quinta-feira, 31 de janeiro de 2019

MARGARET DRABBLE


Hoje na Sábado escrevo sobre o romance mais recente de Margaret Drabble (n. 1939), Sobe a Maré Negra. Lembro-me da autora como ensaísta e editora do Oxford Companion to English Literature, mas, apesar de extensa, não conhecia a sua ficção. O título do romance remete para um conhecido poema de D.H. Lawrence (citado em epígrafe) sobre a finitude da vida. O romance põe em pauta a velhice tout court, bem como o ritual de sofrimento das doenças letais, “antecipando”, provavelmente, a morte recente da filha Rebecca, uma conhecida consultora literária, vítima de cancro aos 53 anos. E por vezes nem tanto. Frequentemente, o desconforto e as indignidades da velhice tornam-se tão incómodos que alguns preferem «embarcar num desses atos de loucura imprudente que leve tudo a um fim rápido…» Não se trata portanto de escrita light, antes pelo contrário, mas Margaret Drabble doseia bem o sarcasmo de forma a resgatar o romance da sua tonalidade sombria. A intriga é pontuada por citações ou alusões a Shakespeare, Beckett, Auden, Spender, Adorno, Edward Said e muitos outros, em parte por imperativo do tema, outro tanto porque as personagens do romance (como os próprios familiares da autora, irmã da romancista A.S. Byatt e da historiadora Helen Langdon) respiram literatura por todos os poros. Nem sequer escapa o casal gay formado por Ivor e Bennet. Certo pendor ensaístico (espécie de inventário histórico de mortes não relacionadas com a doença, tais como desastres naturais, guerras e crimes) mantém a narrativa suspensa num género fluido. Por exemplo, vejam-se as referências às vagas migratórias no Mediterrâneo: «Nenhum deles pode saber até que ponto a história dos imigrantes está longe de acabar [e] quanto mais gente se afogar, espera a Europa, mais se desencorajará a emigração e menos serão as bocas para a Europa alimentar.» Afinal, pode reflectir-se sobre a morte para lá dos muros das residências sénior. Verdade que o cinismo de Francesca Stubbs, a protagonista, prende o leitor. Quatro estrelas. Publicou a Quetzal.