quinta-feira, 1 de outubro de 2015

DJAIMILIA PEREIRA DE ALMEIDA


Também na edição de hoje da Sábado, escrevo sobre Esse Cabelo, de Djaimilia Pereira de Almeida (n. 1982). Os editores portugueses parecem ter descoberto o filão dos livros de memórias. E como talvez não pudesse deixar de ser, África ocupa grande parte desse interesse. Ciente de que «a nossa vida é inundada todo o tempo por essa família taciturna — a memória», Djaimilia fez outra coisa: escreveu um livro centrado no seu próprio cabelo, primeiro liso (no acto de nascer), mais tarde crespo. Memórias identitárias, portanto. A autora nasceu em Luanda e chegou a Portugal com três anos de idade. Sem perder de vista o móbil narrativo (o cabelo), serve-se do monólogo interior para radiografar o mundo à sua volta. Sem abdicar da ironia, mantém a distância do analista. Ao mesmo tempo que põe de lado «o sonho do documentalista», exonera-se com prudente frieza de qualquer arroubo passional. O passado cabe inteiro neste diário tranquilo, circunstanciado, isento de azedume: «Era em mil novecentos e sessenta e sete. […] O filme que víamos em noventa retratava o que fôramos em sessenta mostrando-nos em quarenta. […]» Bem calibrada, de uma nitidez exemplar, a prosa dúctil faz o resto. Vai ser preciso estar atento a futuros livros de Djaimilia. Quatro estrelas.