Hoje na Sábado escrevo sobre a reedição de Olhando o Sofrimento dos Outros, de Susan Sontag (1933-2004). Tal como as edições de língua inglesa, a primeira edição portuguesa trouxe na capa a gravura de Goya que na actual edição surge na página 2. Isto não é um detalhe. É desleixo. O texto reporta à célebre fotografia de Eddie Adams sobre a execução, em 1968, de um rapaz vietcong: «Colocando-se ao lado do seu prisioneiro, de modo que o seu perfil e a cara do preso ficassem visíveis para as câmaras atrás dele, Loan disparou à queima-roupa.» Nada a ver com o enforcado de 1812 que o leitor tem à frente. Tomando como ponto de partida as reflexões de Virginia Woolf sobre as raízes da guerra, Olhando o Sofrimento dos Outros, último livro publicado em vida, de certo modo prolonga os Ensaios Sobre Fotografia que em 1977 fizeram de Sontag um nome incontornável, que surpreendia a cada nova obra. Pondo o dedo na ferida, Sontag explica com fluência e erudição como da Guerra da Secessão às bandeiras de Iwo Jima (americanos) e do Reichstag (russos), fotos de massacres em África publicadas como sendo nos Balcãs, mais o beijo de Doisneau, a encenação foi de regra, prática contrariada pela Guerra do Vietname e pelo 11 de Setembro. Extremamente pedagógico. Quatro estrelas.