sexta-feira, 19 de agosto de 2016

DISCURSO DIRECTO, 42

Valter Hugo Mãe em entrevista ao Diário de Notícias, hoje:

«Que eu saiba, fui o único escritor que assinou uma petição para se exigir que a escola pública fosse defendida em detrimento dos colégios privados... »

Errado. Outros escritores assinaram. Fui um deles. O busílis é que os jornais, na impossibilidade de citarem cem ou duzentos nomes, citam os três ou quatro que na cabecita do repórter de serviço são... ‘os famosos’. Sou amigo do Valter há dezoito anos, acredito que ele não o tenha dito por fanfarronice, mas o seu a seu dono.

A CAIXA

O affaire Caixa Geral de Depósitos atingiu o paroxismo. Meses de avanços e recuos desde que António Domingues, o novo CEO, impôs uma administração de 19 membros (sete executivos e os restantes não-executivos), culminaram ontem na bizarra decisão do Banco Central Europeu, que rejeitou 8 dos 19 membros propostos, alegando, nos termos da Lei portuguesa, que a sua presença em órgãos sociais de outras empresas excede o limite legal. A Lei nunca terá sido cumprida, mas foi o BCE que a trouxe à colação. O Governo prepara-se para a alterar, e não o devia fazer. As personalidades rejeitadas devem bater com a porta, deixando claro que não precisam da CGD para nada. O BCE também não aprova a acumulação dos cargos de Chairman e CEO, como pretende António Domingues, e só o permitirá durante um período transitório de seis meses. Cereja em cima do bolo, o BCE obriga três administradores a frequentarem o curso de gestão bancária estratégica do INSEAD (a escola de elite em Fontainebleau), forma peremptória de dizer que não confia nas suas capacidades profissionais actuais. Vão aceitar a humilhação? Se aceitarem, quem paga o curso? O BCE, que o impõe? O BPI, de onde são oriundos? A CGD, que é sustentada com os nossos impostos? Os visados não são com certeza. Tudo isto é lamentável, e perigoso, porque se trata de uma tarantela em cima de um buraco superior a cinco mil milhões de euros.

quinta-feira, 18 de agosto de 2016

TRUMAN CAPOTE


Hoje na Sábado escrevo sobre A Sangue-Frio, a obra-prima de Truman Capote (1924-1984) que está de volta às livrarias cinquenta anos após a sua publicação. Aquilo que podia ser uma mera reportagem, como outras que se publicaram no ano do crime, transformou-se num romance de não-ficção, uma contradição nos termos. Capote ficcionou algumas passagens da tragédia de Holcomb mas, no essencial, o livro respeita o guião da matança de 1959, ou seja, o bárbaro assassinato de Herbert Clutter, um rico fazendeiro metodista, sua mulher, a filha de 16 anos e o filho de 15. O autor transferiu-se de Nova Iorque para o Kansas, onde, além de entrevistar polícias e habitantes da localidade, privou na cadeia com Perry Smith e Richard Hickock, os assassinos, executados por enforcamento em Abril de 1965. Em 1966, quando saiu A Sangue-Frio, Capote tinha já publicado uma dúzia de livros, entre eles duas obras que fizeram dele uma referência da ficção americana do século XX: Outras Vozes, Outros Lugares (1948) e A Harpa de Ervas (1951). O relato da matança de Holcomb operou uma guinada na escrita do autor, ao mesmo tempo que deu azo a uma série de rumores nunca devidamente esclarecidos, como por exemplo o grau de intimidade a que Capote teria chegado com Perry Smith durante os encontros na cadeia. O ambicionado e esperado Pulitzer não caiu no seu colo alegadamente pelas conjecturas em torno da natureza dessas relações. O livro segue o protocolo de uma reportagem, atendo-se aos factos sem curar de os “polir” literariamente. Os protagonistas são Smith e Hickock, os matadores. O perfil de ambos é descrito com minúcia e, pode-se dizer, empatia, embora a investigação policial (e subsequente julgamento) não seja descurada. Por seu turno, o retrato de Mr. Clutter não podia ser mais impressivo. Capote levou seis anos a dar o livro à estampa, mas o resultado é uma obra de culto, um clássico da ficção de língua inglesa. A história serviu de base a documentários, séries de televisão e três filmes, sendo os mais conhecidos Capote (2005), de Bennett Miller, e Infamous (2006) de Douglas McGrath, indiscutivelmente o melhor de todos. Cinco estrelas.

