quinta-feira, 11 de maio de 2017

ALEXANDRE O'NEILL


Hoje na Sábado escrevo sobre Poesias Completas & Dispersos, de Alexandre O'Neill (1924-1986). Não é a primeira vez que a poesia completa do autor chega às livrarias. Esta nova edição, da responsabilidade de Maria Antónia Oliveira, sua biógrafa, inclui sete poemas inéditos, bem como quarenta e dois textos dispersos em jornais, revistas, discos e catálogos de arte. A seriação dos dispersos é cronológica. Na notal final que antecede o posfácio, Maria Antónia Oliveira dá conta do critério adoptado. Alexandre O'Neill foi, durante algum tempo, olhado com um módico de troça, desdém e maledicência por vários dos seus contemporâneos. Nascido no seio de uma família tradicional, teve uma educação liberal e uma avó sufragista que publicou versos, romances e traduções de Dumas. Os Verões passados em Amarante, onde vivia um tio-avô conotado com o reviralho, foram decisivos para a sua formação. Ali privou com Pascoaes e Bento de Jesus Caraça. Isento do serviço militar, começou a trabalhar assim que terminou o liceu. Em 1947, no MUD-Juvenil, conheceu Cesariny, que o juntou ao grupo de fundadores do Surrealismo português. Desse tempo breve ficou A Ampola Miraculosa, narrativa gráfica (1948). O primeiro livro, Tempo de Fantasmas, estabelece a dissidência. Seria preciso esperar pelo segundo, No Reino da Dinamarca (1958), para ser reconhecido como uma das vozes centrais da poesia portuguesa do século XX. Expulso da função pública por recusar luto na morte de Carmona, preso em 1953 por ter ido ao aeroporto esperar Maria Lamas, O’Neill foi tudo menos um acomodado. Em 1950, quando conhece a búlgara Nora Mitrani, tem uma epifania. Mas a mãe intercede junto da Pide para ser negado passaporte ao filho. Ficaram os versos: «Não podias ficar nesta cama comigo / em trânsito mortal até ao dia sórdido / canino / policial / até ao dia que não vem da promessa / puríssima da madrugada / mas da miséria de uma noite gerada / por um dia igual […]» O poema, Um Adeus Português, faz parte do cânone nacional. Fora antologias e narrativas em prosa, deixou-nos onze livros de poesia. Traços distintivos: lirismo autocrítico, desconstrução da tradição pícara e confronto mordaz com o quotidiano português, em particular o modo funcionário de viver. Cinco estrelas. Publicou a Assírio & Alvim.