quinta-feira, 19 de novembro de 2015

HENNING MANKELL


Hoje na Sábado escrevo sobre Um Anjo Impuro, do sueco Henning Mankell (1948-2015), dramaturgo, romancista e autor de livros para crianças, célebre em todo o mundo como autor de thrillers, em especial os da série Kurt Wallander. Autor de uma obra muito vasta, com alguns títulos traduzidos em Portugal, Mankell dividia o seu tempo entre a Suécia e Moçambique, país onde se radicou na segunda metade dos anos 1970, para dirigir o Teatro Avenida, em Maputo. Não admira que Um Anjo Impuro, o romance mais recente, seja prefaciado por Mia Couto. Um Anjo Impuro não é um thriller. É uma história “de época”, com acção centrada em Lourenço Marques, actual Maputo, no início do século XX. É pena que Mankell não tenha perdido um pouco do seu tempo a informar-se sobre a toponímia da cidade. Não chamaria Rua do Bagamoio (designação surgida apenas em 1976) à rua que em 1904 se chamava, de facto, Delagoa Bay Wall Street, passando depois a Rua Araújo, epicentro da zona red light junto ao porto da cidade. Ficção e História são coisas diferentes, mas é o autor que faz questão de seguir a narrativa do que julga ter sido o quotidiano de Lourenço Marques no tempo da monarquia. É pena que ninguém com conhecimentos básicos tenha lido o livro antes de impresso: Mankell nunca poria Hanna a passear no «pequeno jardim botânico que se situava [...] junto à colina onde estava a ser erguida a nova catedral...», uma vez que esse passeio ocorre em 1904, e o jardim abriu em 1941. A catedral, inaugurada em 1944, nem sequer estava projectada. Para terminar o inventário de inexactidões: Lourenço Marques é o nome do primeiro explorador e comerciante branco a chegar (em 1544) a Delagoa Bay, não é o nome de nenhum general. O plot é linear. Tudo se passa em pouco mais de dezoito meses. Hanna Renström era uma adolescente quando partiu da Suécia como cozinheira de um navio que tinha Perth (na Austrália) como destino. Em Argel casou com Lars Lundmark, o imediato, mas Lars morreu em alto-mar. À chegada a Lourenço Marques, decide abandonar o navio. Após enviuvar do segundo marido, português e impotente, torna-se uma mulher rica, proprietária do bordel mais famoso da cidade. Na Quarta Parte, Hanna passa a ser Ana Branca. Um crime passional introduz a traço grosso a repressão colonial. O melhor do livro são as passagens dedicadas a Carlos, o chimpanzé. Mankell tinha material para um romance de fôlego, mas o resultado é frouxo. Duas estrelas. Editou a Presença.