Escrevo ainda sobre Moonlight Mile/A Última Causa, do americano Dennis Lehane (n. 1965). Com vários livros publicados em Portugal, entre eles a obra-prima Mystic River, que Clint Eastwood levou ao cinema, o autor privilegia os temas associados às famílias disfuncionais. Os seus thrillers distinguem-se pela minuciosa radiografia da criminalidade em contexto de sociedade pós-industrial. A escrita ágil faz o resto. Moonlight Mile, agora traduzido, encerra a série dos detectives Patrick Kenzie e Angie Gennaro. Dos seis títulos que a compõem, apenas Sacred continua inédito em português. Quem leu Gone, Baby, Gone (1998), verifica logo que Moonlight Mile é uma sequela desse romance. Estamos de novo em Boston, local de eleição do autor. Patrick e Angie são agora casados e pais de uma criança, facto que os leva a encarar o segundo desaparecimento de Amanda McCready como algo que lhes diz duplamente respeito. Amanda já não tem quatro anos, tem dezasseis. O desenlace da investigação anterior deixou-os de rastos: a rapariguinha foi encontrada, mas devolvida a um lar de risco. É preciso de impedir que aconteça de novo. Factor decisivo: em doze anos, o mundo é outro. Quatro estrelas. Publicou a Porto Editora.

MAGUEIJO

Muito boa a entrevista de João Magueijo hoje publicada no Diário de Notícias. Não sei se o entrevistador deu por isso, mas, por duas ou três vezes, o professor do Imperial College de Londres responde num tom equivalente a «não seja parvo». Lembrar que João Magueijo, português radicado há mais de vinte anos no Reino Unido, 48 anos, físico, autor da teoria da velocidade da luz variável, é um dos mais eminentes cientistas vivos, como tal reconhecido na comunidade internacional.

Além de obras sobre ciência, publicou há dois anos o controverso Bifes Mal Passados, sobre o qual escrevi em 25-9-2014 na revista Sábado. No livro, Magueijo não deixa pedra sobre pedra acerca de como vê o Reino Unido: a hierarquia de classes, os sotaques, as public schools, o clima, os motins raciais, o sexo, o desporto, as férias, os animais domésticos, a alimentação, o álcool (as páginas sobre Gales são eloquentes), a religião, as idiossincrasias académicas, a “indústria financeira”, a síndrome pós-colonial, etc.

Voltando à entrevista: a caixa de comentários do jornal é o espelho do país ressabiado em que vivemos. Uma vergonha.

quarta-feira, 17 de agosto de 2016

DUODÉCIMOS

Dizem os media que o OE 2017 vai manter o pagamento em duodécimos do subsídio de Natal aos funcionários públicos e pensionistas. Nem pode deixar de ser assim enquanto a carga fiscal obedecer à Tabela Gaspar (OE 2012). Em cada mês, o duodécimo amortece a extorsão do IRS. No dia em que o duodécimo deixar de existir, a larga maioria de funcionários públicos e pensionistas tem um rombo no seu rendimento mensal líquido, de pouco lhe servindo a certeza de que em Novembro recebe um salário extra. Como não acredito num choque fiscal que reponha o IRS nos valores de 2010, estou em crer que os duodécimos vão eternizar-se. Os trabalhadores do sector privado cujos patrões não acataram a norma dos duodécimos, têm emoldurados os recibos dos salários de Dezembro de 2011 e Janeiro de 2012, para nunca esquecerem que houve um antes e um depois de Vítor Gaspar.

terça-feira, 16 de agosto de 2016

FALÁCIA

Cessaram ontem as soi disant ‘fidelizações’ com as operadoras de telecomunicações. A partir de hoje, as empresas têm de efectuar contratos sem qualquer tipo de fidelização ou, em alternativa, com fidelização nunca superior a doze meses (existe a opção seis meses). Por seu turno, a alteração do pacote de serviços não implica prorrogação da fidelização anterior. Isto é tudo muito bonito. Mas quer-me parecer que é gato escondido com rabo de fora. Um exemplo: para desactivar o serviço de alguém que decide passar do operador X para o operador Y, o operador X pode, nos termos da nova legislação, cobrar custos (com equipamento, instalação, equipas), desde que o valor desse custo não exceda o remanescente das mensalidades contratadas. Dito de outro modo: a cessação do contrato tem um preço que pode ser igual ao pagamento das mensalidades caducadas ontem. Uma falácia! 

Sempre recusei ‘fidelizações’. Por isso pago 80 euros por mês por um pacote de televisão mais internet mais telefone fixo. O telemóvel não entra.

segunda-feira, 15 de agosto de 2016

PORQUÊ?


Dalian Atkinson, 48 anos, antigo jogador de futebol do Aston Villa, do Sheffield Wednesday e do Ipswich Town, foi hoje morto pela polícia inglesa com uma descarga de taser. Atkinson, que tinha ido visitar o pai, teve uma paragem cardíaca após ser atingido pelo taser. Estão por apurar as causas.

Imagem do Guardian. Clique.

domingo, 14 de agosto de 2016

BARBÁRIE


Impressionante esta reportagem publicada ontem no Observer sobre abuso sexual de crianças em campos de refugiados na Grécia, em especial o de Salónica. Clique na imagem.