o tempo parou na Cidade do Cabo, onde, reza a lenda, os brancos que subsistem, e são muitos, continuam a viver pelo padrão pré-1994. A cidade é deslumbrante, e são raros os turistas que procuram visitar as Cape Flats, ou seja, as favelas (sendo Khayelitsha a mais conhecida) que, todas juntas, formam o anel de zinco que rodeia a cidade. Todos os dias, a partir do fim da madrugada, dezenas de comboios despejam milhões de favelados na cidade elegante. Ao fim da tarde dá-se o movimento inverso.
Facto: segundo o relatório de 2015 da ONG mexicana Segurança, Justiça e Paz, a Cidade do Cabo ocupa o 9.º lugar entre as dez mais violentas do mundo: 65,5 homicídios por cada cem mil habitantes. É de resto a única cidade fora da América Latina a integrar o ranking. Quem diria, embora seja fácil perceber porquê.
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