Estava por fazer a crónica dos seis dias que passei em Frankfurt na semana passada. Chegada num domingo de sol radioso e cinco graus negativos. A partir das quatro da tarde nunca mais vi sol. Foram dias cinzentos, com vento, nevoeiro cerrado, gelo nas pontes e fiapos de neve. Frankfurt não é uma cidade exaltante, mas respira civilização e dinheiro. Quem conhece os museus de Nova Iorque, Londres, Paris, Madrid, Amesterdão, etc., não descobre nada de novo no Städel, excepto, claro, um excepcional acervo de pintura alemã, aliás magnífica. Mas não faltam os nomes universais, de Watteau a Picasso, sem esquecer Andy Warhol e outros contemporâneos reunidos na luminosa ala subterrânea. Noutro registo, a Kunsthalle é de visita obrigatória: várias alas com exposições temporárias de clássicos e novíssimos. Haverá mais uma dúzia de museus. A zona de Rathaus, onde fica o Römer (a Câmara da cidade desde 1405), encontra-se transformada num estaleiro por causa da recuperação das fachadas conforme modelo dos séculos XV a XVII. Contudo, consegui entrar na Igreja de São Nicolau e ouvir o carrilhão ao vivo. O caos atinge o paroxismo com as famosas barracas de Natal a entupirem. A Feira ocupa todo o centro da cidade, mas em Rathaus, devido às obras, representam um estorvo.
Os amantes de ópera, bailado e música clássica têm muito por onde escolher. Frankfurt tem duas óperas: a Velha (1880), em Opernplatz, e a Nova (1951), na Willy Brandt Platz. A Alte Oper foi bombardeada em 1944, reconstruída e reaberta em 1981 como sala de concertos. Os espectáculos de ópera passaram todos para a Nova, um edifício magnífico com uma programação de primeiríssima água. Durante a minha estadia estiveram em cena La Bohème, de Puccini, Eugen Onegin, de Tchaikovsky, Ezio, de Gluck e Der Goldene Drache, de Peter Eötvös. No sábado, dia 10, estreou Die Zauberflöte, de Mozart, que queria muito ver, mas o regresso a Lisboa foi na véspera. Além das óperas há recitais a solo, como o do barítono Johannes Martin Kränzle, marcado para hoje.
Sobre gastronomia, item que desatina os puritanos, diz-me a experiência de cinco visitas (num lapso de dez anos) que em Frankfurt come-se muito bem a partir de uma média de 70 euros por boca. Média casal: 140. Este valor corresponde a uma refeição composta por couvert, uma garrafa de água, uma garrafa de vinho, dois pratos principais, uma sobremesa, um café e um chá. Por esse valor temos direito a cozinha de qualidade, serviço irrepreensível, asseio absoluto, bom ambiente, decoração adequada e conforto. Os indígenas jantam muito cedo, mas os restaurantes de que vou falar estão cheios às onze da noite. Praticamente não há turistas. Não cito restaurantes de luxo, nem de chefs com estrela Michelin. Os exemplos situam-se, pelo padrão de Lisboa, algures entre a Bica do Sapato e o Solar dos Presuntos. Pela minha experiência, o custo de vida subiu, da Primavera de 2014 para cá, uns dez por cento. Cinco moradas a que regresso sempre: o Charlot (italiano), em Opernplatz, a Brasserie An Der Alten Oper, que fica mesmo ao lado — ambos virados para a Alte Oper —, o The Ivory Club (cozinha colonial indochinesa), em Taunusanlage, o Meyer, em Große Bockenheimer Straße, e o Zarges no extremo oposto da mesma rua. Desta vez descobrimos um restaurante turco fabuloso, o Sümela, em Taubenstraße. E um indiano simpático, o Taj Mahal, do outro lado do rio, em Schweizer. O hotel onde costumamos ficar, o Steigenberger Frankfurter Hof, tem quatro restaurantes: o Français (nunca experimentei), estrelado, vocacionado para milionários do Dubai; o Oscar, bastante simpático; o Hofgarten, vulgar; e o Breeze by Lebua, cozinha asiática de fusão, que experimentei agora. Carote-ote-ote. A simpatia do staff e a decoração não justificam os cifrões. O senhor Lebua passa metade do ano em Banguecoque e a outra metade em Frankfurt. Tudo visto, o italiano Charlot continua imbatível, servindo o melhor ragú que jamais comi. Consta que a Brasserie An Der Alten Oper tem Varoufakis entre os clientes famosos. (Os empregados são gregos.) O Sümela foi toda uma experiência turca a roçar o erótico. E o Ivory Club voltou à sua melhor forma. Não vale a pena tentar comer barato. Frankfurt não é Lisboa. Uma refeição de 30-40 euros, para duas pessoas, é um desastre.
Por último, uma experiência inédita. No regresso a Lisboa, no aeroporto, fui obrigado a tirar os sapatos (mas não o cinto), minuciosamente analisados, primeiro à mão, depois no raio X, por um funcionário azedo que esteve mais de cinco minutos a apalpar-me de frente e de trás, tarefa que incluiu massagem da zona dos tornozelos e calcanhares. Não estou a reclamar, limito-me a descrever um facto. Normas de segurança são normas de segurança. Como nunca me tinha acontecido nada tão intrusivo, em lado nenhum (em Miami, em 2008, tive de despir o blazer e despejar o saco a tiracolo), fui apanhado de surpresa.
Por falar do aeroporto de Frankfurt, o 4.º mais movimentado da Europa, registo com agrado que certas áreas (o acesso às portas 52-70), se não são novas, foram renovadas de ponta a ponta, com equipamento novo: passadeiras rolantes, placards, sinalética, assentos, lugares reservados para deficientes, mesas para computadores, lojas, restaurantes, salas de repouso com espreguiçadeiras, etc. Tudo a brilhar de limpeza. Na Primavera de 2014 ainda as casas de banho eram imundas. Agora são luminosas, amplas e limpas.
A imagem ao alto foi obtida na passada quinta-feira, dia 8, ao meio-dia, a partir de uma das pontes que atravessam o Meno. A de baixo mostra as barracas de Natal em Hauptwache, uma espécie de Rossio local. Clique nelas para ver melhor.