Numa das cem entrevistas que deu nos últimos dez dias, Ricardo Araújo Pereira lamentou-se ao jornal i da impossibilidade de fazer «um sketch sobre marrecos, coxos e mariconços». Já sabíamos que, em Portugal, consoante a origem social ou lugar cativo na hierarquia de classes, os homossexuais masculinos se dividem em três grupos: homossexuais, gays e bichas.
O primeiro grupo subsume os altos cargos do Estado, diplomatas, catedráticos, membros do Gotha, maçons de topo, deputados, banqueiros, gestores, brokers, o baronato das Grandes empresas e políticos avulsos. Fora do círculo das duzentas pessoas que controlam o Who’s Who, o silêncio é de regra. O segundo, dito gay, engloba os representantes da intelligentsia, antiquários, decoradores, estilistas e, de um modo geral, happy few com boa imprensa. No terceiro, o das bichas tout court, cabe tudo o que sobra, com destaque para artistas e cabeleireiros. Até aqui, nada de novo.
Mas Ricardo Araújo Pereira lamenta não poder achincalhar os mariconços. Eu não sei o que é um mariconço. Será uma bicha de call center? Um entertainer? Lamento pelo Ricardo, homem culto e inteligente, de quem gosto, mas assim não vamos lá. A sorte dele é ser o Ricardo, caso contrário teríamos meio mundo a dizer dele o que Mafoma não disse do toucinho.
Nota lateral: no mundo de língua inglesa o termo queer é usado com orgulho. E não há forma de traduzir queer senão por bicha.